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Johnson&Johnson e o desafio de cativar os consumidores de baixa renda

Com uma experiência de mais de 70 anos no mercado de produtos de consumo no Brasil, a americana Johnson & Johnson construiu ao longo desse tempo uma imagem de grande prestígio. Suas marcas são tão conhecidas que viraram sinônimo de categoria de produtos - como cotonetes e band-aid. A empresa se orgulha em dizer que seus xampus e sabonetes aparecem em pesquisas feitas com consumidores como "sonhos de consumo". Nos últimos anos, no entanto, a forte tradição das marcas tornou-se um problema. À idéia de qualidade se somou outro atributo - esse bem menos desejável -, a inacessibilidade. Caros em comparação aos concorrentes, os produtos da J&J permaneceram longe das classes de menor poder aquisitivo - exatamente o motor do crescimento das multinacionais de produtos de consumo nos últimos anos. O fato de não atingir a parcela emergente do mercado acabou contribuindo para os fracos resultados globais da área de consumo da companhia.

Segundo dados da consultoria internacional Euromonitor, enquanto a participação global dos produtos de higiene e beleza da Procter & Gamble cresceu 71% nos últimos cinco anos, a da J&J aumentou 40% no mesmo período. " A J&J preferiu dar prioridade a outras áreas de atuação com margens de lucro mais altas", diz Marcel Motta, analista de mercado da Euromonitor, em Chicago, nos Estados Unidos. "Concorrentes como a Procter e a Unilever têm atendido à demanda das classes baixas de forma mais eficiente."

Os produtos de consumo respondem por 18% do faturamento da J&J global - a maior parte da receita vem das unidades de produtos médicos e farmacêuticos. No Brasil, essa relação é diferente e os produtos de consumo significam metade das vendas. A estagnação da área, portanto, representa uma diminuição da importância do país na corporação. E parecia ser justamente esse o caminho da operação brasileira. Durante muito tempo, a J&J ignorou a ascensão das classe C e D e o poder de consumo que elas poderiam representar. Desde o início da década de 90, a empresa vinha perdendo vantagem competitiva. "Com a abertura econômica, os concorrentes internacionais chegaram ao Brasil e trouxeram o que havia de mais moderno. Ao mesmo tempo, as empresas locais passaram a ter acesso às novas tecnologias", diz Maria Eduarda Kertesz, principal executiva da divisão de produtos para bebê no Brasil.


A baixa renda na mira
Para chegar aos consumidores de baixa renda, a Johnson & Johnson criou produtos novos e reduziu os preços.

Hidratante Softlotion: o preço foi reduzido em quase 30% há dois anos, o que quintuplicou as vendas.
Enxaguatório Bucal Reach: o preço teve redução de 23% em 2005
Sabonete para adultos: lançado em 2005, conquistou participação de mercado de 12%
Fralda Baby Clássica: versão básica do produto lançada há quatro anos, responde por 45% das vendas de fraldas da empresa
Desodorante Banho a Banho: em 2005, o preço foi reduzido em 25%. Com isso, as vendas aumentaram 51% em volume
Shampoo Baby: o preço foi reduzido em cerca de 30% em 2004, o que rendeu ao produto a liderança na categoria
Escova de Dentes Reach Essencial: lançada em 2005, tem hoje 3,8% do mercado na versão adulta e 1,2% na versão infantil


A única maneira de mudar a situação era alterar a forma como a J&J trabalhava e era percebida - iniciativa vista com certa reticência pela matriz. "Nos Estados Unidos, a Johnson's é uma marca acessível e por isso os executivos americanos não viam muito sentido nos argumentos para redução de preços e para mudança de imagem no Brasil", diz um executivo que participou do processo. Enquanto o sinal verde não saía, a J&J brasileira usou a estratégia contrária para segurar a piora dos resultados financeiros: aumentou os preços, apostando que a maior rentabilidade compensaria a perda de participação de mercado. Quando a idéia do reposicionamento de parte de seus produtos foi finalmente aprovada - em um momento em que as concorrentes como Unilever e Procter já estavam avançadas em seus projetos para as classes C e D -, a J&J iniciou uma reestruturação que envolveu todas as etapas do negócio de consumo no Brasil. Como resultado, os preços de 14 produtos caíram.

O passo mais arriscado foi comunicar a nova estratégia aos consumidores. A empresa temia que associar sua imagem a produtos populares e mais baratos colocasse em risco a reputação das marcas entre os consumidores mais abastados. A estratégia utilizada foi vincular sua imagem a promoções e a ícones da cultura popular, como os apresentadores Silvio Santos e Ana Maria Braga. Atualmente, a Johnson testa um modelo de comercialização baseado em quiosques para venda direta ao consumidor em áreas de grande circulação pública. No ano passado, o faturamento da J&J cresceu 15% no país e a divisão brasileira de consumo tornou-se a que mais fatura fora dos Estados Unidos, à frente de mercados como França, Inglaterra e Alemanha. Os novos produtos voltados para a baixa renda hoje respondem por 20% do faturamento da divisão de consumo no Brasil. Graças a eles, as vendas da companhia praticamente dobraram nas regiões Norte e Nordeste do país.

Os resultados alcançados pela J&J demonstram quanto os mercados emergentes tornaram-se fundamentais para as grandes companhias mundiais de produtos de consumo. Para essas empresas, conseguir vender para classes menos abastadas transformou-se num dos principais motores do crescimento. Recentemente, a Unilever anunciou que os países emergentes são prioridade em sua estratégia de crescimento global. Entre os dez principais mercados em que a empresa atua, o Brasil ocupa a terceira posição, com receita de 3 bilhões de dólares, atrás apenas dos Estados Unidos e do Reino Unido. A J&J promete avançar e seguir a mesma estratégia. Atualmente, a participação dos mercados emergentes no faturamento global da divisão de produtos de consumo corresponde a 12% do total - índice que a empresa pretende aumentar com velocidade maior que a alcançada no passado. A partir de agora, a divisão de consumo do Brasil passa a responder diretamente à matriz - o que deve facilitar o acesso a investimentos. "Vamos nos tornar uma empresa mais rápida e agressiva", diz Maria Eduarda. De fato, a J&J parece já ter perdido tempo demais.


Fonte: Por Melina Costa, in portalexame.abril.com.br

Comentários

Anônimo disse…
Muito interessante! a JJ é uma empresa forte com produtos de qualidade, pena que ainda não soube direcionar sua marca para as classes C e D, acho que está sim mais que na hora de mudar e abocanhar essa parcela de mercado.

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