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Planejamento de mídia: o cuidado artesanal na era digital

Transcrevo aqui a íntegra do artigo "Planejamento de mídia: o cuidado artesanal na era digital", escrito por Luca Cavalcanti, diretor de marketing do Bradesco, e publicado na revista Meio & Mensagem no final de abril. Considero o autor um dos mais lúcidos profissionais de marketing do país, cujos textos costuma abordar de forma objetiva questões práticas do mercado. Leia e confira:

"A máxima de que todo desafio traz de maneira intrínseca uma grande oportunidade torna-se relativamente mais complexa quando relacionada ao universo da fragmentação das mídias, bem como à melhor maneira de orquestrá-las visando o alcance do consumidor.

Isso porque o cenário há tempos se transformou num quebra-cabeça imbricado, que não é apenas um admirável manancial de opções, mas uma instigante, e por vezes atordoante, gama de ofertas a serem avaliadas, elegidas e descartadas pelos mídias e dirigentes de marketing. Estamos evoluindo da era do planejamento de meios para a era do planejamento de canais de comunicação. E o que isso quer dizer?

Todo e qualquer contato com o consumidor deve ser visto como uma mídia, desde a marca de sabonete que ele consome e a etiqueta da roupa que ele usa até o hipermercado que freqüenta, a operadora de telefonia que escolhe, dentre tantos outros. Há tempos deixamos a era na qual o consumidor era o centro das atenções para adentrar uma em que ele tem, efetivamente, o controle sobre seu consumo de mídia.

Num ambiente volátil e frenético, em que o nível de atratividade das mensagens é crescentemente pressionado pela ditadura da fugacidade, transita um consumidor multitarefa e altamente seletivo. Essas características se aprofundam quanto mais jovem for o target, e revolucionam outros que, a priori, pareceriam refratários ao advento das mudanças: enquanto pesquisas apontam que crianças de dois anos de idade já desenvolvem mais de uma atividade simultaneamente, temos idosos se sociabilizando em comunidades virtuais via internet.

Some-se a isso a crescente tendência de os consumidores não somente elegerem seus conteúdos de mídia como passarem a ser co-autores desse conteúdo. Fenômenos que se estendem desde o Youtube e o Second Life até o jornalismo cidadão conferem à audiência um poder participativo verdadeiramente transformador, uma vez que ele não apenas se manifesta como influi na percepção dos demais sobre determinado assunto, produto, serviço ou marca.

Ou seja, além de tudo ao seu redor poder ser considerado uma mídia e de ele ter o controle, ele passa a fazer a mídia e influenciar a audiência da qual ele mesmo faz parte. Ele escolhe a hora, o local, a razão, se sim e se não. Isso sempre ocorreu, mas a diferença é que hoje o consumidor tem consciência de que detém o controle. Diante de tamanho redesenho de paradigmas sociais, seria estranho se as velhas certezas sobre como realizar um planejamento de mídia não se abalassem.

Numa realidade de comunicação crescentemente fragmentada e digitalizada, o planejamento de mídia torna-se, paradoxalmente, uma tarefa mais artesanal, pois exige que nos municiemos de muito mais informação e nos debrucemos com muito mais cuidado e atenção sobre detalhes ao compormos uma rede integrada de pontos de contato com o consumidor.

Essa trama é tecida com variedade de canais, mas também com adequação da mensagem transmitida. Isso, em alguns contextos, pode significar altas doses de criatividade e pirotecnia, capazes de elevar a mensagem acima do oceano de estímulos no qual o consumidor se encontra submerso. Em outras ocasiões, pode ser simplesmente um “ovo de Colombo”, uma idéia simples, muitas vezes até óbvia, e que justamente por isso estabelece uma conexão direta e efetiva com o consumidor.

Acima de tudo, não é somente a condição socioeconômica e cultural que determina o tipo de diálogo que se deve travar com o consumidor. O perfil sociodemográfico é apenas um lado do consumidor. Pessoas que pertencem ao mesmo grupo têm crenças, atitudes, hábitos, valores e expectativas diferentes, porém isso não significa necessariamente mensagens diferentes, mas talvez abordagens, canais ou apenas formatos diferenciados. É importante detectar os pontos em comum e as diferenças e buscar o que realmente é relevante, o que se destaca na visão do consumidor, e por meio disso criar uma verdadeira proximidade.

Outro fator determinante a ser considerado é o seu “estado de espírito”, sua predisposição psicológica e disponibilidade mental para acolher e/ou interagir com a mensagem, em virtude, principalmente, da feroz concorrência travada pelos mais diferentes players pelo share of mind e share of heart da audiência. O momento certo é fundamental. Quanto menor for a “interrupção”, mais o consumidor será receptivo e com mais facilidade a mensagem será assimilada.

Do lado do anunciante, é fundamental manter uma mente aberta e sagaz para receber e avaliar propostas, seja para viabilizar o novo, seja para fazer de maneira nova o conhecido, alcançando assim uma eficácia crescente. Do lado da agência, há o desafio de estudar profundamente o cardápio de mídias e formatos disponíveis, analisar o comportamento das audiências e buscar a fina sintonia entre as metas almejadas pelo anunciante e as condições dentro das quais ele atuará, sem perder de vista a necessária proatividade e a saudável impertinência de propor o que não é habitualmente feito.

O momento exige que deixemos o piloto automático de lado e pensemos com sensibilidade e espírito crítico, que podem até mesmo subverter a técnica e a norma, derrubando assim crenças que tendem a engessar um olhar livre de preconcepções.

A equação se sofisticou, e hoje é composta da presença do consumidor, da relevância da marca ou do produto, do ponto de contato escolhido, da atenção do público voltada ao ponto de contato, da relevância do local escolhido para essa interação e do momento em que ela se dá, constituindo-se assim numa ciranda que deve estar em constante movimento. Ou seja, temos de obviamente conhecer a marca, mas, mais do que nunca, conhecer o mundo emocional que circunda a relação entre o consumidor e a marca".


Fonte: Por Luca Cavalcanti, in www.meioemensagem.com.br

Comentários

CVF disse…
interessante o post... Os proprietarios de emissoras de tv ja estao sentindo uma perda nos lucros. Com a reduçao e fragmentaçao das audiencias, tambem cairam as receitas de propagandas geradas pelas marcas que construiram suas imagens com publicidade na televisao de massa.

A própria industria da propaganda elegeu o comercial "1984" da apple um icone da criatividade. Ele lançou o apple mac e foi vinculado uma única vez durante a transmiçao do superbowl. Este comercial foi inspirado no romance escrito por Eric Arthur Blair sob o pseudônimo de George Orwell: "1984" onde o estado controlava o pensamento dos cidadãos atraves da mídia, com a imagem de um "Grande irmao", e mostra uma jovem destruindo a imagem do big brother que esta sendo exibida para seus alienados e submissos seguidores. neste video podemos observar uma forte tendência do atual cenário midiatico, onde o Big Brother que representa a televisao, que é uma via de mao unica onde a informaçao vai de um para muitos, é destruida por uma jovem que representa uma nova mídia, o computador.
http://www.youtube.com/watch?v=OYecfV3ubP8

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