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A gestão dos cinco sentidos

Diálogo, palavra de origem grega que quer dizer dia (duplo) e legien (conversar), ou seja, dupla conversa ou ainda a conversa que se exerce a dois. Os gregos entendiam que, por haver uma conversação entre duas pessoas, poderia haver geração de conhecimento, resultando no exercício do logos – que é definido por Sócrates como palavra ou conversa.

Logos pode ser também linguagem, proposição, definição; palavra; noção, razão; senso comum; motivo; juízo, opinião. No sentido filosófico passa a significar “a razão que se dá a algo”, ou mais propriamente conceito.

Assim, e como consqüência desse questionamento entre duas ou mais pessoas, pode-se criar uma epistême – palavra também de origem grega que quer dizer opinião fundamentada. Neste caso, com dois ou mais indivíduos. O contrário de epistême é a doxa, ou seja, a opinião sem fundamento.

Se toda a resposta aplaca uma angústia, o questionamento, a conversação e seus similares têm como uma de suas funções a possibilidade de minimizar as dúvidas e as questões sem solução, ainda que no mais das vezes não definitivamente, abrindo a possibilidade de novos conhecimentos fundamentados.

O advento dos meios de comunicação em um passado não recente afetou os sentidos do corpo a ponto de que as novas tecnologias geradoras de imagem e por elas governadas passam a sobrepor-se à pessoa como menciona Gunter Wilhelm Uhlmann. Criou-se, como ensina o professor Norval Baitello, a tecnologia do afastamento e da virtualização das pessoas em função das modernas tecnologias de conversas entre as pessoas.

A gestão, a administração e as empresas, de um modo geral, via de regra não ficaram isentas desses problemas. O quadro a seguir apresenta um modo de ver o processo em questão, em que os sentidos podem ser influenciados pelos meios de comunicação de algumas maneiras.

Uma escala de zero a dez foi empregada para definir o grau de intensidade de utilização de cada um dos sentidos do corpo em cada uma das épocas descritas. O grau 10 denota a máxima utilização do sentido em questão e o grau zero a ausência do sentido avaliado. Assume-se, apenas para fins deste raciocínio, que o aparecimento do correio eletrônico ou e-mail foi posterior ao advento da internet.

Época remota | Era do rádio | Era da televisão | Era do telefone | Era da internet | Era do e-mail

Visão: 10 | Zero | 10 | Zero | 8 | 8
Audição: 10 | 10 | 10 | 10 | 4 | Zero
Tato: 10 | Zero | 1 | Zero | Zero | Zero
Olfato: 8 | Zero | Zero | Zero | Zero | Zero
Paladar: 5 | Zero | Zero | Zero | Zero | Zero

Os sentidos do corpo humano, na vertical, são comparados com as eras e a forma principal de comunicação.

Pode-se então observar (sem, contudo ser uma conclusão definitiva) no quadro acima que a conversação dos antigos promovia a utilização dos cinco sentidos do corpo humano em diferentes graus de intensidade e que, neste caso, os vínculos corpo a corpo eram elevados. Em outras palavras, os processos de comunicação eram feitos olho no olho, pele a pele, corpo a corpo.

Já na era do rádio, todos os sentidos são eliminados do processo de comunicação e a audição tem seu grau máximo. Na era da TV, a audição e a visão são privilegiadas, sendo que nas fases seguintes nota-se a restrição do uso de alguns dos sentidos em detrimento de outro.

Em contrapartida, na era do e-mail os vínculos e os sentidos do corpo humano são nulos. Inexistentes. O e-mail afasta as pessoas e os contatos. Elimina a conversação, o questionamento e, em larga escala, a possibilidade de gerar o conhecimento. Não existe o diálogo como queriam/definiam os gregos. De cada um dos lados de um monitor de computador os indivíduos “conversam” com o remetente do e-mail e “dialogam” entre si. Para os filósofos gregos este não seria um processo de diálogo, porque não é uma conversa dupla e sim unilateral.

Em uma empresa de qualquer tipo, normalmente o que acontece é a cultura do e-mail. Pessoas trocam entre os seus computadores os dados e as informações. Podem até gerar o conhecimento nestes processos, todavia os sentidos do corpo humano estão abolidos.

As pessoas em uma organização estão presas a um instrumental que as protegem fisicamente, impedem o contato humano e restringem a capacidade de promover o dia-logien e, portanto, a visão, a audição, o tato, o olfato e o paladar não existem.

A comunicação empresarial, hoje em dia, é muito pequena. Ao conversar com aquele para quem eu mandei um e-mail, o faço dentro de normas, regras e protocolos que impedem a discussão de assuntos em sua totalidade. Limitam o raciocínio porque explicar-se por escrito é totalmente diferente de pessoalmente e tendem a impedir a troca de olhares, gestos e posturas que incrementam a comunicação e, sobretudo, inibem a divergência fundamentada, a discordância ética e, por fim, o acordo entre pessoas que inicialmente tinham posições diferentes. Em um processo de “diálogo antigo” tais dificuldades, provavelmente, seriam desprezivelmente significativas.

Talvez seja esta uma das razões da falta de comunicação interna em uma empresa. Ouvimos muitas vezes essa justificativa para explicar diversos problemas internos. Assim, ainda que o e-mail seja imprescindível, nada substitui o bate-papo pessoal, base para todo processo de comunicação e para a evolução das organizações cujas culturas vêm preocupantemente evoluindo sem um efetivo processo de comunicação. Ou ele é deficiente, provavelmente por conta do argumento apresentado. Uma hipótese a ser testada!


Fonte: Por Isaac Gil, in www.revistafator.com.br

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