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Marcas "unforgettable"

Transcrevo aqui a íntegra do artigo "Unforgettable", de autoria de Jaime Troiano, sócio-diretor da Troiano Consultoria de Marca e publicado no site Mundo do Marketing. Vale a pena conferir o que pensa o autor sobre marcas que realmente ficam na lembrança dos consumidores. Leitura obrigatória:


"Vamos começar com um teste.

1.“Tá na hora de dormir, não espere mamãe mandar, um bom sono prá você e um alegre despertar” (Cobertores Parahyba).

2. “Estrela brasileira no céu azul, iluminando de norte a sul. Mensagem de amor e paz, nasceu Jesus, chegou o Natal...” (Varig)

3. “Não adianta bater, eu não deixo você entrar, as Casas Pernambucanas é que vão aquecer o meu lar...” (Pernambucas)

4. “A vaquinha Mococa está mugindo, muuu... A vaquinha Mococa está dizendo...” (Leite em pó Mococa)

Pergunta: de quantas dessas mensagens você se lembrou? Em geral, é muito raro que o resultado tenha sido menos do que três. Por outro lado, quem se lembrou de todas não merece nenhum prêmio especial. Isto apenas pode reafirmar seu sentimento pessoal de pertencer a um universo de muitos milhões de outras pessoas que também registraram essas mensagens.

Estes e outros exemplos - e não obrigatoriamente jingles - fazem parte do patrimônio sensorial, visual e sentimental de suas respectivas marcas. Eles foram tombados pelos consumidores!

Porque elas assumiram essa dimensão “ecológica” e são preservadas com tanto carinho por todos nós consumidores não é tão fácil explicar. Certamente, deve existir uma combinação de vários fatores. O primeiro deles é sem dúvida o talento criativo e estratégico que a gerou. Mas além disso, o momento histórico e a situação de mercado e da concorrência na ocasião devem também ter pesado. De qualquer maneira porém, elas resistiram e, algumas, até floresceram com o passar do tempo. E nem sempre é muito fácil identificar a fórmula dessa longa existência.

De uma forma ou de outra, elas ficaram porque foram injetadas na veia dos consumidores, ao contrário da maior parte dos trabalhos que têm apenas uma ação epidérmica. Esta é uma situação muito parecida com os contos de fada: há inúmeros de que nunca ouvimos falar e morreram logo. Os que nós conhecemos, cultivamos e ainda contamos para nossos filhos são os que não têm apenas ingredientes subcutâneos.

Ao contrário dos contos de fada, das árvores e dos casarões tombados, talvez seja difícil explicar porque aquelas criações sobrevivem com tanta força e permanecem sempre tão atuais. Uma coisa, porém, temos que admitir, como parte dessa tentativa de explicação elas traduzem sentimentos e percepções que estão na essência de suas marcas. Algo que as individualiza e eterniza o seu patrimônio.

Bem, se aceitarmos essas premissas, eu sou obrigado a me perguntar mais uma vez o seguinte: não está na hora de pensarmos melhor antes de praticarmos um desmatamento predatório de algumas dessas imortais criações? Não está na hora de pararmos de pôr abaixo os “velhos casarões” e de lutarmos contra aquilo que está pronto e bem guardado no coração e na cabeça dos consumidores?

Este não é o grito de um ambientalista ingênuo, diante dos predadores maldosos! Não é coisa de mocinho e bandido. É sobretudo a constatação de que, inúmeras vezes, nós temos assistido à substituição, esta sim ingênua, do conceito original e mágico por algo que pretende ter a virtude de ser novinho em folha e atual.

De onde vem essa fúria de mudança e essa insensatez estratégica nos negócios?

Em primeiro lugar, parece que estamos falando de comportamentos que são muito mais típicos ao sul do Equador. Tudo indica um comportamento muito mais maduro e inteligente nos US e Europa, no que diz respeito à preservação “ecológica” de peças do patrimônio mercadológico. As iniciativas que conduzem ao abandono dessas idéias originais fortes e inesquecíveis são praticadas em nome da busca da assim chamada modernidade. O que é um ponto-de-vista que aparece mais naturalmente em países que ainda não são de fato modernos - como é o nosso caso.

“Para tornar meu negócio e minha marca mais contemporâneos, o que temos que fazer é enterrar essas coisas antigas e rançosas que cheiram mofo!” (Palavras típicas do filho do dono, que após um curso de administração, começa a assumir a gestão dos negócios). Ou então: “Está na hora de um revamp nos sinais de identificação da marca e de torná-la mais fashionable” (Palavras típicas da nova agência, ou do novo diretor de criação.) Ou mesmo: “A reengenharia da sua marca é a forma de adaptá-la aos novos paradigmas da modernidade” (Palavras típicas do consultor, na apresentação da proposta.)

Apesar de alguma ironia, as coisas se passam mais ou menos assim mesmo. E o difícil nessa hora, é assumir o papel do conservador, o papel daquele que quer a todo custo lutar pela preservação e se opor ao “desmatamento” estratégico do negócio. O grupo dos que querem sepultar um jingle, um conceito, um sinal de identidade que seja, é sempre mais numeroso. O grupo dos que estão em busca do atual, contemporâneo e moderno é sempre maior que o pelotão de guardiões da marca. Resultado: normalmente, você fica com cara de bobo nessas reuniões. E é capaz de ser descartado junto com o resto.

Tudo indica que o Brasil que estamos vivendo hoje e nos próximos anos é diferente. O crescimento do negócio de comunicação em nosso país pode se alimentar muito do que já foi tombado pelo consumidor. O caminho da modernidade depende muito mais de um cuidado de identificar, recuperar e ajustar temas e conceitos vencedores que ficaram em nossa consciência coletiva. Depende muito mais disso do que da sumária terraplanagem do que - supostamente - é velho. Ouçam o consumidor e constatem que coisas aparentemente rançosas são mantidas e cultivadas por ele como se fossem inesquecíveis e eternas. Mas não deixem de ouvi-lo! Não confiem apenas em nossa intuição individual e em nossa arriscada compulsão pela modernidade.

Dentro de trinta anos, se alguém poderá propor o seguinte teste: (1) O que é que tem 1001 utilidades? (2) O que é que desce redondo? Qual é a marca de eletrodoméstico que não tem comparação? Acho que ninguém terá dúvida em dar as respostas certas".


Fonte: Por Jaime Troiano, in www.mundodomarketing.com.br

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