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Desperdícios de marketing: onde começam e onde podem terminar

Em nosso país, detentor de uma longa e variada cultura de desperdícios, tomar a iniciativa de atacar os desperdícios de marketing pode parecer subtrair uma gota ao oceano.

Entretanto, se houvesse, em cada área específica, uma preocupação semelhante, provavelmente as coisas não seriam como são hoje, e os desperdícios em geral se comportariam de forma mais administrável, sendo bem menos prejudiciais à nossa economia e à nossa vida.

A verdade é que tendemos, por comodismo ou desinformação, a menosprezar os efeitos do desperdício, ora considerando que eles são inerentes a todo e qualquer negócio, ora avaliando que é custoso demais identificar suas fontes e pouco realista combatê-los eficazmente.

Ao eleger os desperdícios de marketing como campo de atuação, ainda enfrentamos outros preconceitos. O primeiro deles é entender essa proposta como voltada exclusivamente para uma eventual redução dos gastos com propaganda.

É curioso como a propaganda, e os profissionais ligados a ela, sofrem de má consciência. Sendo o pecado original da categoria a célebre história do empresário que admitia saber que 50% de seus investimentos em propaganda eram inúteis. Ele apenas não sabia identificar quais 50% funcionavam.

Desse tempo para cá muita água rolou e muitas tecnologias de aferição foram desenvolvidas, de tal forma que essa história passou a ser encarada como uma piada, parte do variado folclore da propaganda, mas que ainda hoje provoca calafrios.

A propaganda, por se apresentar algumas vezes como resultado de um excesso de intuição ou como fruto de um brilhantismo criativo por vezes inconseqüente, acaba aceitando uma carapuça que, embora lhe sirva, não foi feita exclusivamente para ela.

Antes de transformar a propaganda no bode expiatório dos desperdícios em marketing, convém encarar outros vilões, tão ou mais perniciosos. Especialmente pelo fato de serem “esquecidos”.

Em primeiro lugar, destaque para o targeting. O processo de pensar estrategicamente a segmentação, fugindo ao lugar comum dos mercados maduros e saturados, é um exercício pouco freqüente, mas altamente promissor, repleto de recompensas a serem conquistadas. Localizar novos nichos de mercado e buscar novas oportunidades de negócios exigem tempo, capacidade, sensibilidade, visão e coragem de assumir riscos. Porém, se assim não fosse, qual seria a graça, não é mesmo? Brincadeiras à parte, existem ferramentas de pesquisa apropriadas para a identificação de nichos promissores, ou seja, para a criação das chamadas “ilhas de consumidores”, mais propensas à lealdade e mais rentáveis para as empresas e suas marcas.

Outro aspecto pouco reconhecido diz respeito aos posicionamentos. Aqui, novamente, o que mais se vê é a opção pelo posicionamento genérico, pouco relevante, sem diferenciais reais ou vantagens reconhecíveis. Tudo bem. É cada vez mais difícil sustentar por longo prazo um diferencial efetivo. As cópias se apresentam a cada dia mais fiéis, mais baratas e mais acessíveis. Porém, isto faz somente com que o desafio seja maior, mas não impossível. Buscar um posicionamento que não se confunda com a categoria de produto traz como fruto resultados palpáveis em termos de performance e produtividade de vendas.

Transferir para a propaganda o ônus da diferenciação de qualquer produto ou serviço é preguiça e, mais uma vez, fonte de desperdícios. Fazer a mesma coisa por meio de promoções é ilusório, normalmente traz significativos custos embutidos e, de novo, não resolve a falta de posicionamentos verdadeiros.

Se os vilões, ou alguns deles, são o targeting pouco preciso e a falta de posicionamentos relevantes, de quem é a culpa? Certamente não das agências de propaganda. Nesses casos o buraco é mais em cima e anterior, cronologicamente falando.

Generalizando, podemos afirmar que são várias as causas dos problemas com o targeting e o posicionamento, merecendo destaque aspectos que se tornaram típicos nas corporações atuais: a tirania do trimestre, as conference calls, as reuniões intermináveis, os relatórios semanais, mensais, trimestrais, a cobrança de resultados mais imediatos etc. Resumindo: a falta de tempo que torna os executivos seniores menos disponíveis para pensar estrategicamente os negócios sob sua responsabilidade e a conseqüente multiplicação de executivos menos experientes em funções que exigiriam mais supervisão do que é possível lhes dar.

De maneira resumida, seria este o cenário abrangente onde começam os desperdícios de marketing. Não somente na propaganda, embora nela as manifestações possam ser mais coloridas e esfuziantes. Porém, bem antes disso, nos departamentos de marketing sob o jugo dos deadlines e das equipes juniores, bem intencionadas, bem formadas muitas vezes, mas carentes de algo que somente o tempo lhes dará, a experiência necessária.

Como esses desperdícios podem ser reduzidos ou minimizados? Assumindo que o marketing deve ser preciso. Uma precisão alcançável quando se busca a convergência do targeting eficaz com promessas de marca verdadeiras e relevantes, traduzidas em mensagens persuasivas e pertinentes, no timing mais adequado.

Para se chegar a essa convergência certeira é necessário agregar inteligência de marketing + imaginação + validação financeira.

- Inteligência de marketing no uso e na interpretação das informações obtidas por estratégias de pesquisa inovadoras. É preciso ir além dos focus groups, dos bancos de dados e de media optimizers. É preciso ter respostas rápidas, acionáveis e conclusivas.

- Imaginação na busca por idéias honestas, emocionais, relevantes e motivadoras que reforcem o poder da marca e mobilizem as pessoas.

- E validação ao se empregar pilotos e business cases para confirmar e ajustar as estratégias, as métricas de marketing, de vendas e, principalmente, os parâmetros financeiros.

Esta é a única fórmula que conhecemos para que o marketing seja visto como investimento e não como mais uma despesa.

Simples, não é. Factível, seguramente.


Fonte: Por Álvaro Auler, in Portal HSM On-line

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