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Marketing de experiência: A conquista do sentir, do pensar e do agir dos clientes

Quem tem mais de 40 anos hoje se lembra da terrível experiência que era ir ao dentista durante a infância. Aquela sala fria com mobiliário cinzento! As roupas, as paredes e os acessórios sempre alvos! O tilintar agudo dos metais! O ruído cortante do motorzinho! A visão apavorante dos instrumentos expostos na mesinha! Que trauma!

Essas memórias afastam o desejo de visitar o dentista até nos dias atuais. Mas não é isso que acontece com as crianças, adolescentes e jovens que, desde os anos 80 podem ter a prazerosa experiência de serem cuidados pela tia Myrian. A Dra. Myrian Stella de Paiva Novaes, doutora em odontopediatria e mestre de muitos profissionais que passaram pela UFU, com seu carinho e carisma peculiares, alegria e simpatia autênticas, conquista a confiança de seus jovens pacientes e sempre retribui essa fiúza com pequenos mimos que incentivam o desejo de voltar. O ambiente é colorido; os móveis, os brinquedos, os games, os livros e os filmes convidam as crianças para o conforto e para o prazer. O “diploma de coragem” e o colar para guardar o dentinho que abandonou os coleguinhas da boca simbolizam o reconhecimento pela bravura. Com tudo isso, seus pacientes não querem deixá-la, mesmo que a infância já seja apenas registros na memória. Meu próprio filho, nos seus 25 anos de idade e que hoje trabalha bem longe de Uberlândia, só vai ao dentista quando aqui retorna anualmente para visitar a família e, logicamente, a visita é para a tia Myrian.

Com a grande variedade de mercados e empresas de consumo, de serviços e de tecnologia, para comunicar-se com os clientes, melhorar as relações nas vendas, escolher parceiros, planejar ambientes de varejo, desenvolver produtos e criar web sites, é fundamental que as organizações transformem a situação ou a relação de compra e venda em experiências memoráveis. Isto implica em viabilizar o prazer por meio dos sentidos (experiências sensoriais), criar registros positivos e inesquecíveis por meio dos sentimentos (experiências emocionais), gerar expectativa pelo consumo por meio dos pensamentos (experiências cognitivas criativas), promover as atitudes decisivas nas escolhas de consumo por meio das ações (experiências físicas e de estilo de vida), e, finalmente, gerar e fidelizar os clientes por meio da relação com um grupo ou uma cultura de referência (experiência de identificação social).

Para isso, devem ser utilizados os “provedores de experiências”, que são as ferramentas de comunicação, a identidade visual e verbal, a presença dos produtos nos pontos-de-vendas, o merchandising, o espaço ambiental, o site, a mídia eletrônica e as pessoas. Assim, pela criação de uma experiência holística, bem percebida pelos consumidores por meio de seus aspectos memoráveis e prazerosos, por conseqüência, aumentam-se as chances de que esses clientes retornem às compras. Isto significa dizer que, mesmo em ambientes extremamente competitivos, os fatores decisivos na escolha não serão necessariamente a qualidade, o menor preço e a localização conveniente. As lembranças positivas registradas podem e devem influenciar a escolha e a fidelidade, principalmente quando se trata de bens de consumo e serviços padronizados ou de baixa diferenciação. Tecnicamente, muitos outros dentistas devem estar preparados para atender um jovem de 25 anos. Mas ele prefere repetir as boas experiências com aquela que lhe conquistou desde a tenra infância, confiança que é retroalimentada pela qualidade do trabalho e das relações pessoais e pela renovação das boas experiências, independente do preço ou da distância de onde ele mora.

Uma revolução no marketing tradicional tem tornado seus princípios e modelos obsoletos. Não são só características e benefícios de produtos que fazem a diferença. A qualidade intrínseca e a acessibilidade da maioria de bens de consumo e serviços tornaram-se pré-requisitos. Fenômenos como a onipresença da tecnologia da informação, a supremacia da marca e a ubiqüidade das comunicações integradas e do entretenimento apontam para uma nova abordagem do marketing. Assim, velocidade, leveza, convergência, praticidade e agilidade são premissas do desenvolvimento tecnológico. A força, o domínio, o poder e a expansão das marcas garantem um melhor desempenho no mercado acionário, inclusive para as marcas pessoais ou de instituições, na medida em que elas trazem à mente imagens, associações e experiências distintas e ampliadas e ganham ramificações. Tudo na empresa é uma forma de comunicação: o comportamento e as decisões dos acionistas, as instalações físicas, os funcionários, os uniformes, as peças publicitárias, a embalagem, o cheiro, as ações sócioambiental, etc. Ou seja, todas as formas de comunicação estão ligadas à marca e afetam todos os demais stakeholders (consumidores, investidores, imprensa, comunidade).

Desse modo, a forma como a empresa apresenta os produtos, se relaciona e se comunica com o mercado expõe a organização e seu portfólio ao escrutínio público e tem o poder de fazê-la crescer ou destruí-la. Isso porque, no ambiente global, o tom da comunicação e das ações de marketing não se constitui mais essencialmente só de informações. É preciso entreter! É preciso voltar-se para o “cliente”, para o “valor” e para a “comunidade” e não poupar esforços para divertir os consumidores, pois, atualmente, eles consideram que características e benefícios funcionais, qualidade de produto e marca positiva são coisas absolutamente normais. É o estímulo dos sentidos que mexe com as emoções e com a cabeça a ponto de fazer alguém incorporar um produto ao seu estilo de vida. O grau segundo o qual uma empresa poderá fornecer uma experiência desejada vai determinar seu sucesso, pois vai orientar o comportamento de seus clientes.

Portanto, em oposição ao marketing tradicional, baseado nas características e nos benefícios dos produtos, o marketing experiencial ou experimental tem foco nas experiências que promove para o consumidor, resultantes do encontro e da vivência de situações que estimulam os sentidos, os sentimentos e a mente. Logicamente, é preciso examinar a situação de consumo indo além de categoria de produto e da concorrência. Neste contexto, não se deve pensar só na restauração, extração ou limpeza do dente, mas na experiência de bem- estar e conforto. Como lidar com as evidências negativas, tais como o ruído do motor, a anestesia, o cheiro de medicamentos no consultório, a sensação de não saber o que o dentista está fazendo, a visão do instrumental de trabalho, a monotonia do olhar contínuo para o teto, a sala de espera vazia, o acompanhamento das experiências negativas de outros pacientes e a impossibilidade de comunicação paciente-dentista durante o atendimento? Como transformar a experiência de um tratamento odontológico que implica dores e traumas em uma experiência prazerosa? O que “vender” e comunicar? Como fazer o paciente comprar a solução de um problema sem ter a percepção de estar pagando para sofrer? Que idéia ou conceito deve ser transmitido na informação dada ao consumidor que vai ressaltar os atributos positivos do tratamento odontológico? Existem sensações positivas do tratamento odontológico?

Além do entretenimento a ser trabalhado com crianças, jovens e adultos, existem os fatores de contexto social que favorecem a decisão de se submeter ao tratamento, tais como: inserção social, aceitação pelo grupo de convívio, promoção e valorização da imagem, aumento da autoconfiança e segurança, melhoria na comunicação e saúde física e emocional. Portanto, é preciso fazer com que o paciente deseje e planeje ir ao dentista em busca de uma imagem (transformação) que lhe vai permitir atingir todas as conquistas pessoais que almeja. A busca do prazer e da realização pessoal sem sofrimento exige que se trabalhe no sentido de ambientar o consultório e a sala de espera, estabelecer um programa de relacionamento e fidelização com identidade própria e forte em networking, criar surpresas agradáveis, desenvolver um plano de comunicação e promoção da imagem pessoal e da saúde, permitir a interferência do paciente na definição do tratamento para criar “identidade”, adotar novas tecnologias, estruturar um plano de treinamento da equipe que a prepare para a cortesia, bom humor, excelência no atendimento e boa imagem, além de tangibilizar benefícios e comemorar as vitórias dos pacientes. Se o exemplo vale para uma experiência de consumo historicamente negativa, o que dizer sobre o consumo de produtos desejados?


Fonte: Por Valéria Vieira da Silva, in www.revistanegocios.com.br

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