Com um admirável poder de síntese, o filósofo Edgar Morin emudeceu uma platéia de cerca de 1.000 pessoas, em dezembro, em São Paulo.
Em pouco tempo de explanação, fez caber seu amplo pensamento sobre "a humanidade no século XXI", tema ambicioso que lhe coube desenvolver no Encontros de Sustentabilidade, uma série de palestras com personalidades mundiais promovida pelo Banco ABN Real.
Do Homo erectus ao sapiens, Morin, nascido em 1921, traçou uma linha do tempo que abarca a globalização, o acúmulo do conhecimento, a expansão da consciência e o desenvolvimento humano necessário para se preservar a sociedade humana sobre a Terra.
"O século XXI é resultado de uma aventura que começou há milhões de anos", disse na abertura da palestra. Foi neste século que houve a plena consciência do ser humano sobre sua capacidade de pôr fim à própria existência e à de toda a vida no planeta.
Segundo Morin, dos caçadores-coletores que constituíam grupos poucos numerosos, sem Estado, sem agricultura, sem as cidades, partiu o primeiro movimento de globalização de que se tem notícia: eles próprios se espalharam pelo mundo, em contínua busca de comida e abrigo.
Movimentos sucessivos de globalização se deram a partir daí. A da colonização pelos países dominantes, com métodos perversos como o escravismo; a dos mercados, com a expansão do capitalismo até para locais proibidos como China e ex-União Soviética, e das comunicações, com a fantástica interligação promovida pela tecnologia da informação.
Na visão do filósofo, esses ciclos de globalização, entretanto, denunciam um paradoxo: vivemos em um mundo unificado e ao mesmo tempo extremamente fragmentado, com nações em guerras e incompreensão entre as pessoas. Isso é potencializado pelo estado de caos a que chegamos nesse século, com a degradação da biosfera e o aquecimento global.
Mas, por mais que o mundo esteja fragmentado, há um destino comum entre todos sobre a Terra. É o que Morin chama de "comunidade de destino". "É preciso fazer da Terra nosso espaço comum. Essa é a condição central do humanismo", afirmou. Segundo ele, a forma de organização dos Estados-Nação impede o exercício desse humanismo necessário para a preservação da vida na Terra.
"Temos um problema: como superar a soberania das nações, preservando a divisão política dos países, e ao mesmo tempo criar uma comunidade de destino?" Para ele, também se torna necessária uma reforma do conhecimento, de forma que a humanidade seja capaz de compreender a complexidade do universo.
Segundo Morin, o sistema criado pelo homem chegou a uma crise aguda e, sempre que um sistema não pode lidar com seus problemas, ou se desintegra ou sofre uma metamorfose. Ele exemplifica. A crisálida é um caso de sistema em crise, que se auto-destrói para se reconstruir, e dar origem a um novo sistema, a borboleta.
"Mas a metamorfose pode também produzir o pior", pontuou, afirmando que vivemos sob um altíssimo grau de incerteza sobre o futuro. Apesar de ter pintado um cenário sombrio, Morin fechou seu pensamento com uma mensagem positiva. "Como estamos em crise planetária, as possibilidade de criação e invenção podem acontecer a qualquer momento". Sua grande confiança está no poder de evolução humana. "Temos, (fisicamente) o mesmo cérebro do Homo erectus. Assim como ele não sabia de todas as potencialidades que viria a desenvolver, nós também não sabemos quais são as nossas possibilidades de desenvolvimento futuro. Isso é um princípio de esperança", afirmou.
Mais que isso, Morin disse que devemos esperar pelo improvável, pois em geral é um fenômeno que acontece mais que o provável. E enumerou: era provável que o Império Persa aniquilasse Atenas, mas foi posto em fuga e logo depois nascia na cidade grega a democracia. A vitória nazista também parecia inevitável. O núcleo cristão nasceu minúsculo e se disseminou enormemente pelo globo. O islamismo também. Tanto a vitória de Cristo como a de Maomé eram improváveis. O mesmo pode ocorrer com a improvável vitória da aventura humana sobre a Terra.
Com esse tom de esperança, Morin não pretende acomodar as pessoas e nações, mas afugentar o catastrofismo que paralisa e assim fazer a humanidade buscar suas saídas.
Fonte: Por Amália Safatle, in terramagazine.terra.com.br
Em pouco tempo de explanação, fez caber seu amplo pensamento sobre "a humanidade no século XXI", tema ambicioso que lhe coube desenvolver no Encontros de Sustentabilidade, uma série de palestras com personalidades mundiais promovida pelo Banco ABN Real.
Do Homo erectus ao sapiens, Morin, nascido em 1921, traçou uma linha do tempo que abarca a globalização, o acúmulo do conhecimento, a expansão da consciência e o desenvolvimento humano necessário para se preservar a sociedade humana sobre a Terra.
"O século XXI é resultado de uma aventura que começou há milhões de anos", disse na abertura da palestra. Foi neste século que houve a plena consciência do ser humano sobre sua capacidade de pôr fim à própria existência e à de toda a vida no planeta.
Segundo Morin, dos caçadores-coletores que constituíam grupos poucos numerosos, sem Estado, sem agricultura, sem as cidades, partiu o primeiro movimento de globalização de que se tem notícia: eles próprios se espalharam pelo mundo, em contínua busca de comida e abrigo.
Movimentos sucessivos de globalização se deram a partir daí. A da colonização pelos países dominantes, com métodos perversos como o escravismo; a dos mercados, com a expansão do capitalismo até para locais proibidos como China e ex-União Soviética, e das comunicações, com a fantástica interligação promovida pela tecnologia da informação.
Na visão do filósofo, esses ciclos de globalização, entretanto, denunciam um paradoxo: vivemos em um mundo unificado e ao mesmo tempo extremamente fragmentado, com nações em guerras e incompreensão entre as pessoas. Isso é potencializado pelo estado de caos a que chegamos nesse século, com a degradação da biosfera e o aquecimento global.
Mas, por mais que o mundo esteja fragmentado, há um destino comum entre todos sobre a Terra. É o que Morin chama de "comunidade de destino". "É preciso fazer da Terra nosso espaço comum. Essa é a condição central do humanismo", afirmou. Segundo ele, a forma de organização dos Estados-Nação impede o exercício desse humanismo necessário para a preservação da vida na Terra.
"Temos um problema: como superar a soberania das nações, preservando a divisão política dos países, e ao mesmo tempo criar uma comunidade de destino?" Para ele, também se torna necessária uma reforma do conhecimento, de forma que a humanidade seja capaz de compreender a complexidade do universo.
Segundo Morin, o sistema criado pelo homem chegou a uma crise aguda e, sempre que um sistema não pode lidar com seus problemas, ou se desintegra ou sofre uma metamorfose. Ele exemplifica. A crisálida é um caso de sistema em crise, que se auto-destrói para se reconstruir, e dar origem a um novo sistema, a borboleta.
"Mas a metamorfose pode também produzir o pior", pontuou, afirmando que vivemos sob um altíssimo grau de incerteza sobre o futuro. Apesar de ter pintado um cenário sombrio, Morin fechou seu pensamento com uma mensagem positiva. "Como estamos em crise planetária, as possibilidade de criação e invenção podem acontecer a qualquer momento". Sua grande confiança está no poder de evolução humana. "Temos, (fisicamente) o mesmo cérebro do Homo erectus. Assim como ele não sabia de todas as potencialidades que viria a desenvolver, nós também não sabemos quais são as nossas possibilidades de desenvolvimento futuro. Isso é um princípio de esperança", afirmou.
Mais que isso, Morin disse que devemos esperar pelo improvável, pois em geral é um fenômeno que acontece mais que o provável. E enumerou: era provável que o Império Persa aniquilasse Atenas, mas foi posto em fuga e logo depois nascia na cidade grega a democracia. A vitória nazista também parecia inevitável. O núcleo cristão nasceu minúsculo e se disseminou enormemente pelo globo. O islamismo também. Tanto a vitória de Cristo como a de Maomé eram improváveis. O mesmo pode ocorrer com a improvável vitória da aventura humana sobre a Terra.
Com esse tom de esperança, Morin não pretende acomodar as pessoas e nações, mas afugentar o catastrofismo que paralisa e assim fazer a humanidade buscar suas saídas.
Fonte: Por Amália Safatle, in terramagazine.terra.com.br
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