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A estratégia da Natura para sair da crise

O dia 27 de fevereiro é aguardado com ansiedade incomum pelos acionistas da Natura, maior empresa de cosméticos do país. Às 18 horas, após o fechamento da bolsa de valores, a Natura divulgará ao mercado os dados de seu desempenho financeiro em 2007. O motivo para essa expectativa é a perspectiva de uma guinada nos resultados da companhia. Em anos anteriores, a Natura acostumou os investidores a receber excelentes notícias no dia da divulgação de seu balanço anual. A trajetória foi ligeiramente alterada no fim de 2006, quando seus executivos anunciaram queda no lucro no último trimestre do ano. À época, a empresa informou que os resultados fracos eram pontuais e seriam revertidos em 2007 -- o que tornou a divulgação do balanço ainda mais aguardada. Para tentar antecipar os números, EXAME ouviu os mais conceituados analistas responsáveis pela cobertura da Natura em sete bancos de investimento e teve acesso aos relatórios de mais um. Suas projeções mostram uma notável convergência: caso os bancos estejam corretos, a Natura divulgará no dia 27 um dos piores resultados de sua história.

De acordo com a análise dos financistas, a Natura vai anunciar uma conjunção de números decepcionantes. O primeiro deles é a taxa de crescimento da receita, estimado em 11% e muito inferior à média histórica de 27%. O lucro, ainda de acordo com as projeções, crescerá menos. Os mais pessimistas esperam queda de 4% no resultado. Os mais otimistas, crescimento de 5%, considerado fraco. Finalmente, a rentabilidade da Natura deve fechar o ano em 22,7%, 1 ponto percentual menos que no ano anterior e 2 pontos menos que o número obtido em 2005. O reflexo dessa queda no desempenho vem sendo percebido na cotação das ações da Natura na bolsa de valores. A queda no valor de mercado da companhia foi de 45% em 2007. O caso da Natura -- um dos empreendimentos brasileiros mais bem-sucedidos nas últimas décadas -- é um poderoso exemplo de quanto a vida de uma empresa aberta pode ser dura. A maior fabricante de cosméticos do país continua a crescer e a dar lucro. Continua a ter uma marca forte e uma grande participação de mercado. Mas, para um mercado de capitais movido a expectativas e viciado em crescimento, isso não é suficiente. Pode-se questionar se há racionalidade ou visão de longo prazo nisso. Mas essa é a vida como ela é. A visão do mercado fica clara na declaração de Marianna Waltz, analista de consumo do Banco do Brasil: "Isoladamente, os resultados da Natura não são ruins. O problema é que, se analisarmos o histórico da companhia, esse é claramente um tropeço".

A opinião dos analistas
A EXPLICAÇÃO PARA O DESEMPENHO recente da Natura tem duas vertentes. A primeira refere-se à estratégia de inovação da empresa. Para medir o ritmo de inovação, a companhia usa um índice que mostra quantos de seus produtos vendidos foram criados nos últimos dois anos. Esse índice caiu de 66,8% para 54,2% nos nove primeiros meses de 2007 em comparação com o mesmo período de 2006. "Como o negócio de cosméticos é movido por novidades, a empresa perdeu vendas e cresceu menos do que poderia", diz Ricardo Fernandez, analista de bens de consumo do banco Itaú. Outro ponto da estratégia da Natura, seu processo de internacionalização, foi em parte responsável pela queda na rentabilidade. Os esforços com a formação de equipes e a adequação de produtos para que a Natura pudesse entrar em sete países deram prejuízo de 46 milhões de reais nos nove primeiros meses do ano. Intensificadas em 2005, as operações internacionais da Natura correspondem hoje a 5% do faturamento total. Evidentemente, é uma aposta que seus controladores fazem no futuro. Mas que vem cobrando seu preço no presente.

A segunda explicação para a redução do ritmo de crescimento da Natura é o aumento da competição. Sua principal concorrente, a americana Avon, renasceu em 2006, depois de quatro anos com praticamente a mesma participação de mercado. No ano passado, suas vendas cresceram 16% no Brasil -- acima do setor e de sua grande rival. A imagem da empresa, antes desgastada e associada a produtos baratos, foi rejuvenescida com a ajuda de celebridades como a atriz Ana Paula Arósio. A ascensão da Avon é resultado de um programa global que elegeu o Brasil como prioridade para os investimentos da companhia. Desde então, a verba de marketing aumentou 270% (em 2007, a verba foi três vezes maior que a da Natura, segundo analistas). Essas medidas não só tornaram as vendas da Natura mais difíceis como forçaram a companhia a investir mais em marketing para fazer frente à concorrente. Nos três primeiros trimestres de 2007, as despesas comerciais da Natura aumentaram 18%.

Diante desse cenário e das acusações de reação letárgica, os executivos e controladores da Natura planejam um contra-ataque. Como permanece em período de silêncio até a divulgação de resultados no dia 27, a empresa não concedeu entrevista a EXAME. Mas analistas e executivos do setor adiantaram alguns pontos de seu plano de reação. Já se sabe, por exemplo, que a empresa vai anunciar em breve a contratação de um novo executivo para ocupar uma de suas posições mais importantes: a vice-presidência de marketing e vendas da operação nacional (responsável por 95% do faturamento da Natura). O escolhido é José Vicente Marino, que deixou a presidência da área de consumo da Johnson & Johnson no dia 14. A missão de Marino é ajudar a liderar "a virada da companhia", nas palavras de um executivo próximo à Natura. Atualmente, Alessandro Carlucci, presidente da Natura, acumula a função. Para completar, os três fundadores da Natura -- Luiz Seabra, Guilherme Leal e Pedro Passos -- estão mais próximos da operação. Seabra, por exemplo, voltou a fazer parte do comitê de produtos da companhia, do qual havia se afastado em 2005. (O afastamento do trio de fundadores da Natura está diretamente relacionado à abertura de capital, ocorrida em 2004. Na ocasião, Seabra, Leal e Passos levantaram 768 milhões de reais com a venda de uma participação de 22% no capital.)

As mudanças se estenderão também para a estrutura comercial da Natura. Até o terceiro trimestre de 2007, a produtividade das vendedoras caiu 3%. Para recuperar a eficiência das equipes, um novo nível hierárquico será criado entre as promotoras (funcionárias do departamento de vendas) e as consultoras (vendedoras). Hoje, cada promotora atende entre 500 e 1 000 consultoras, número considerado alto. Com o novo nível, essa responsabilidade será dividida com as "consultoras orientadoras", que supervisionarão, cada uma, 100 vendedoras. Assim, a companhia espera aumentar seu controle sobre o exército de vendedoras. O modelo é similar ao programa Leadership, da Avon, que aumentou em 2% o número de vendedoras e em 3% as vendas da empresa no começo da década. Os planos da Natura para 2008 incluem, também, a diminuição do portfólio de cosméticos, o lançamento de produtos para atender consumidores de menor renda e uma maior ênfase em inovação. Os investimentos em marketing devem aumentar 25%.

Os reflexos na bolsa
O esforço da Natura para melhorar os resultados e recuperar a confiança dos investidores agradou aos analistas, mas nenhum deles espera uma virada imediata. "Os melhores resultados da empresa só devem começar a aparecer no final do ano e no decorrer de 2009", escreveu o analista Tufic Salem, do Credit Suisse, em relatório de janeiro. "As margens ainda vão cair em razão do aumento dos investimentos em marketing e nas operações internacionais." O motivo para esse ceticismo é a percepção de que as mudanças acontecem num momento em que a competição se acirra ainda mais no mercado doméstico. A Avon, por exemplo, anunciou recentemente o lançamento da Liiv, sua primeira linha de produtos com apelo ecológico -- uma clara tentativa de roubar clientes cativos da Natura. Além disso, o varejo, um canal de vendas concorrente, passou a ganhar força. Em busca de produtos com melhores margens, supermercados, lojas de departamentos e farmácias estão dedicando espaços cada vez maiores de suas prateleiras a produtos de beleza. "A consolidação do varejo brasileiro como vemos hoje representa uma grande oportunidade para que marcas globais de cosméticos entrem no Brasil", escreve o analista do Credit Suisse. Os concorrentes pretendem aproveitar o que consideram um momento vulnerável da maior empresa de cosméticos brasileira -- cabe à Natura provar que estão enganados.


Fonte: Por Melina Costa, in portalexame.abril.com.br

Comentários

Anônimo disse…
Os investidores estão acostumados a obterem altos lucros, mas nossa realidade agora é outra, menos despesas e menos receita, isso gera impaciência no mercado.

Esperamos resultados imediatistas, o governo esta lucrando mais, não porque mais pessoas estão pagando seus impostos, mais sim pelo motivo de que as empresas estao vendendo mais, consequentemente pagadando mais impostos por deduções na lucratividade, isso sim é coisa de outro mundo.

Onde vamos parar com essa loucura absurda por DINHEIRO. Dinheiro é bom, mais as pessoas são mais importantes deste contesto, familias gritam apenas por trabalho, enquanto empresas gritam por subrevivencia, sobrevivencia que se anuncia apenas por DINHEIRO, muito DINHEIRO.

Acredito que esta na hora de revermos nosso conceito e mudar nosso modo de viver para um dia a dia mais modesto.

Fraternalmente :.

Regi - Criciúma/SC

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