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Marcas perdem autoridade

A segunda parte do Seminário “Branding: Construindo Marcas Fortes”, organizado no final de junho na sede da Associação Brasileira de Anunciantes (www.aba.com.br) em São Paulo/SP, centrou foco na perda de autoridades das marcas, a partir da tendência da comunicação colaborativa e do consumidor como produtor de conteúdos, da ausência de referências universais e da intensa experimentação, mudando o enfoque de importância dos pontos de contato para pontos de conexão com pessoas.

A diretora de Desenvolvimento de Negócios da Millward Brown do Brasil, socióloga Aurora Yasuda, pontua que, para a construção de marcas fortes, é preciso no mínimo o atendimento de quatro pilares: base sólida de negócio, oferta de grande experiência, clareza de posicionamento e de associações e liderança projetada. Com isto, pode-se pensar numa projeção e numa força consistentes. “O trabalho de comunicação diz qual é o propósito da marca. E comunicação é experiência”, analisa. Ainda que acreditando que “a mágica está no produto”, no sentido de que um excelente produto é suficiente sem muitos meios de comunicação oficiais, ela orienta que para conseguir clareza de posicionamento é preciso consistência entre ações e comunicação em todos os pontos de contato. A inovação é um componente importante no caminho da liderança ou de sua sensação, porque traz uma vantagem real ao produto.

Citando Jeremy Bullmore, diz que uma marca é a soma de conexões mentais que ocorrem na cabeça dos consumidores (memórias, imagens e experiências decorridas de contatos diretos, da propaganda, do boca-a-boca). Então, sua empresa formatou o Brand Dynamics com três medidas de lealdade. Basicamente, o trabalho de análise trata do conhecimento, da relevância, da performance, da vantagem e do “bonding”, um envolvimento sensorial imprescindível atualmente, além da entrega de desempenho real. Eles estruturam daí o Brand Signatures, que graficaliza as fortalezas e fraquezas do relacionamento do consumidor com a marca, e medem a força da marca com a ferramenta Voltage.

Neste caminho, é interessante detalhar dois conceitos: fidelidade é freqüência e lealdade é recomendação. Para atingi-los, convém saber que o cérebro trabalha em funções modulares – conhecimento (informação concreta, propriedades físicas), emoção (sentimentos despertados) e experiência (função, benefícios). As marcas mais fortes e de maior sucesso têm justamente representações mais equilibradas destes módulos. O magnetismo da marca fica na dependência de associações fortes positivas geradas e lembradas pelas pessoas, mas necessariamente conectadas com o produto em foco. Segundo a experiência da Millward Brown, inovação, experiência, clareza e liderança são as facetas integradas do valor da marca.

Se antes, a comunicação era sinônimo de televisão, agora o jogo muda com uma nova força dos canais de distribuição que se torna uma grande mídia, e há saturação dos canais de informação e publicidade, dificultando a atenção diante da alta pulverização, a convergência da comunicação via internet e novas tecnologias e o caráter multi-tarefa da nova geração. “A mão do poder e da direção da comunicação da marca mudou. Está com o consumidor, que também é produtor de conteúdo, retirando a influência da mídia pelo fenômeno da fragmentação da audiência”, explica. Dizendo que “a grande variável é a internet”, Aurora evidencia como é difícil acertar em branding, porque precisa contemplar os “tweens”, geração nascida no ambiente digital com 8 a 13 anos, dado que o universo de canais deles é gigante, em vários nichos e simultâneos. Como nossa área de trabalho mental somente permite fazer de três a quatro atividades ao mesmo tempo, uma exposição média comprovada no Brasil de 1000 mensagens por semana para um consumidor normal evidencia a confusão. Ela enfatiza que a quantidade de mensagens não pode ser alta porque torna sua absorção bastante limitada (pesquisas indicam que há 42% de lembrança para uma mensagem única, mas 16% para uma quarta mensagem repassada). O nível de investimento em comunicação tem-se mantido estável, mas o nivel de lembrança da comunicação publicitária tem caído desde 2003. “Não conseguimos ver tudo”, atesta.

O surgimento de uma perspectiva 360 graus, cobrindo todos os pontos de conexão com o consumidor, é a grande saída, porque significaria a integração de apelos e conteúdos nos canais de contato, ai incluindo endomarketing e SAC’s. Seria entender a eficiência de cada ação do ponto-de-vista da expectativa e da reação dos públicos-alvo. “Cada dia está mais difícil fazer isto. Infelizmente, gestão de marca está se assemelhando à gestão política, a cada período (curto) mudam as pessoas e não há trabalho de continuidade. Mas estamos falando de planejamento estratégico a longo prazo e do entendimento das necessidades de maneira mais holística”, conclui a socióloga.

MUDANÇA – A revolução digital, os processos colaborativos e os novos desafios da construção de marcas foram o tema da publicitária Ana Paula Cortat, vice-presidente de Planejamento da Leo Burnett Brasil. Este panorama foi instaurado sobremaneira a partir do ano 2000, com processos liderados por indivíduos e uma pulverização dos agentes, não mais predominantemente brancos e ocidentais, com uma interação forte das mídias. “O que é novo está acontecendo na cabeça das pessoas, não tanto nas tecnologias”, aponta.

O modelo colaborativo transforma a relação emissor-receptor, estimulando a conversação. Há uma evolução da mobilidade digital para a conectividade móvel, numa velocidade de renovação que supera os espaços de tempo e os ciclos tradicionais da vida dos produtos. Daí que ela orienta: “tirem o olhar das ferramentas, olhem para as pessoas”. A referência agora é o mundo, e o endeusamento das marcas não existe mais. A troca de idéias e a superação das barreiras culturais são um novo patamar. “A idéia é fazer com a comunicação as pessoas puxarem o fio e formarem suas teias de relacionamento. Não precisamos mais de histórias com início, meio e fim, porque elas vão ser compartilhadas e complementadas por todos”, explica.

A audiência digital brasileira em vários canais (internet, celulares, games) é hoje maior que a população de vários países, o que comprova esta migração e exige uma nova interlocução. Ana Paula destaca que é uma realidade que transforma as pessoas também no mundo off-line, porque elas tiveram modificada sua postura de interação e de intermediação. Entre as tendências identificadas por ela, estão o “Personal Control” – o controle pessoal é o fenômeno social da atualidade, sobre o que, como e quando consumir e se relacionar como decisões individuais e bastante pessoais, não mais regradas por terceiros. Os padrões de comparação estão interligados entre todos os segmentos de negócio, porque são experiências que passam a ser exigidas indistintamente, e por isto muda até o senso de concorrência. Outra tendência é o “Image Nation”, a conexão das pessoas através da linguagem do vídeo, com ampla difusão por espaços como o YouTube. Há uma série feita no Second Life que vai pro canal aberto da televisão norte-americana, mesma origem de documentários hoje comprados pela HBO. Um roteiro colaborativo de novela que existe na web está também sendo comprado pra exibição aberta.

A alfabetização linear está sendo derrubada pela aprendizagem por hiperlinks, e isto atesta a mudança de percepção da nova sociedade. E não é uma questão etária e sim de predisposição a compreender outros formatos. A publicitária afirma que é um caminho sem volta, em que o computador fica como extensão do cérebro e novas habilidades são desenvolvidas pelo estar em rede, com idéias articuladas de maneira muito rápida e processos de trabalho orgânicos e descomplicados. A reciclagem dos comunicadores deve iniciar por olhar para pessoas como seres humanos, não somente como consumidores, centrando atenção nos seus sonhos e não em sua relação com marcas ou categorias de produto. Depois, pensar no propósito de vida, não na essência, para criar uma razão de existir, com a empresa fazendo diferença, e daí chegar nas ações no lugar de propaganda, pelo simples fato de que idéias, gestos e experiências não podem ser desligados, folheados e esquecidos. O seminário ainda contou com Marcos Machado, sócio-diretor da Top Brands Consultoria e Gestão de Marcas, que falou sobre tendências do mercado e branding e posicionamento e arquitetura de marcas.


Por Rodrigo Cogo - Gerenciador do Portal Mundo das Relações Públicas

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