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Meio ambiente: o foco errado da mídia

O artigo “Mídia Oculta, Tragédia Ambiental”, de José Augusto Pádua, professor de História da UFRJ e autor de “Um Sopro de Destruição”, constata o foco errado da mídia e a distorção que ela mesma faz sobre seu papel na discussão de tema tão sério como o meio ambiente. Diz ele: “(...) a verdadeira crise ambiental não está nos acidentes, nos momentos excepcionais, mas sim na continuidade cotidiana e despercebida de padrões de produção e consumo ecologicamente insustentáveis”. A mídia se preocupa em cobrir de forma rápida e pontual as tragédias ocorridas aqui e ali no mundo. Nós mesmos presenciamos um fim de ano triste para estados como Santa Catarina, Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo. Saímos todos em socorro, prestando nossa solidariedade, coisa que, felizmente, nunca falta no Brasil. E a mídia, com a ajuda da internet, cobre isso com imagens cruas, fotos incríveis e atenção redobrada nos resultados dos excessos da natureza. A cobertura homem-a-homem desses fenômenos, no entanto, apesar de bem colocada, não é suficiente e nem mira no foco central da questão. E isso, pode, sim, ser um problema a mais.

“A tendência dos meios de comunicação é focalizar apenas esses momentos de forte energia emocional, quando ocorre um vazamento de petróleo, uma enchente, a apreensão de um grande estoque de madeira cortada ilegalmente na Amazônia, etc”, pontua o professor. Mas esse é o lado aparente da crise. O lado pior continua oculto na mídia e, portanto, ignorado pela população. O pior da crise “(...) fica dissimulado na gigantesca teia dos fluxos diários de matéria e energia que movimentam a economia global e pressionam os recursos renováveis e não-renováveis da Terra”, diz o autor, que lembra que o papel real da mídia não tem sido cumprido. O resultado disso é que a opinião pública, ou seja, todos e cada um de nós que deveríamos estar arregaçando as mangas para mudar a situação, “continua tendo uma visão distante e fragmentada da crise ambiental, como se ela passasse ao largo da vida social e econômica de todos os dias”.

O professor cita uma pesquisa de 2006 da Vox Populi, preocupante nesse sentido. Ela revela que apenas 19% dos brasileiros acham que as cidades fazem parte do que chamamos “meio ambiente”. As florestas e os rios, esses sim foram assimilados como parte do ambiente, sendo lembrados por mais de 75% dos entrevistados. As cidades sempre ficam esquecidas, à parte do ambiente a ser cuidado, e vem diminuindo sua presença na lembrança dos brasileiros. Uma pesquisa semelhante realizada em 1992 mostrava que 22% dos brasileiros incluíam as cidades como parte essencial do ambiente. “Essa percepção que divorcia o ambiental e o social, ao contrário do que se poderia imaginar, vem aumentando ao longo do tempo”, aponta o professor.

Apesar das imagens, fotos, textos brilhantes e cobertura contínua da imprensa e da “enorme expansão quantitativa da preocupação ambiental na opinião pública, a compreensão dos problemas continua vaga e superficial e as manchetes pouco têm contribuído para melhorar esse quadro”, conta José Pádua. Ele diz que enquanto a população continuar considerando o ambiente como alguma coisa que acontece “lá fora” e não “uma realidade material que se confunde com todos os movimentos do existir humano”, de nada adiantarão as manchetes brilhantes dos jornais denunciando as vinganças da natureza. Nada mudará enquanto os hábitos, costumes e cultura não mudarem. Nada mudará enquanto não fizermos parte do ambiente de fato.


Fonte: Por Yara Peres - sócia e vice-presidente do Grupo CDN, in www.blogdayara.com.br

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