Pular para o conteúdo principal

Os novos consumidores

O relatório Winning over the Next Billion Consumers in Brazil – A Guide for Growth, da consultoria de estratégia e gestão The Boston Consulting Group, aponta que 34 milhões de domicílios brasileiros estão próximos da viabilidade econômica e ávidos por consumir. Porém, enquanto grande parte dos varejistas e fabricantes de bens de consumo concentra seus esforços de marketing no topo da pirâmide do mercado brasileiro, esses consumidores ainda não foram descobertos. Alvos em potencial, não se colocam voluntariamente à margem do mercado, mas encontram-se fora dele em função da ausência de modelos de negócios apropriados para servi-los.

Os next billion consumers, como foram batizados pelo BCG, são um grupo distinto de consumidores de baixa renda que pode ser encontrado no Brasil, África, China, Índia e na Europa Central e Oriental. Se fossem uma nação, seriam o décimo PIB do mundo. Situados abaixo do radar da maioria dos modelos de negócios, os next billions respondem por um terço da renda do País, ao mesmo tempo em que são responsáveis por quase metade dos seus gastos totais – mais de US$ 100 bilhões por ano. É uma boa oportunidade: os next billions brasileiros são jovens e possuem cerca de 40 anos de consumo pela frente.

Apesar de estarem ansiosos por consumir produtos e serviços, não chamam a atenção de empresas, que enxergam o mundo de acordo com modelos de negócios convencionais. Segundo o The Boston Consulting Group, o mercado possui um grande e rentável filão, mas, para conquistá-lo, as empresas devem entender as necessidades dos next billions e desenvolver novos e criativos modelos de negócios para servi-los.

Quem são?

Os next billions representam a faixa da população que está entre o topo da classe E (domicílios com renda mensal abaixo de um salário mínimo), a classe D (um a dois mínimos) e a base da classe C (dois a cinco mínimos). Ou seja, possuem rendas mensais entre US$ 100 e US$ 700.

Esse número de consumidores cresce a um ritmo maior que a população total do Brasil. Quase metade está situada longe de favelas, em lugares onde suas famílias estão expostas às influências de marcas e produtos. Quase dois terços dos next billions são casados e seus núcleos possuem quatro membros em média, dos quais pelo menos dois contribuem com a renda familiar.

O BCG identificou os quatro aspectos principais pelos quais os next billions se diferem de outros segmentos:

Convivem com flutuação de renda – O baixo rendimento não é o maior limite para os gastos dos next billions. Mais da metade desses domicílios poupam parte de suas rendas e quase todos abrem mão de certos gastos para comprar as coisas que desejam. Uma família gasta 39% de sua renda com alimentação, 23% com moradia, 6% com transporte e 4% com produtos de cuidados pessoais. Isso deixa 28% para gastos eventuais, o que normalmente representa 10% para serviços financeiros, 5% para telecomunicações e 13% para despesas supérfluas.

Mais de 80% dos next bIllions brasileiros recebem salário em dinheiro vivo. A grande maioria junta sua renda com a de outros membros da família, e as decisões sobre importantes aquisições são feitas em grupo. Seis em cada dez não possuem emprego formal, e a renda pode variar significativamente de um mês para outro. Por isso, freqüentemente optam por produtos mais baratos ou adquirem crédito, o ponto central na movimentação econômica dos next billions.

Praticamente todos os gastos com serviços financeiros (US$ 14 bilhões por ano) estão relacionados aos pagamentos de crédito. Aproximadamente metade das aquisições de crédito tem como finalidade vestuário e eletrodomésticos. Se esses consumidores tiverem alguma dificuldade em consegui-lo, 40% contam com a ajuda de um membro da família ou um amigo.

Por causa da flutuação nos rendimentos mensais, os next billions são avessos a
grandes entradas. Para não comprometer os rendimentos, preferem financiar produtos caros com parcelas pequenas durante um longo período. Os resultados da pesquisa do BCG indicam que, quanto mais caro for o produto, mais a decisão de compra vai depender das condições de financiamento.

Começam a ascender socialmente – Apesar dos obstáculos, os next billions brasileiros são determinados a melhorar suas vidas e tomar as rédeas do próprio futuro. Mais de 40% dos entrevistados disseram que vão ampliar a poupança no próximo ano, e mais de 25% pretendem gastar mais. As mulheres são fundamentais para alcançar esses objetivos. Quase metade delas incrementa a renda familiar trabalhando fora de casa. Essas mulheres também têm grandes ambições com relação aos filhos, que, por conseqüência, recebem melhor educação escolar que os pais. Apesar de 72% dos next billions não possuírem o ensino médio completo, reconhecem a importância da educação.

Quase todos os next billions brasileiros possuem um aparelho de televisão, o que propicia o aumento da consciência sobre produtos e marcas. A maioria possui fogão, muitos têm geladeira e DVD player, e grande parte poupa para comprar uma máquina de lavar roupa. Muitos planejam comprar um computador, o bem mais desejado depois da casa própria e do carro. Estão dispostos a mudar de padrão de vida, especialmente em relação aos bens duráveis de alto valor, porque querem ter certeza de que estão adquirindo um produto de qualidade.

Os next billions levam em consideração até os centavos. Mas isso não significa que sempre optam pelo preço mais em conta. Em vez disso, podem gastar meses pesquisando, para analisar minuciosamente os benefícios funcionais, técnicos e emocionais de um produto. Procuram o melhor possível dentro do que seus orçamentos permitem e não se contentam com versões simplificadas, se isso acarretar queda de qualidade. Justamente por não poderem correr o rico de um erro, os next billions optam por marcas confiáveis e de durabilidade comprovada. Também preferem produtos que ofereçam políticas de garantia e contratos de serviços nos quais realmente possam confiar. A falta de garantia é a grande razão para não adquirir produtos usados, mesmo que estejam sendo oferecidos por um preço bem menor.

Procuram orientação ao adquirir um produto – A propaganda pode ajudar a ampliar a consciência sobre um produto, mas raramente trata de todas as barreiras de compra. De fato, os next billions não consideram a aquisição de um produto não familiar se a campanha não explicar seus benefícios de maneira clara. Os brasileiros procuram a opinião e o aconselhamento de amigos ou familiares em 20% das decisões de compra. E, quanto mais caro o produto, mais os consumidores se preocupam em confirmar sua qualidade.

Os varejistas também podem ser grandes influenciadores nas decisões de compra. Quase 60% disseram que um vendedor já os ajudou a concluir um negócio. Os next billions precisam compreender também as instruções de uso de um produto. Embora vários fabricantes de eletrônicos optem por manuais de instruções cada vez mais finos e sucintos, o mercado para os next billions precisa considerar a elaboração de documentos detalhados e ilustrados.

Preferem o que é familiar – Os next billions confiam nas marcas que conhecem bem. Dos consumidores entrevistados, 16% preferem os hipermercados: evitam o formato self-service, por considerá-lo intimidador. Quando rendas inconstantes fazem necessária a opção por produtos mais baratos, não vale a pena deslocar-se até um supermercado distante, mesmo que o preço seja menor, e especialmente se a loja não passar uma sensação acolhedora.

Outra vantagem da compra em lojas de bairro é que a vizinhança conhece de perto seus consumidores, e o comércio sempre oferece crédito em caso de necessidade. Essas lojas também oferecem comestíveis e outros itens em embalagens menores.


Como conquistá-los?

Como o mercado para a classe alta nos países em desenvolvimento chegou à saturação, conquistar os next billions tornou-se um imperativo estratégico para as empresas locais e globais. O rápido crescimento desse segmento e o seu desejo de comprar oferecem uma grande oportunidade para todas as empresas de bens de consumo. Segundo o BCG, obter sucesso nesse mercado requer algumas iniciativas:

Desenvolver produtos que os next billions querem e podem consumir – Em vez de empobrecer marcas globais, as empresas devem adaptar seus produtos e preços às necessidades desse perfil de consumidor.
- Estabelecer o preço de acordo com o orçamento dos next billions. Ofertas específicas de crédito são necessárias para alavancar as vendas.
- Tornar os produtos mais acessíveis por meio de embalagens menores e mais baratas.
- Desenvolver produtos que toda a família possa usar, já que todos contribuem com o orçamento doméstico.
- Enfatizar a qualidade. Como não se dão ao luxo de se arrepender de uma compra, se dispõem a pagar mais por um produto de qualidade assegurada.


Estabelecer novas redes de distribuição – Ao pulverizar a distribuição, muitas empresas se debatem com os limites de custo, cobertura e controle.
- Ampliar o alcance do produto, alavancando canais bem estabelecidos e de baixo custo. Moradores de pequenas cidades, por exemplo, podem funcionar como canais de distribuição.
- Reduzir o volume necessário para alcançar o break-even point (ponto de equilíbrio). Empresas de segmentos diferentes se aliam para aperfeiçoar a distribuição.
- Buscar soluções criativas para sobrepujar obstáculos de infra-estrutura, como os bancos brasileiros, por exemplo, que utilizam casas lotéricas e agências dos Correios para oferecer produtos financeiros.
- Tornar novos produtos disponíveis em locais que os next billions já compram, para obter renda adicional.
- Trabalhar com os varejistas locais, que não só têm clientela fiel, como também estão acostumados a vender baixos volumes a baixos preços.
- Desenvolver uma rede de pequenas lojas locais, para garantir o abastecimento, bem como ambiente e atendimento adequados aos next billions.


Desenvolver estratégias específicas de marketing
- Informar o consumidor sobre os benefícios do produto e suas formas de utilização.
- Encorajar o boca-a-boca.
- Desenvolver a identidade e a confiança nas ações de branding (identificação da marca). Os consumidores são mais propensos a aceitar um novo produto se ele for de uma marca conhecida.
- Conquistar novos clientes por meio de experimentação gratuita e manuais claros. Essa abordagem é especialmente recomendada para produtos complexos, como computadores e televisores, ou que tragam alguma percepção de risco.
- Fomentar o relacionamento com os consumidores. Os next billions são mais propensos a confiar em um amigo ou familiar do que em um vendedor que não conhecem.


Reavaliar a organização – Como num primeiro momento as multinacionais se concentraram no mercado afluente, muitas têm estrutura, cultura e padrões que provavelmente estão fora de compasso com os next billions.

- Montar equipes para o desenvolvimento de produtos, canais e estratégias de marketing evita que novas iniciativas sejam desencorajadas pela estrutura atual.

- Compartilhar conhecimentos com outras empresas já voltadas para o mercado de baixa renda pode acelerar o processo de inovação.

- Estabelecer padrões (benchmarking) para obter e mensurar os resultados.

- Manter os custos baixos, compartilhar serviços e terceirizar atividades que não sejam fundamentais para os negócios.


Formar parcerias e alianças para obter vantagens competitivas
- Explorar os ativos de terceiros. Trabalhar com empresas de outros setores, para criar pacotes, ofertas de serviços e produtos inovadores.
- Aliar-se a outras empresas, para ampliar o alcance e obter ganhos de escala em logística, marketing e vendas.
- Explorar características complementares.
- Estabelecer diretrizes, estruturas e mecanismos transparentes para solucionar problemas entre parceiros comerciais.


Fonte: www.consumidormoderno.com.br

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

H2OH! - um produto desacreditado que virou sucesso

O executivo carioca Carlos Ricardo, diretor de marketing da divisão Elma Chips da Pepsico, a gigante americana do setor de alimentos e bebidas, é hoje visto como uma estrela em ascensão no mundo do marketing. Ele é o principal responsável pela criação e pelo lançamento de um produto que movimentou, de forma surpreendente, o mercado de bebidas em 11 países. A princípio, pouca gente fora da Pepsi e da Ambev, empresas responsáveis por sua produção, colocava fé na H2OH!, bebida que fica a meio caminho entre a água com sabor e o refrigerante diet. Mas em apenas um ano a H2OH! conquistou 25% do mercado brasileiro de bebidas sem açúcar, deixando para trás marcas tradicionais, como Coca-Cola Light e Guaraná Antarctica Diet. Além dos números de vendas, a H2OH! praticamente deu origem a uma nova categoria de produto, na qual tem concorrentes como a Aquarius Fresh, da Coca-Cola, e que já é maior do que segmentos consagrados, como os de leites com sabores, bebidas à base de soja, chás gelados e su

Doze passos para deixar de ser o “bode expiatório” na sua empresa

Você já viu alguma vez um colega de trabalho ser culpado, exposto ou demitido por erros que não foi ele que cometeu, e sim seu chefe ou outro colega? Quais foram os efeitos neste indivíduo e nos seus colegas? Como isso foi absorvido por eles? No meu trabalho como coach, tenho encontrado mais e mais casos de “bodes expiatórios corporativos”, que a Scapegoat Society, uma ONG britânica cujo objetivo é aumentar a consciência sobre esta questão no ambiente de trabalho, define como uma rotina social hostil ou calúnia psicológica, através da qual as pessoas passam a culpa ou responsabilidade adiante, para um alvo ou grupo. Os efeitos são extremamente danosos, com conseqüências de longo-prazo para a vítima. Recentemente, dei orientação executiva a um gerente sênior que nunca mais se recuperou por ter sido um dia bode expiatório. John, 39 anos, trabalhou para uma empresa quando tinha algo em torno de 20 anos de idade e tudo ia bem até que ele foi usado como bode expiatório por um novo chefe. De

Conselho Federal de Marketing?

A falta de regulamentação da profissão de marketing está gerando um verdadeiro furdunço na Bahia. O consultor de marketing André Saback diz estar sendo perseguido por membros do Conselho Regional de Administração da Bahia (CRA/BA) por liderar uma associação – com nome de Conselho Federal de Marketing e que ainda não está registrada – cujo objetivo, segundo ele, é regulamentar a profissão. O CRA responde dizendo que Saback está praticando estelionato e que as medidas tomadas visam a defender os profissionais de administração. Enquanto André Saback, formado em marketing pela FIB - Centro Universitário da Bahia -, diz militar pela regulamentação da profissão, o Presidente do CRA/BA, Roberto Ibrahim Uehbe, afirma que o profissional criou uma associação clandestina, está emitindo carteirinhas, cobrando taxas e que foi cobrado pelo Conselho Federal de Administração por medidas que passam até por processar Saback, que diz ter recebido dois telefonemas anônimos na última semana em tom de ameaç