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Muito prazer! Meu nome é Anônimo!

Tenho observado uma característica interessante no comportamento dos e-consumidores que se estabeleceu no formato da comunicação digital: a múltipla ou a inexistente identificação. O cidadão acostumado a apresentar carteiras de identidade e de motorista, CPF e outros números que lhe atestam a existência material sobre a Terra, hoje, passa por uma interessante experiência. Pode, sem esforço algum, ser mais do que um. Pode ter milhares de e-mails com denominações diferentes e que ‘morrem’ a cada cadastramento em um concurso cultural, por exemplo. Pode ser Antonio quando é Maria, revelando que, afinal, no ciberespaço, o preconceito sexual nem passa pela reflexão na hora de se exibir uma persona que não comprometa sua materialidade na vida ‘normal’. Esse mesmo sujeito pode também ter um pseudônimo com vida própria. É só analisar quantos blogueiros fazem sucesso sem mostrar lenço, documento e, claro, a identidade. E o que é mais impressionante: podem arrastar atrás de si um sem-número de seguidores! A idéia ganha mais credibilidade do que o autor. O que cria riscos e oportunidades. Você pode estar seguindo um crápula ou um gênio.

O que isso traz de novo conhecimento para a gente? Que as pessoas sempre tiveram uma necessidade grande de explorar sua multiplicidade de personas e agora o fazem de maneira exponencial pela velocidade e pelo sepultamento da fronteira física com a web? Que o anonimato na internet é um lugar confortável, onde os filtros do superego simplesmente somem e o sujeito vira pedófilo quase sem nenhum problema? Que pode transitar sem ser julgado? Analisado? Condenado?

Não tenho respostas. Tenho algumas reflexões. Essa é a velha história de pérolas e porcos. O exercício da identidade pode ser – e acho, inclusive, que deve – lúdico. A história da nossa dualidade, ying e yang, masculino/feminino não é de hoje.... Vem da antigüidade. Nasceu da própria necessidade do homem pensar sobre si e se confrontar com suas angústias e seus achados existenciais. Se você o faz para ser pérola ou porco é uma questão pessoal. E a web será só mais um lugar – com essa exponencialidade que já comentei – para dar vazão a seu comportamento. Ainda que apenas você o saiba. E você saber o que faz com sua identidade e conseqüentes atos que você ‘assina’ é uma questão que, antes de tudo, dorme com você. Logo, você é o beneficiado ou o prejudicado. Vire-se ;-). Você e o travesseiro.

Essa reflexão me ocorreu porque vemos, nos databases de clientes, enorme volume de dados perecíveis. E-mails criados como fantasmas para participar de algo e que logo perecem como os andróides de Ridley Scott. E isso me leva a pensar que, na verdade, o mais importante é saber que nunca estaremos analisando apenas indivíduos, numericamente falando, e sim muito mais, facetas coletivas de comportamento. Isso pode ser um grande achado para enxergar tendências. E o fato mais claro disso é o que revela que os tantos que somos exigem que nossas marcas prediletas nos entendam dessa forma, porque é assim que queremos ser tratados por elas.

E aí entra o delicado da situação: as marcas terem versatilidade – ou a famosa resiliência tão em moda – para ‘apreender’ esse novo comportamento, uma quase nova cultura, que é a cultura da personalidade múltipla, instantânea e perecível. É o comportamento digital com sua genética própria, fragmentada e plural. Escorregadia e complexa! Mais do que isso, um jeito de ser que extrai inspiração da própria estrutura conceitual da web – fragmento, link, simultaneidade, frugalidade etc. Casamento perfeito. Em cada site, posso ser alguém diferente. Em cada novo blog ou perfil de Orkut que abro, mudo. Cada concurso que participo, sou muito e sou outro.

E, por outro lado, se quero ser alguém com perfil diferente, isso exige que, por onde eu passe, encontre alguém que me entenda também dessa forma. As marcas estão prontas para ser esse novo útero?

Isso é complexo. Volto ao assunto outra hora.


Fonte: Por Risoletta Miranda - sócia e diretora da Addcomm, in IDG Now.

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