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A empresa do futuro na opinião dos principais CEOs do mundo

Nesta terça-feira, 6 de maio, a IBM divulgou o CEO Study. Essa pesquisa é realizada a cada dois anos com mais de mil CEOs em todo o mundo e é considerada o mais importante estudo conduzido por esta empresa de consultoria. Transcrevo aqui a íntegra da entrevista realizada pela HSM On-line com o respeitado diretor da IBM do Brasil, Ricardo Gómez, que conta as principais conclusões tiradas dessa iniciativa.


O tema da pesquisa com CEOs é “O desafio do futuro”. O que levou a IBM a escolher esse tema e qual o seu escopo?
O objetivo da IBM, ao realizar estudos dessa magnitude, é divulgar o pensamento das empresas, aperfeiçoar a maneira como elas trabalham e aumentar o nível de satisfação no uso de produtos e serviços, entre outros. Acreditamos que esse estudo é um instrumento que contribui para aperfeiçoar a forma como a população em geral utiliza, consome e aproveita os produtos e serviços. O que nos levou a escolher esse tema foi, primeiramente, o cenário da economia mundial, fundamentado em três aspectos: a existência de clientes novos, que são cada dia mais exigentes e que afetam a maneira como as empresas trabalham. Outro motivo foi a integração global, muito mais intensa e presente no nosso dia-a-dia em relação ao que era há dois anos. O terceiro aspecto considerado foi a inovação no modelo de negócio, pois, no passado, ela era focada em produtos e serviços e agora foca a forma como a empresa é organizada. O estudo foi conduzido para desafiar os CEOs a se posicionarem sobre esses três itens.

Quais foram os principais findings desse estudo?
A primeira conclusão desse estudo é que a percepção dos CEOs em relação à necessidade de mudança aumentou muito. Há dois anos, 65% dos CEOs esperavam uma mudança significativa nos anos seguintes. Esse número saltou para 85%.

O segundo finding conclusão do estudo foi o aumento da distância existente entre as mudanças que são percebidas e a capacidade que os CEOs possuem para enfrentá-las com sucesso. Há, portanto, hoje, uma preocupação maior dos CEOs (evolução de 8% para 22%) com as mudanças. Eles percebem que elas estão ocorrendo de modo mais intenso e que eles não conseguem obter sucesso na mesma proporção em que elas ocorrem.

Que agentes, internos ou externos, agiram para que esse índice quase triplicasse?
Fundamentalmente, isso foi devido à maior integração global, ao maior número de players atuando em uma quantidade bem maior de países, aos consumidores cada vez mais exigentes e ao impacto da tecnologia nos modelos de negócios – a internet é um bom exemplo disso: a competição virtual não existia no passado. Assim, houve um aumento da distância mudança-enfrentamento, mas não em função de um pessimismo gerado pela necessidade de mudanças e sim pela perspectiva de mudanças muito mais intensas.

A percepção dessa lacuna varia, entre os CEOs, de região para região?
Os CEOs latino-americanos não têm uma percepção tão elevada da lacuna. Na América Latina, o índice dessa percepção atinge apenas 5%.

E qual seria o motivo disso?
Existem algumas hipóteses, mas acreditamos que eles são um pouco menos atingidos pelo cenário de mudanças e se sentem melhor preparados para enfrentá-las. Mas, na realidade, nossa interpretação sobre esse número é que o mercado latino-americano ainda não sofreu um ataque de caráter competitivo tão forte como aqueles que ocorrem nos mercados norte-americanos, nos europeus e nos asiáticos emergentes. É raro acontecer de empresas norte-americanas não possuírem uma estratégia para atuar em mercados como China e Índia, mas muitas não têm uma estratégia para atuar no Brasil. Então, é natural que, na Ásia, a competição seja muito mais acirrada.

Alguma outra conclusão importante?
Sim, aquela que diz respeito às mudanças dos consumidores e clientes. Primeiramente, existe uma mudança associada ao volume de consumidores, que aumentou muito. As classes C e D nos países emergentes estão consumindo muito mais, inclusive no Brasil. Em segundo lugar, a sofisticação dos consumidores também aumentou muito. O acesso à internet permite uma comparação melhor de produtos concorrentes. No passado, a empresa tinha muito mais controle sobre a opinião do consumidor e o influenciava mais facilmente através de iniciativas de marketing e propaganda. Hoje, o consumidor consegue a informação de uma maneira muito mais organizada e ágil e, portanto, está mais bem preparado para tomar sua decisão de compra. 53% dos consumidores do varejo dizem que pesquisam os produtos na internet antes de fazer a compra. O que é mais interessante é que 25% desse contingente fazem isso de dentro da própria loja em que ele se encontra, utilizando a telecomunicação móvel. No entanto, um dado importante é que os CEOs das empresas médias e grandes que participaram do estudo vêem isso como um aspecto positivo, ou seja, eles preferem que o consumidor esteja mais bem preparado, pois isso torna mais fácil demonstrar, com maior eficácia, o valor de seu produto. Dessa maneira, essas empresas conseguem sair do mundo das commodities. Os consumidores, mais bem informados, percebem que produtos, eventualmente mais caros, oferecem atributos agregados, como o pós-venda, muito melhores.

Que tipo de ações eles, CEOs, pretendem tomar para atrair esses consumidores mais sofisticados?
No estudo anterior, 16,7% deles disseram que aumentariam o investimento para atrair esse cliente mais sofisticado e, agora, esse índice pulou para 20,4%. Houve um crescimento de 22% nos investimentos para capturar e influenciar consumidores mais bem informados.

E quanto à integração global, que você já mencionou?
A integração global passa a não ser mais apenas um conceito, mas torna-se presente verdadeiramente em todas as regiões do mundo. Não somente os mercados maduros atacam os mercados emergentes, mas o oposto também. A questão é que, quando uma empresa que possui um bom produto comercializado localmente torna-se exportadora, ela passa a precisar de competências logísticas, tributárias e de outras naturezas, que, até então, não precisava ter. Ela passa, também, a investir no conhecimento sobre os consumidores dos novos mercados onde deseja atuar. Percebemos que é através das parcerias que elas maximizam a obtenção dessas competências. Por exemplo, em vez de investir na área de apoio à operação, pode ser mais interessante fechar uma parceria com uma empresa de logística. Em vez de desenvolver uma competência de exportação, desenvolver uma parceria com uma trading presente no mercado a ser penetrado, para ela ser seu ponto de apoio nesse local. A parceria passa a ser um instrumento para que os mercados integrados globalmente sejam alcançados.

Quais empresas estão lidando com essa integração global?
O estudo apontou que existem quatro tipos diferentes delas: há empresas extensivamente globalizadas, com estratégia global de mercado, de produto, de tecnologia, de modelo organizacional. Há também empresas cujo modelo de negócio é globalizado, mas ainda necessitam e usufruem das competências locais. Essas empresas lançam produtos locais, a política de RH é local, a política de TI também é, os modelos organizacionais são diferentes de país para país, ou seja, são empresas multinacionais não integradas globalmente. Existe o modelo misto de empresa, que possui algumas estratégias globais, porém conta com uma operação local muito forte e, com isso, as filiais têm mais independência em relação à matriz. Finalmente, existe a empresa essencialmente local, mesmo sendo uma multinacional. Esses quatro modelos coexistem em quantidades similares. A tendência das empresas, no entanto, é migrar para o modelo globalizado. A empresa de sucesso no futuro é aquela que enxerga a integração global como um valor a ser perseguido e encontra o ponto ótimo entre a estratégia mundial e a implementação local.

Que abordagens elas precisam adotar para identificar esse ponto ótimo?
Como já foi dito, investir no conhecimento do consumidor, pois, assim, elas irão identificar até que ponto um determinado produto deve ser exatamente igual em todos os países e até que ponto pequenas modificações podem fazer a diferença.
Esse aspecto liga-se a outra conclusão: os CEOs entendem que as empresas precisam se reinventar constantemente e estar abertas para entender que os modelos que as levaram ao sucesso não necessariamente perpetuarão esse status no futuro. A empresa precisa ser desbravadora e ter a ousadia de redesenhar e redefinir os processos, porque o mercado é mutante e é preciso antecipar-se a esse movimento.

Existem ferramentas que auxiliam as empresas a fazer isso?
Sim, existem. A IBM possui uma ferramenta chamada CBM (Component-based Modeling). Fazendo uso dela, a empresa é vista não de maneira única, mas em componentes: processos financeiros, logísticos, manufatura, marketing, RH, etc. e, a partir daí, adota-se uma estratégia e um modelo de negócio para cada componente. Para uma empresa de bens de consumo, raramente o diferencial será o gerenciamento da manutenção, e sim, provavelmente, o gerenciamento da marca. Essa ferramenta ajuda a empresa a se mapear e a desenvolver uma estratégia para cada componente do seu negócio.

E quanto à questão da responsabilidade social, tão discutida nos dias de hoje no mundo dos negócios? Alguma conclusãointeressante nessa área?
Sim, os CEOs percebem que suas empresas precisam ser genuínas e não generosas. Isso significa dizer que não há espaço para oportunismos. A empresa deve se preocupar com a maneira como os empregados trabalham, se os fornecedores utilizam mão-de-obra infantil, se o produto que elas produzem não agridem a natureza, etc. Em outras palavras, as empresas, no entender dos CEOs precisam ter uma atuação social mais ampla, o que difere muito de dar uma ajuda financeira a uma ONG.

O termo é importante: é preciso que elas sejam genuínas e não apenas parecer ser preocupadas com a questão ambiental. A maneira como elas atuam no mercado passa a ser percebido como valor pelos consumidores. Claro que isso demanda investimentos, mas, no futuro, elas sairão beneficiadas.

Que empresas estariam mais aptas para gerenciar tantas mudanças? Que características elas têm em comum?
Aquelas que demonstram ter maior interesses pelos pontos identificados pelo CEO Study. Observa-se uma aderência muito grande das empresas cuja performance é destacada aos aspectos que o estudo salientou. O próprio estudo aponta as empresas de melhor performance e as de performance inferior, e nota-se claramente uma aderência das primeiras no que se refere aos investimentos no conhecimento do consumidor, nas parcerias, na questão ambiental etc.

Basta saber o que o cliente quer para ser uma empresa bem-sucedida?
Não. Hoje, se você perguntar ao cliente cada vez mais exigente o que ele quer, obterá como resposta o seguinte: “não sei, surpreenda-me”. O interessante é que aquilo que o surpreende no primeiro momento passa a ser básico dali em diante, passa a ser o patamar mínimo e é isso que ele passa a exigir também dos concorrentes da sua empresa.

A tecnologia está disponível em boa quantidade para dar apoio à implantação dessas mudanças. Em contrapartida, o talento humano, é sabido, encontra-se cada vez mais escasso. Como os CEOs encaram essa situação?
Esse é um dos pontos de maior preocupação dos CEOs. Na visão deles, a falta de habilidade para encontrar talentos representa um inibidor para o crescimento global das empresas. Fatores externos e concorrência atuam igualmente para todos. O fator diferenciador da empresa é a gestão de talentos.

Existe algo a mais que você gostaria de comentar sobre esse estudo?
Sim. O que nós chamamos de “agenda do CEO” está mais completa do que já esteve no passado. Em 2006, havia uma concentração, no grau de importância, nos fatores de mercado, habilidades profissionais e fatores tecnológicos. Hoje, tudo é importante e o CEO se depara com um desafio muito grande em liderar uma organização. Sua responsabilidade tornou-se muito maior.

Para finalizar, qual seria, na sua opinião, o principal atributo do CEO do futuro?
Existem alguns. Eu diria que sua atenção ao consumidor poderia ser um deles.


Fonte: www.hsm.com.br

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