"QI dos alunos de medicina é baixo", disse o coordenador do curso de Medicina da Universidade Federal da Bahia, professor Antonio Natalino Manta Dantas. E, para fundamentar sua tese, foi mais adiante: "O baiano só toca berimbau porque tem uma corda só. Se tivesse mais cordas, não conseguiria". A entrevista foi publicada na Folha de São Paulo às vésperas do Dia do Trabalho e, logo, ganhou a Internet e virou notícia por toda a parte.
Se tivesse feito um mídia training, o professor Dantas não teria cometido tal deslize. Certamente, falou num momento de desabafo. Diante da raquítica nota, apenas 2, da Faculdade de Medicina da Bahia, das mais tradicionais do pais, no Exame Nacional de Desempenho de Estudantes. Falou como se estivesse conversando com um dos seus pares. Sim, é muito comum os professores hoje criticarem acidamente os alunos nos dias atuais. Como é muito comum chamá-los de despreparados, sem interesse, incompetentes, mesmo.
O problema, porém, não é só do estudante. É do ensino. A pergunta crítica é a seguinte: por que os alunos são geralmente tão pouco preparados? O drama começa no ensino primário, se agrava no 2º. Grau e, quando o aluno chega à universidade, a realidade se impõe. O professor Dantas foi imediatamente crucificado. É assim que acontece. Se tivesse aprendido a dar entrevistas, teria se poupado dessa mancha na sua carreira que irá acompanhá-lo como uma sombra daqui para frente.
Se - mas a história não se faz com se - pudesse aquilatar a repercussão da sua entrevista em tom de desabafo teria defendido a sua tese com elegância. Claro, não teria repercussão alguma ou muito pouco. Pois é do conhecimento público o que acontece hoje no Brasil. O estudante aprende desde os primeiros dias na escola que precisa ser prático, que a teoria não tem utilidade, não é incentivado a se apaixonar pelo saber. Mas a ser pragmático. Que não precisa pensar na história, nem nas idéias. Mas no resultado das idéias. Esse problema é real. Entre o saber e a prática, a prática vem sempre em primeiro lugar. Tudo tem que ter um objetivo, um plano, um "resultado" imediato. O resultado é que não se aprende a fazer, nem se aprende a estudar. Fica-se prisioneiro da caverna de Platão que a metáfora da ignorância, do "conhecimento" de aparência, distante da luz e da contemplação - o pensar, quero dizer - do sol.
E quem são os culpados? Se o QI (quoeficiente de inteligência) dos alunos é ruim os professores também são responsáveis. Onde está o rigor acadêmico? Onde está o rigor no processo de seleção? Onde está a qualidade dos currículos?
O professor Dantas defende-se afirmando que a faculdade não é responsável pelo péssimo desempenho dos alunos. É responsável ,sim. Professores e alunos formam um corpo só. Não é o fato de uma faculdade dispor de grande número de professores mestre e doutores que determina a qualidade do ensino. Nem notas baixas determinam a inferioridade de ninguém ou de uma faculdade como a de Medicina da Bahia. O problema é a visão crítica da realidade e a determinação para superar os passos dos tempos em que vivemos. Tempos em que o conhecimento é glorificado, mas na prática é anulado por um modelo de ensino massificado e mercantilista. Orientado para o lucro, sobretudo.
Vivemos na atualidade aquilo que Marcuse denominou de "sociedade unidimensional", uma sociedade de pensamento linear, não dialético, onde tudo é imediatamente transformado em mercadoria e, com isso, há o eclipse do pensamento critico. Todos esses aspectos afloram no desempenho dos estudantes de Medicina da Universidade Federal da Bahia e nas declarações do Professor Dantas. Não se trata de crucificá-lo. Agir assim seria cometer o lamentável erro - que sempre se repete - de confundir aparência com essência. O que o professor disse é uma opinião, uma aparência superficial da realidade, fruto de um desabafo que, como todo desabafo, diz respeito à um conhecimento raso. A essência é de outra natureza. Diz respeito aos dados concretos da realidade. Esse, sim, o aspecto relevante.
Não é prudente transformar as declarações do professor num espetáculo. Seria apenas um espetáculo a mais. Ela deve, sim, servir de ponto de partida para se indagar quem são os nossos estudantes universitários, mas também quem são os nossos doutores e mestres. Nesse momento em que estaremos evoluindo. Porque é a critica que modela o diálogo, impulsiona a mudança qualitativa. Fora de uma perspectiva ampla não há mídia training que resolva. Seria pura purpurina. Pura demagogia.
Em tempo: sou baiano e cresci ouvindo dizer que "baiano burro nasce morto". Pelo visto, o velho ditado, como a antiga relevância da Faculdade de Medicina da Universidade Federal da Bahia, de tantas histórias e serviços ao país, fazem parte do passado. Mais uma única pergunta: seria somente a faculdade de Medicina da Bahia onde o ensino exibe tão pouca qualidade? Onde os professores vêem os alunos com tamanho desprezo? Em tempo: a faculdade de medicina da Bahia comemorou recentemente 200 anos. Foi a primeira do Brasil.
Fonte: Por Francisco Viana, in terramagazine.terra.com.br
Se tivesse feito um mídia training, o professor Dantas não teria cometido tal deslize. Certamente, falou num momento de desabafo. Diante da raquítica nota, apenas 2, da Faculdade de Medicina da Bahia, das mais tradicionais do pais, no Exame Nacional de Desempenho de Estudantes. Falou como se estivesse conversando com um dos seus pares. Sim, é muito comum os professores hoje criticarem acidamente os alunos nos dias atuais. Como é muito comum chamá-los de despreparados, sem interesse, incompetentes, mesmo.
O problema, porém, não é só do estudante. É do ensino. A pergunta crítica é a seguinte: por que os alunos são geralmente tão pouco preparados? O drama começa no ensino primário, se agrava no 2º. Grau e, quando o aluno chega à universidade, a realidade se impõe. O professor Dantas foi imediatamente crucificado. É assim que acontece. Se tivesse aprendido a dar entrevistas, teria se poupado dessa mancha na sua carreira que irá acompanhá-lo como uma sombra daqui para frente.
Se - mas a história não se faz com se - pudesse aquilatar a repercussão da sua entrevista em tom de desabafo teria defendido a sua tese com elegância. Claro, não teria repercussão alguma ou muito pouco. Pois é do conhecimento público o que acontece hoje no Brasil. O estudante aprende desde os primeiros dias na escola que precisa ser prático, que a teoria não tem utilidade, não é incentivado a se apaixonar pelo saber. Mas a ser pragmático. Que não precisa pensar na história, nem nas idéias. Mas no resultado das idéias. Esse problema é real. Entre o saber e a prática, a prática vem sempre em primeiro lugar. Tudo tem que ter um objetivo, um plano, um "resultado" imediato. O resultado é que não se aprende a fazer, nem se aprende a estudar. Fica-se prisioneiro da caverna de Platão que a metáfora da ignorância, do "conhecimento" de aparência, distante da luz e da contemplação - o pensar, quero dizer - do sol.
E quem são os culpados? Se o QI (quoeficiente de inteligência) dos alunos é ruim os professores também são responsáveis. Onde está o rigor acadêmico? Onde está o rigor no processo de seleção? Onde está a qualidade dos currículos?
O professor Dantas defende-se afirmando que a faculdade não é responsável pelo péssimo desempenho dos alunos. É responsável ,sim. Professores e alunos formam um corpo só. Não é o fato de uma faculdade dispor de grande número de professores mestre e doutores que determina a qualidade do ensino. Nem notas baixas determinam a inferioridade de ninguém ou de uma faculdade como a de Medicina da Bahia. O problema é a visão crítica da realidade e a determinação para superar os passos dos tempos em que vivemos. Tempos em que o conhecimento é glorificado, mas na prática é anulado por um modelo de ensino massificado e mercantilista. Orientado para o lucro, sobretudo.
Vivemos na atualidade aquilo que Marcuse denominou de "sociedade unidimensional", uma sociedade de pensamento linear, não dialético, onde tudo é imediatamente transformado em mercadoria e, com isso, há o eclipse do pensamento critico. Todos esses aspectos afloram no desempenho dos estudantes de Medicina da Universidade Federal da Bahia e nas declarações do Professor Dantas. Não se trata de crucificá-lo. Agir assim seria cometer o lamentável erro - que sempre se repete - de confundir aparência com essência. O que o professor disse é uma opinião, uma aparência superficial da realidade, fruto de um desabafo que, como todo desabafo, diz respeito à um conhecimento raso. A essência é de outra natureza. Diz respeito aos dados concretos da realidade. Esse, sim, o aspecto relevante.
Não é prudente transformar as declarações do professor num espetáculo. Seria apenas um espetáculo a mais. Ela deve, sim, servir de ponto de partida para se indagar quem são os nossos estudantes universitários, mas também quem são os nossos doutores e mestres. Nesse momento em que estaremos evoluindo. Porque é a critica que modela o diálogo, impulsiona a mudança qualitativa. Fora de uma perspectiva ampla não há mídia training que resolva. Seria pura purpurina. Pura demagogia.
Em tempo: sou baiano e cresci ouvindo dizer que "baiano burro nasce morto". Pelo visto, o velho ditado, como a antiga relevância da Faculdade de Medicina da Universidade Federal da Bahia, de tantas histórias e serviços ao país, fazem parte do passado. Mais uma única pergunta: seria somente a faculdade de Medicina da Bahia onde o ensino exibe tão pouca qualidade? Onde os professores vêem os alunos com tamanho desprezo? Em tempo: a faculdade de medicina da Bahia comemorou recentemente 200 anos. Foi a primeira do Brasil.
Fonte: Por Francisco Viana, in terramagazine.terra.com.br
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