Pular para o conteúdo principal

Comunicação contra a inflação

"A inflação ganhou um fôlego extra nestes últimos meses e se pulveriza por vários setores".

"Em abril, presidente afirmou que alta dos alimentos era 'inflação boa'. Em maio, altas já levaram Lula a dizer que faria 'qualquer coisa' para conter preços".

"Memória inflacionária ainda assusta o Brasil".

"Inflação não pode escapar do controle, diz BNDES".

Raro o dia, nos últimos meses, que manchetes como estas não ocupam as primeiras páginas dos jornais ou não ocupam lugar de destaque nas páginas econômicas. É um tema que se adensa, que volta ao centro das atenções após mais de uma longa década de hibernação e que, sem dúvida, tende a provocar reações em cadeia. Quem não se lembra das remarcações antecipadas de preços? Quem não recorda que o Brasil chegou a ostentar os mais elevados índices de inflação do planeta ao longo das décadas de 80 e inicio dos anos 90 do século passado?

Tudo isso aconteceu numa época em que a Internet ainda não tinha entrado em cena. E que o seu prodigioso alcance não era sequer imaginado. Hoje, existem 1,4 bilhão de internautas sobre uma população mundial de 6,5 bilhões de pessoas em números aproximados. No Brasil, são mais de 40 milhões de pessoas com acesso à rede (Ibope/NetRatings, 1º semestre de 2008) e a tendência é que este número cresça. Num ambiente em que a inflação venha a ser notícia constante e com grande destaque, espetaculoso ou não, é como jogar gasolina num palheiro e riscar o fósforo. A reação em cadeia será imediata.

Contudo, o governo parece se comportar, se o tema é a comunicação, como se a inflação pertencesse a um país e a realidade brasileira fosse monopólio de outro país. Não me refiro aos aspectos econômicos. A cada notícia de revigoramento do dragão inflacionário, o Banco Central recorre ao remédio de sempre: alta de juros. Ocorre que na sociedade mediática esse remédio não funciona se não vier acompanhado de uma efetiva terapia no âmbito da comunicação.

É imperativo que a sociedade não apenas seja informada, mas seja convencida de que a estabilidade da moeda pode ser mantida, que cada cidadão, no particular, e todos no conjunto podem - e devem - somar forças para que o cenário atual de estabilidade seja preservado.

Essa posição só tende a se agravar num momento em que a Internet impera soberana. É preciso substituir velhos remédios por novos remédios. É preciso reduzir, e reduzir sensivelmente, as incertezas. Esse o objetivo prioritário de uma estratégia de comunicação pública bem sucedida. Daí, duas sugestões práticas.

A primeira é que o Governo lance campanhas de esclarecimento à sociedade quanto ao que fazer para conter a inflação nos limites do que vinha sendo planejado. A segunda é que busque dialogar com o empresariado e a mídia, em especial a mídia, para que o tema seja tratado na justa medida, não com a medida da irracionalidade ou do espetáculo.

É um desafio não só do governo federal, mas dos governos estaduais, órgãos públicos e sindicatos. A diferença entre notícia e comunicação é que a notícia informa, a comunicação é voltada para a mudança de comportamento. Juntas, contribuem para que a sociedade evolua do patamar da opinião pública, mutante por natureza, para o saber público, que se alicerça na força da razão. Comunicação não é panacéia. Precisa vir acompanhada de ações concretas para mudar a realidade concreta.

Porém, é um dos caminhos seguros para o êxito na moderna sociedade democrática. No Brasil, a mídia é muito ativa, desfruta de vasta credibilidade e, como ocorre em todo o mundo, sente forte sedução pela notícia negativa. Fenômeno aqui agravado pela desconfiança que o Estado inspira e por uma cultura, sempre negligenciada, de pessimismo quanto a um amanhã radioso que nunca chega. Campanhas antiinflacionárias, associadas a um processo de diálogo aberto com a sociedade, tenderiam a ser um antídoto vigoroso contra a desconfiança e o pessimismo.

Tornaria visível o que foi conquistado em mais de uma década de estabilidade, a começar pela retomada do crescimento econômico, além de deixar claro todos somos responsáveis, nas atitudes práticas, pela manutenção da posição alcançada. Isto porque não parece existir meio termo: o Brasil será o país da inflação ou o país da estabilidade. A última alternativa tem demonstrado ser prioridade. Como a comunicação, um recurso singular de diferenciação.


Fonte: Por Paulo Nassar, in terramagazine.terra.com.br

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

H2OH! - um produto desacreditado que virou sucesso

O executivo carioca Carlos Ricardo, diretor de marketing da divisão Elma Chips da Pepsico, a gigante americana do setor de alimentos e bebidas, é hoje visto como uma estrela em ascensão no mundo do marketing. Ele é o principal responsável pela criação e pelo lançamento de um produto que movimentou, de forma surpreendente, o mercado de bebidas em 11 países. A princípio, pouca gente fora da Pepsi e da Ambev, empresas responsáveis por sua produção, colocava fé na H2OH!, bebida que fica a meio caminho entre a água com sabor e o refrigerante diet. Mas em apenas um ano a H2OH! conquistou 25% do mercado brasileiro de bebidas sem açúcar, deixando para trás marcas tradicionais, como Coca-Cola Light e Guaraná Antarctica Diet. Além dos números de vendas, a H2OH! praticamente deu origem a uma nova categoria de produto, na qual tem concorrentes como a Aquarius Fresh, da Coca-Cola, e que já é maior do que segmentos consagrados, como os de leites com sabores, bebidas à base de soja, chás gelados e su

Doze passos para deixar de ser o “bode expiatório” na sua empresa

Você já viu alguma vez um colega de trabalho ser culpado, exposto ou demitido por erros que não foi ele que cometeu, e sim seu chefe ou outro colega? Quais foram os efeitos neste indivíduo e nos seus colegas? Como isso foi absorvido por eles? No meu trabalho como coach, tenho encontrado mais e mais casos de “bodes expiatórios corporativos”, que a Scapegoat Society, uma ONG britânica cujo objetivo é aumentar a consciência sobre esta questão no ambiente de trabalho, define como uma rotina social hostil ou calúnia psicológica, através da qual as pessoas passam a culpa ou responsabilidade adiante, para um alvo ou grupo. Os efeitos são extremamente danosos, com conseqüências de longo-prazo para a vítima. Recentemente, dei orientação executiva a um gerente sênior que nunca mais se recuperou por ter sido um dia bode expiatório. John, 39 anos, trabalhou para uma empresa quando tinha algo em torno de 20 anos de idade e tudo ia bem até que ele foi usado como bode expiatório por um novo chefe. De

Funcionários da Domino´s Pizza postam vídeo no You Tube e são processados

Dois funcionários irresponsáveis imaginam um vídeo “muito engraçado” usando alimentos e toda sorte de escatologia. O cenário é uma cozinha da pizzaria Domino´s. Pronto, está feito o vídeo que mais chamou a atenção da mídia americana na semana passada. Nele, os dois funcionários se divertem enquanto um espirra na comida, entre outras amostras de higiene pessoal. Tudo isso foi postado no you tube no que eles consideraram “uma grande brincadeira”. O vídeo em questão, agora removido do site, foi visto por mais de 930 mil pessoas em apenas dois dias. (o vídeo já foi removido, mas pode ser conferido em trechos nesta reportagem: http://www.youtube.com/watch?v=eYmFQjszaec ) Mas para os consumidores da rede, é uma grande(síssima) falta de respeito. Restou ao presidente a tarefa de “limpar” a bagunça (e a barra da empresa). Há poucos dias, Patrick Doyle, CEO nos EUA, veio a público e respondeu na mesma moeda. No vídeo de dois minutos no You Tube, Doyle ( http://www.youtube.com/watch?v=7l6AJ49xNS