A tragédia com o vôo 3054 é algo tão terrível que a dimensão humana, naturalmente, ocupa a posição central em qualquer discussão sobre o tema. Se do ponto de vista humano uma tragédia desse tipo provoca um forte sentimento de comoção, do ponto de vista empresarial é uma circunstância extrema onde - mais do que nunca - é submetida a um duro teste a capacidade de gestão e de condução de uma marca.
Com todo o respeito, convido o leitor a examinar alguns desafios que desabaram sobre a rotina dos responsáveis por liderar esse terrível processo, algo que, com as devidas características, pode atingir organizações dos mais variados setores. Após uma tragédia, instala-se uma atmosfera de dolorosa emoção. Mas é nesse momento que uma instituição ou um líder precisam conduzir inúmeras iniciativas com o mais alto nível de racionalidade.
Embora o acidente com o vôo 1907 da Gol, de 2006, possa guardar semelhança com esse da TAM em termos de perda de vidas humanas, na verdade são episódios muito diferentes, do ponto de vista da gestão de crises. E peço novamente licença para tratar de temas tão terríveis de forma aparentemente tão "objetiva". A idéia é contribuir para que gestores e organizações possam agir com maior respeito, sensibilidade e ética, em circunstâncias dessa devastadora magnitude emocional.
Em termos de comoção pública, uma coisa é um acidente em um local de difícil acesso, em plena selva, onde a capacidade dos meios de comunicação de difundir imagens é praticamente impossível, sobretudo nos primeiros instantes. Foi o que aconteceu no caso da Gol. Já um acidente aéreo com vítimas fatais em área urbana significa que o mundo inteiro pode assistir em tempo real, desde o início, todos os contornos do drama. Foi isso que aconteceu no caso da TAM.
O incêndio, as explosões, desabamentos, a retirada dos corpos - tudo sendo testemunhado ao vivo por uma audiência perplexa, durante horas em rádios, tevês, blogs e portais. Sem contar a repetição das imagens mais chocantes - informar é o papel inalienável do jornalismo, ainda mais quando algo grave ocorre em uma das maiores cidades do mundo.
Uma tragédia acontece uma vez na realidade, de forma concreta. Mas uma tragédia captada pelas lentes de emissoras de TV, celulares de cidadãos, câmeras de circuito interno e externo, acontece bilhões de vezes no imaginário do planeta, a cada vez que as imagens são reprisadas ou acessadas. A comoção é imediata e muito maior, tornando ainda mais difícil a missão dos líderes da empresa nessa situação.
É inegável que a TAM seguiu os princípios básicos dos manuais de crise. Enfrentou o ponto crítico da enorme pressão por informações, logo após a tragédia. Mas em momentos de forte comoção, qualquer mínima falha informativa pode se transformar em enorme contradição, perante uma opinião pública com os nervos à flor da pele. Por isso, há um esforço para que as primeiras informações só sejam divulgadas após um crivo minucioso, sacrificando a agilidade em nome da precisão. A TAM tentou seguir essa premissa, mas não conseguiu evitar o desgaste provocado pelos desencontros com a lista dos passageiros.
Nos demais itens, a TAM também seguiu o que mandam os manuais: o presidente da companhia em pessoa só deu a primeira entrevista após reunir um conjunto mínimo de informações; retirou-se do ar toda a propaganda da empresa; deu-se apoio aos familiares e houve o compromisso público com as devidas reparações financeiras; a companhia divulgou notas nos principais veículos de comunicação, externando sua posição oficial; e houve um intenso fluxo de entrevistas para a imprensa.
Chegou até mesmo a colocar no ar um anúncio assinado pela família Amaro, num movimento explícito de resgatar o carisma da imagem do fundador, o comandante Rolim. É como se, num acidente no grupo Votorantim, víssemos uma nota na TV assinada pela família Ermírio de Moraes. Isso mostra que a TAM enfrentou sua crise sem vôos cegos, guiada pelos instrumentos disponíveis pelo receituário da gestão de crises.
Gerenciar uma crise, ainda mais com as proporções de uma tragédia exposta mundialmente, nunca é algo fácil. Esse tipo de desafio não deve ser medido como uma gincana, em que cada acerto do comitê de crise significa uma vitória. Às vezes, mesmo fazendo o possível, problemas e polêmicas são inevitáveis. Afinal, isso é uma crise. No caso do vôo 3054, mais uma vez o chamado reverso ganhou destaque. O próprio presidente da empresa já havia mencionado a questão em sua primeira coletiva (fruto certamente de um preparo de seu comitê). Ainda assim, o tema gerou desgaste para a companhia, quando noticiado em grande escala.
A principal conclusão é que sempre é bom planejar as melhores formas de evitar uma crise. Mas o gerenciamento não é uma mágica, capaz de impedir as crises. É apenas uma forma de pensar e de agir para evitar determinados erros, quando uma crise eclode. Na lógica das crises, não existe uma opção entre o bom e o ruim. É sempre entre o ruim e o pior. Quanto menos erros, mais distante do pior: isso é gestão de crises.
Fonte: Por Mário Rosa, in Gazeta Mercantil/Caderno C - Pág. 9
Com todo o respeito, convido o leitor a examinar alguns desafios que desabaram sobre a rotina dos responsáveis por liderar esse terrível processo, algo que, com as devidas características, pode atingir organizações dos mais variados setores. Após uma tragédia, instala-se uma atmosfera de dolorosa emoção. Mas é nesse momento que uma instituição ou um líder precisam conduzir inúmeras iniciativas com o mais alto nível de racionalidade.
Embora o acidente com o vôo 1907 da Gol, de 2006, possa guardar semelhança com esse da TAM em termos de perda de vidas humanas, na verdade são episódios muito diferentes, do ponto de vista da gestão de crises. E peço novamente licença para tratar de temas tão terríveis de forma aparentemente tão "objetiva". A idéia é contribuir para que gestores e organizações possam agir com maior respeito, sensibilidade e ética, em circunstâncias dessa devastadora magnitude emocional.
Em termos de comoção pública, uma coisa é um acidente em um local de difícil acesso, em plena selva, onde a capacidade dos meios de comunicação de difundir imagens é praticamente impossível, sobretudo nos primeiros instantes. Foi o que aconteceu no caso da Gol. Já um acidente aéreo com vítimas fatais em área urbana significa que o mundo inteiro pode assistir em tempo real, desde o início, todos os contornos do drama. Foi isso que aconteceu no caso da TAM.
O incêndio, as explosões, desabamentos, a retirada dos corpos - tudo sendo testemunhado ao vivo por uma audiência perplexa, durante horas em rádios, tevês, blogs e portais. Sem contar a repetição das imagens mais chocantes - informar é o papel inalienável do jornalismo, ainda mais quando algo grave ocorre em uma das maiores cidades do mundo.
Uma tragédia acontece uma vez na realidade, de forma concreta. Mas uma tragédia captada pelas lentes de emissoras de TV, celulares de cidadãos, câmeras de circuito interno e externo, acontece bilhões de vezes no imaginário do planeta, a cada vez que as imagens são reprisadas ou acessadas. A comoção é imediata e muito maior, tornando ainda mais difícil a missão dos líderes da empresa nessa situação.
É inegável que a TAM seguiu os princípios básicos dos manuais de crise. Enfrentou o ponto crítico da enorme pressão por informações, logo após a tragédia. Mas em momentos de forte comoção, qualquer mínima falha informativa pode se transformar em enorme contradição, perante uma opinião pública com os nervos à flor da pele. Por isso, há um esforço para que as primeiras informações só sejam divulgadas após um crivo minucioso, sacrificando a agilidade em nome da precisão. A TAM tentou seguir essa premissa, mas não conseguiu evitar o desgaste provocado pelos desencontros com a lista dos passageiros.
Nos demais itens, a TAM também seguiu o que mandam os manuais: o presidente da companhia em pessoa só deu a primeira entrevista após reunir um conjunto mínimo de informações; retirou-se do ar toda a propaganda da empresa; deu-se apoio aos familiares e houve o compromisso público com as devidas reparações financeiras; a companhia divulgou notas nos principais veículos de comunicação, externando sua posição oficial; e houve um intenso fluxo de entrevistas para a imprensa.
Chegou até mesmo a colocar no ar um anúncio assinado pela família Amaro, num movimento explícito de resgatar o carisma da imagem do fundador, o comandante Rolim. É como se, num acidente no grupo Votorantim, víssemos uma nota na TV assinada pela família Ermírio de Moraes. Isso mostra que a TAM enfrentou sua crise sem vôos cegos, guiada pelos instrumentos disponíveis pelo receituário da gestão de crises.
Gerenciar uma crise, ainda mais com as proporções de uma tragédia exposta mundialmente, nunca é algo fácil. Esse tipo de desafio não deve ser medido como uma gincana, em que cada acerto do comitê de crise significa uma vitória. Às vezes, mesmo fazendo o possível, problemas e polêmicas são inevitáveis. Afinal, isso é uma crise. No caso do vôo 3054, mais uma vez o chamado reverso ganhou destaque. O próprio presidente da empresa já havia mencionado a questão em sua primeira coletiva (fruto certamente de um preparo de seu comitê). Ainda assim, o tema gerou desgaste para a companhia, quando noticiado em grande escala.
A principal conclusão é que sempre é bom planejar as melhores formas de evitar uma crise. Mas o gerenciamento não é uma mágica, capaz de impedir as crises. É apenas uma forma de pensar e de agir para evitar determinados erros, quando uma crise eclode. Na lógica das crises, não existe uma opção entre o bom e o ruim. É sempre entre o ruim e o pior. Quanto menos erros, mais distante do pior: isso é gestão de crises.
Fonte: Por Mário Rosa, in Gazeta Mercantil/Caderno C - Pág. 9
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