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Planejamento de Comunicação: antídoto contra crises

Ao tempo em que nos vemos perplexos diante da tragédia provocada pelo acidente do vôo da Tam em São Paulo, e diante do cenário de confusão e falta de informações por parte da empresa envolvida no acidente, como se vê através dos veículos de imprensa, vale a pena, enquanto profissionais de comunicação, refletir sobre a importânica de uma política de comunicação em momentos de crise. Transcrevo aqui a íntegra do artigo "Antídoto contra crises", escrito por Célia Romano, sócia-diretora da Lide Soluções Integradas em Comunicação, que atua como consultora em planejamento estratégico de comunicação empresarial. Vale a pena conferir:


"O grande desafio de um planejamento estratégico de comunicação é dar consistência e perenidade ao processo de relacionamento de uma empresa com seus diversos públicos, em qualquer circunstância - seja em tempos de calmaria e estabilidade, ou em meio a turbulências e incertezas.

Ele é, sem dúvida, a ferramenta-mestra da política de comunicação de uma empresa. Sem essa política, que o antecede e lhe confere coerência, o planejamento estratégico de comunicação corre o risco de ser capenga, claudicante. Não sobreviverá nem mesmo à calmaria e acabará na mesmice da memória de um computador.

A importância de o planejamento estratégico de comunicação para a atuação holística de uma empresa, para a construção e consolidação da reputação e da marca, fortes e com valores agregados, vem sendo cada vez mais reconhecida e valorizada - muitas vezes, também é certo, à custa de desastrosas experiências. Infelizmente.

A falta de planejamento de comunicação provocou trombadas da Telefônica com a opinião pública quando da sua entrada no Brasil e danificou a reputação do laboratório Shering no episódio das pílulas de farinha - só para ficar em dois casos bastante conhecidos.

São exemplos como esses que reforçam a responsabilidade que recai sobre os profissionais de comunicação, contratados para fazer com que uma empresa fale e aja articuladamente, e de forma consistente, com todos os seus stakeholders. Aqui, temos um outro desafio: o de substituir velhas práticas por novas abordagens, vencendo as resistências de ambos os lados.

Usar uma nova linguagem, adotar novos procedimentos, criar parâmetros de relacionamento e de gestão de negócios, que se baseiam em valores éticos e requerem práticas de responsabilidade social empresarial, são mudanças que podem provocar certo desconforto em algumas áreas da companhia.

Um planejamento estratégico de comunicação deve, obrigatoriamente, ser integrado. Nele, busca-se unificar mensagens e práticas que permeiam todas as ações da empresa, de diferentes áreas. Somente assim será assegurada uma exposição equilibrada, consistente e direcionada aos objetivos maiores da organização. Por esse motivo, uma mudança dessa ordem só será efetiva se começar com o comprometimento explícito de sua direção.


Passo a passo
Como evitar que eventuais turbulências se transformem em grandes e até intransponíveis obstáculos? Cada caso é um caso, seria a clássica resposta. Mas se consideramos apenas o princípio de que cada empresa tem um contexto diferente para ser analisado e ajustado, há um procedimento que eu diria ser universal: avaliar com rigor, discutir nos detalhes e, até mesmo, testar sem temores o passo a passo desse processo de comunicação.

Este é um bom começo. Em algumas situações, isso implica um longo aprendizado para todos os envolvidos, porque a comunicação holística compreende, pelo menos, duas vias: de dentro para fora e de fora para dentro.

Há um case que ilustra muito bem o grau de dificuldade a que estamos sujeitos nessa fase preliminar. Logo após enfrentar dois acidentes com suas aeronaves - um deles com 99 mortos - a TAM se viu em meio a uma crise de imagem sem precedentes em sua trajetória, que precisava ser, pelo menos, amenizada para não acabar devastadora.

À época, o comandante Rolim procurou sua agência e concordou em que a única saída para a companhia seria agir segundo as diretrizes de um planejamento estratégico de comunicação. Fazer o rescaldo, atuar pontualmente na crise e iniciar um processo de longo prazo de reconstrução de imagem.

Tudo foi feito como mandam os melhores manuais e conduzido por profissionais especializados em gestão de crises, começando por uma auditoria de imagem junto à imprensa, formadores de opinião e usuários. O resultado comprovou que o caminho proposto pela agência era o mais adequado.

Uma imersão na companhia detectou vulnerabilidades, mas também muitos pontos fortes, que poderiam ser mais bem explorados. As mensagens-chave foram alinhadas, os porta-vozes definidos e foi programada uma série de ações para os públicos interno e externo.

O planejamento estratégico da TAM foi aprovado pela direção com poucas alterações. Ao colocá-lo em prática, no entanto, a agência esbarrou num grande obstáculo: o próprio comandante Rolim, quem, na verdade, fazia o marketing da companhia e ditava a comunicação, independentemente de planejamentos. Conclusão: o plano foi tocado pela metade e ao sabor dos ventos. Felizmente, ele favoreceu a companhia e a fez decolar novamente.


Política de comunicação é o fio condutor
Um grande pilar de sustentação de um planejamento estratégico de comunicação é a existência de uma política de comunicação clara, validada pelo board da empresa e assimilada por todos os escalões, horizontalmente. É preciso respaldo. A política de comunicação é o fio condutor. É ela que responde a uma questão fundamental: como a empresa quer se apresentar diante de seus públicos.

Muitas organizações já perceberam que quanto mais verdadeiro for o comprometimento com os valores da governança corporativa - especialmente a ética e a transparência - mais sólida será a imagem institucional. Foi isso, aliás, que fez com que algumas corporações emergissem de uma crise e rapidamente retomassem o ritmo de seus negócios. Ou seja, elas foram salvas pela força da imagem de sua marca, percebida pelos consumidores e formadores de opinião como associada à prática de valores éticos.

O caso mais clássico é o da Jonhson & Jonhson, que reforçou sua reputação depois da severa crise envolvendo o Tylenol, um de seus carros-chefe na década de 80. Mesmo sem um planejamento preventivo e específico de gerenciamento de crise, a empresa comportou-se de modo exemplar, utilizando os valores e compromissos de seu célebre 'credo' (que sobrevive até hoje) para nortear as decisões e ações em meio à tempestade.

Também foram os valores corporativos que inspiraram a atuação do vice-presidente do McDonald's, Don Horwitz, durante o dramático episódio em que 21 pessoas foram fuziladas numa loja da rede, em 1984, em San Diego, nos Estados Unidos.

Mas, afinal, por que precisamos nos cercar de tantos cuidados ao elaborar o planejamento estratégico de comunicação? De quais riscos estamos falando? Em um cenário marcadamente competitivo, em que predominam mercados nervosos e globalizados, não raro predatórios, é grande a tentação de se passar por cima de ações estrategicamente estruturadas, cujos resultados demandam um certo tempo.

Isso se dá com alguma freqüência quando, por exemplo, as metas de vendas se sobrepõem a tudo. É quando a comunicação é concebida como ferramenta de venda direta e gera a expectativa de um retorno imediato. Esquece-se que um produto não está dissociado da imagem de quem o fabrica, por mais eficiente e único que ele seja; que essa imagem exige tempo para ser construída e um trabalho atento e permanente de consolidação. E que todos são parceiros e responsáveis por sua sustentação.

Se ela é suficientemente forte, marcas e produtos tornam-se imbatíveis. Afinal, o planejamento estratégico é uma metodologia capaz de assegurar que as ferramentas de comunicação sejam efetivamente utilizadas como geradoras de negócios.


Desdobramentos e planos pontuais
Se existem uma política e um planejamento de comunicação estratégico sedimentados, é mais provável que se consiga enfrentar com sucesso pressões dessa natureza. É muito mais seguro e eficiente desenvolver estratégias e táticas específicas, que atendam àquela determinada contingência, do que improvisar ações provocadas pelo imediatismo. Concordo que sustentar essa posição equivale, muitas vezes, a uma queda-de-braço, mas há que se saber recuar para garantir um salto maior à frente: a tática e a estratégia.

O planejamento estratégico de comunicação permite desdobramentos e planos pontuais. Alguns praticamente obrigatórios, como o de gerenciamento de crises. É importante ter em mente que numa economia determinada por mercados globalizados, altamente competitivos, que envolvem diferentes culturas, uma rede complexa de parceiros e relacionamentos, poderosas organizações não-governamentais, novas mídias de alcance planetário e normas regulatórias cada vez mais severas, as empresas estão mais expostas a crises de imagem do que nos mercados tradicionais.

Essas crises, muitas de origem ética, se espalham com enorme velocidade, com dimensões globais, como ocorreu no início desse século com a erosão da reputação de megacorporações como Enron, Worldcom ou Parmalat, flagradas em fraudes gigantescas. Todos nós sabemos o que significa agir no meio do incêndio - pode até dar certo, não nego, mas o que virá a seguir?

Investir em planos pontuais de comunicação, no entanto, nem sempre significa dispêndio financeiro, que seria até contornável. Exige algo intangível: a disposição política e emocional do empresário para enxergar sua empresa por inteiro, desnudá-la, encarar suas fragilidades e propor-se a resolvê-las.


O grande pilar
Para começar a elaborar um planejamento estratégico de comunicação que funcione, algumas questões devem ser respondidas preliminarmente:
A empresa que está na cabeça da direção é a mesma que está na cabeça dos funcionários, parceiros, comunidade, autoridades, imprensa e formadores de opinião?
A política de comunicação da empresa expressa sua missão e valores? Existe uma percepção interna e externa de que a empresa pratica esses valores?
A organização se comunica bem com seus funcionários? E com os outros stakeholders?
Existem ferramentas apropriadas para responder a essas questões, como auditorias e sondagens de imagem, pesquisa de clima organizacional, pesquisa de opinião e de mercado e tantas outras. O mais importante, no entanto, antes de escolher a melhor ferramenta e o melhor fornecedor, é saber exatamente qual informação está se buscando e o que se pretende fazer com ela e a partir dela.

Essas pesquisas vão revolver questões delicadas. Irão, por exemplo, detectar as diferenças de percepção entre os públicos de interesse da empresa (pode ser que seja praticamente desconhecida por alguns ou vista de forma equivocada por outros) ou apontar os caminhos mais seguros a seguir, tanto em relação ao posicionamento de mercado quanto em relação à comunicação com os públicos.

O resultado de uma pesquisa pode surpreender: não é aquele que a empresa esperava ou é oposto aos indicadores que determinavam, até então, estratégias e ações. Conclusão: é preciso mudar o olhar.


Atenção à fase de sedimentação
Para evitar que um planejamento estratégico de comunicação seja abortado logo de início, o mais prudente é seguir à risca certos procedimentos. Alguns deles:

- Conhecer a cultura da empresa e sua trajetória comercial - como conduz seus negócios, as crises que já viveu, como se relaciona com o mercado;
- Conhecer o mercado em que atua, diferenciais e projeções;
- Identificar as forças internas - quem manda e quem decide sobre o quê;
- Garantir que a direção da empresa esteja convencida da necessidade de se ter um planejamento estratégico de comunicação;
- Mobilizar as partes diretamente envolvidas no processo para que sejam parceiros e colaboradores do processo de preparação e execução do planejamento estratégico;
- Definir interlocutores internos, respaldados pela direção, que funcionem como facilitadores;
- Informar, prestar esclarecimentos, fazer com que todos entendam os objetivos que se pretende alcançar.

O sucesso do planejamento estratégico de comunicação começa neste momento. Por isso, não se deve subestimar respostas objetivas, muito menos impressões que decorrem de feeling. É importantíssimo estar atento às oscilações do ambiente interno. Ficar de olho no 'termômetro'. Não temer expor fatos e impressões e sinalizar mudanças. Não ser arrogante. Essas são, em linhas gerais, as bases para um novo patamar de relacionamento interno e externo.

As etapas de um planejamento estratégico dependem muito dessa fase de sedimentação para serem bem sucedidas. Elas irão aprofundar questões e apontar contradições. Existem vários modelos de estrutura. Este é um dos que a agência adota, por se adaptar a diferentes perfis de empresas:

- Análise de cenário de negócios - grau de maturidade do mercado de atuação da empresa, concorrência e obstáculos;
- Análise de percepção - auditoria de imagem com pesquisas quantitativas e qualitativas;
- Análise de comunicação - avaliação dos meios usados pela empresa para se comunicar com seus públicos, incluindo eventos, apoios culturais e ações de responsabilidade social empresarial;
- Posicionamento estratégico - objetivos a serem alcançados e as mensagens-chave de apoio;
- Táticas para mudança - identifica eventuais falhas e inconsistências na comunicação da empresa, sugere correções de rumo e aponta as ferramentas adequadas para implementá-las.


Revisões periódicas
O planejamento estratégico, contudo, não pode ser uma camisa-de-força, pois acabará alterado em sua essência. Há que se permitir uma certa flexibilidade, capaz de responder a mudanças de mercado e reposicionamentos da empresa, por exemplo. O low profile de ontem pode ter sido circunstancial.

Daí a necessidade de revisões periódicas, com estratégias e táticas sempre alinhadas e coerentes com a política de comunicação da empresa. Para isso, existem mecanismos de avaliação de resultados e de imagem, que podem ser anuais ou semestrais, segundo a dinâmica da empresa e do mercado em que atua. Deve-se considerar nessas avaliações que um planejamento estratégico de comunicação demanda tempo de maturação para ser plenamente implantado.

Muitas ações são apenas previstas inicialmente, mas devem ter um prazo para execução. Se a empresa não tem uma política de relações com a comunidade externa, ela deverá ser formatada e programada. Se o departamento de recursos humanos não tem uma política de incentivo ao aprimoramento profissional dos colaboradores, essa política deve ser desenvolvida e colocada em prática dentro de um prazo viável.

Fazer um planejamento estratégico de comunicação, que seja também de comunicação integrada, é sempre um estimulante aprendizado. Não existem modelos acabados. Para cada empresa haverá um olhar diferente, que permitirá aprimorar as ferramentas de comunicação ou usá-las de forma mais criativa. O ponto de partida, porém, deve ser o mesmo: os valores e atributos que regem o negócio e devem ser projetados e percebidos. E quanto mais avançarmos, maiores serão as possibilidades de acertos".


Fonte: Por Célia Romano, in www.ibcbrasil.com.br

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