Pular para o conteúdo principal

Como encarar as feras

Toda vez que vejo um político apanhado no contrapé, tendo de se explicar para a opinião pública, penso: como seria bom se presidentes de empresas, na hora de dissecar um trimestre de resultados abaixo do plano, pudessem usar argumentos como "isso é inveja de meus detratores" ou "estou sendo crucificado por algo que não fiz". Mas vida de presidente é diferente. Sendo o maior relações-públicas da empresa, ele deve estar muito bem preparado para enfrentar a mídia. No mais das vezes, isso é fácil, porque o tema da entrevista é previamente discutido e concordado. O pesadelo é encarar a mídia numa situação de crise.

Coloque-se no lugar do presidente da TAM, após a tragédia de Congonhas. Que postura você adotaria no primeiro contato com aquela floresta de câmeras e microfones, que irão registrar cada palavra, cada gesto, cada pausa, cada mínima expressão facial? Você teria um discurso previamente elaborado e revisado, e não se desviaria dele por nada, mantendo uma postura linear e profissional, sem alterar o tom de voz? Ou se emocionaria, e choraria junto com os que perderam familiares e amigos? O presidente da TAM preferiu a primeira atitude - que qualquer assessoria de imprensa consideraria "a mais recomendável". Em momentos de desespero, é vital que uma autoridade demonstre serenidade. Porém, em setembro de 2001, quando as torres vieram abaixo, o prefeito Giuliani fez o inverso - adotou as providências possíveis, e foi imediatamente ao local da tragédia para abraçar e confortar os aflitos - e seu ibope entre o eleitorado foi às nuvens. Se Giuliani agiu espontaneamente ou se ensaiou diante do espelho antes de sair às ruas, ninguém sabe.

Nenhum presidente, por mais sólida que seja sua empresa, pode desprezar o fato de que, de repente, poderá encarar uma mídia ávida por informações, num episódio ruim e inesperado. Geralmente, o presidente está acostumado a falar em situações sob seu controle, para pessoas que o respeitam, e até se intimidam com sua simples presença. Já repórteres não são amigos solidários, mas profissionais que estão interessados em explorar exatamente os ângulos da situação que menos interessam à empresa. Todo presidente acredita estar pronto para esse embate. Mas raros se dispuseram a fazer uma simulação. Não um curso, mas um contato cara a cara com as feras.

Há 15 anos, juntamente com outros 11 executivos, participei de um. O formato era simples: 1. Foram contratados cinco repórteres experientes. 2. Os executivos e os repórteres receberam um resumo escrito de um fato chocante, que poderia destruir a reputação da empresa. 3. Cinco minutos depois, eles nos bombardearam com perguntas pertinentes, que variavam da calculada condescendência à quase insolência. Ao final, todos fomos reprovados. Sem exceção, pensávamos que tiraríamos de letra, e descobrimos que estávamos despreparados. Felizmente, era só um teste. Mas poderia não ter sido, porque notícias ruins nunca avisam a que horas irão chegar.


Fonte: Por Max Gehringer, in epocanegocios.globo.com

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

H2OH! - um produto desacreditado que virou sucesso

O executivo carioca Carlos Ricardo, diretor de marketing da divisão Elma Chips da Pepsico, a gigante americana do setor de alimentos e bebidas, é hoje visto como uma estrela em ascensão no mundo do marketing. Ele é o principal responsável pela criação e pelo lançamento de um produto que movimentou, de forma surpreendente, o mercado de bebidas em 11 países. A princípio, pouca gente fora da Pepsi e da Ambev, empresas responsáveis por sua produção, colocava fé na H2OH!, bebida que fica a meio caminho entre a água com sabor e o refrigerante diet. Mas em apenas um ano a H2OH! conquistou 25% do mercado brasileiro de bebidas sem açúcar, deixando para trás marcas tradicionais, como Coca-Cola Light e Guaraná Antarctica Diet. Além dos números de vendas, a H2OH! praticamente deu origem a uma nova categoria de produto, na qual tem concorrentes como a Aquarius Fresh, da Coca-Cola, e que já é maior do que segmentos consagrados, como os de leites com sabores, bebidas à base de soja, chás gelados e su

Doze passos para deixar de ser o “bode expiatório” na sua empresa

Você já viu alguma vez um colega de trabalho ser culpado, exposto ou demitido por erros que não foi ele que cometeu, e sim seu chefe ou outro colega? Quais foram os efeitos neste indivíduo e nos seus colegas? Como isso foi absorvido por eles? No meu trabalho como coach, tenho encontrado mais e mais casos de “bodes expiatórios corporativos”, que a Scapegoat Society, uma ONG britânica cujo objetivo é aumentar a consciência sobre esta questão no ambiente de trabalho, define como uma rotina social hostil ou calúnia psicológica, através da qual as pessoas passam a culpa ou responsabilidade adiante, para um alvo ou grupo. Os efeitos são extremamente danosos, com conseqüências de longo-prazo para a vítima. Recentemente, dei orientação executiva a um gerente sênior que nunca mais se recuperou por ter sido um dia bode expiatório. John, 39 anos, trabalhou para uma empresa quando tinha algo em torno de 20 anos de idade e tudo ia bem até que ele foi usado como bode expiatório por um novo chefe. De

Funcionários da Domino´s Pizza postam vídeo no You Tube e são processados

Dois funcionários irresponsáveis imaginam um vídeo “muito engraçado” usando alimentos e toda sorte de escatologia. O cenário é uma cozinha da pizzaria Domino´s. Pronto, está feito o vídeo que mais chamou a atenção da mídia americana na semana passada. Nele, os dois funcionários se divertem enquanto um espirra na comida, entre outras amostras de higiene pessoal. Tudo isso foi postado no you tube no que eles consideraram “uma grande brincadeira”. O vídeo em questão, agora removido do site, foi visto por mais de 930 mil pessoas em apenas dois dias. (o vídeo já foi removido, mas pode ser conferido em trechos nesta reportagem: http://www.youtube.com/watch?v=eYmFQjszaec ) Mas para os consumidores da rede, é uma grande(síssima) falta de respeito. Restou ao presidente a tarefa de “limpar” a bagunça (e a barra da empresa). Há poucos dias, Patrick Doyle, CEO nos EUA, veio a público e respondeu na mesma moeda. No vídeo de dois minutos no You Tube, Doyle ( http://www.youtube.com/watch?v=7l6AJ49xNS