Pular para o conteúdo principal

Marketing é coisa do passado

Quando o açougueiro Gustavus F. Swift se mudou para Chicago em 1875, quase toda a carne nos Estados Unidos era enviada ainda viva do oeste para o leste norte-americano. Os animais eram mandados de trem por milhares de quilômetros para os grandes centros consumidores da Costa Leste, onde eram então abatidos. O gado vivo, durante a viagem, freqüentemente perdia peso, adoecia ou morria. Swift percebeu que com vagões de trens refrigerados, o gado poderia ser abatido e então enviado para os mercados consumidores. As economias foram enormes. Diante desse novo contexto, outras empresas que continuaram competindo umas com as outras por mercados locais no meio-oeste, rapidamente perceberam que sua estrutura de custos tornava impossível prosseguir. As empresas que vendiam para o leste, e não fizeram os mesmos investimentos de Swift, saíram do mercado para sempre.

A estrada de ferro foi inventada no final da década de 1820, na Inglaterra, para conectar a cidade de Manchester, um grande centro têxtil, a Liverpool, o porto de onde o algodão e a lã eram exportados. Ninguém imaginava que 50 anos depois, separado por um oceano e em outro continente, o trem mudaria a forma como a carne iria para o mercado. A ferrovia, como infra-estrutura, permitiu o surgimento e consolidação de marcas como Johnson & Johnson (1886), Procter & Gamble (1837) e Kodak (1887), presentes até hoje em nosso cotidiano.

Mudanças em infra-estruturas básicas, ou seja, no contexto geral no qual um negócio específico acontece, freqüentemente não estão relacionadas com esse negócio. A televisão, por exemplo, teve um profundo impacto no marketing de produtos de consumo - desde produtos de alto preço unitário, como carros, até aqueles com preços inexpressivos, como refrigerantes. Nem os fabricantes de automóveis nem os de refrigerantes tiveram algo a ver com as tecnologias que fizeram a televisão possível. Entretanto, o sucesso do uso dessa nova forma de comunicação se tornou essencial para o mercado dos produtos e alterou a alocação dos investimentos em marketing das empresas. A Revlon, por exemplo, estabeleceu sua marca na indústria de cosméticos patrocinando programas de TV na década de 1950. As empresas que foram ágeis em reconhecer as implicações de novas tecnologias em seus próprios negócios ganharam vantagens competitivas que duraram anos ou décadas.

Segundo o professor Richard S. Tedlow, da Harvard Business School, a história do marketing pode ser dividida em quatro fases. A primeira foi a da Fragmentação, caracterizada por uma estratégia de altas margens, baixos volumes e mercados limitados geograficamente. A segunda surgiu com a Unificação de mercados, caracterizada por altos volumes, baixas margens e a incorporação de toda uma geografia num grande mercado de massa. A terceira foi a da Segmentação, caracterizada por altos volumes, preços baseados em valor (benefícios totais comparados aos custos totais) e uma divisão de mercados baseada em demografia e perfis psicológicos. Tedlow não nomeou a quarta fase, apenas definindo que sua infra-estrutura básica seria proporcionada por uma revolução na informação e na comunicação.

Uma boa denominação para essa quarta fase, que estamos presenciando hoje, seria a da Personalização. As empresas devem tratar diferentemente consumidores que são diferentes entre si. Onde há clientes, existem relacionamentos. Para que o relacionamento fique mais próximo, fácil e ágil, as empresas devem empregar adequadamente a Tecnologia da Informação. Conceitos e estruturas como ERP, CRM, ECR e a Internet permitem que as empresas vendam aos seus clientes de uma forma cada vez mais personalizada. A interatividade da Internet, sincronizada com as informações mais detalhadas que as empresas passam a dispor – e tirar vantagens – a respeito delas mesmas e de seus clientes ao adotarem tecnologias de planejamento de seus recursos e de gerenciamento do relacionamento com seus clientes, permite que essas empresas rompam barreiras psicológicas, de tempo e espaço. A organização consegue ter uma melhor percepção sobre seu cliente e, independentemente de local e hora, oferecer produtos e serviços personalizados para satisfazer as necessidades e desejos desse cliente, tratando-o como indivíduo.

Por que empresários interessados no sucesso de suas empresas devem ficar atentos ao passado? Sabemos que a história não se repete e prognósticos de prestígio se mostram errados com freqüência. Embora seja impossível se ter um conhecimento exato do que ocorreu no passado, conhecê-lo pode ajudar a nos desprender de nossos próprios preconceitos.

O impacto de novas tecnologias na forma de se fazer negócios é inexorável e evolutivo. Novas tecnologias sempre definem a infra-estrutura básica para a próxima evolução. As estradas de ferro só foram possíveis após a invenção do telégrafo, pois só assim as pessoas conseguiam saber rapidamente onde os trens estavam em seu percurso.

O interessante de se voltar os olhos para a história do marketing, vendo como empresas evoluíram a partir da adoção de novas infra-estruturas, é porque assim derrubamos nossos preconceitos quanto à utilização de novas tecnologias e adquirimos o correto senso de urgência em sua adoção. Quando uma nova tecnologia surge, é impossível voltar atrás. Ou a empresa rapidamente incorpora em sua estratégia o novo contexto que surge, ou então aceita os riscos e os desdobramentos de não fazê-lo: mudar de foco, encolher ou morrer.

As empresas que rapidamente entenderem os diferenciais que novas tecnologias podem dar aos seus negócios – e aplicá-las – conquistarão vantagens que durarão por muito tempo. Esses empresários e executivos terão a oportunidade de definir hoje o passado de seu sucesso no futuro.


Fonte: Por Renato Romeo, in www.mundodomarketing.com.br

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

H2OH! - um produto desacreditado que virou sucesso

O executivo carioca Carlos Ricardo, diretor de marketing da divisão Elma Chips da Pepsico, a gigante americana do setor de alimentos e bebidas, é hoje visto como uma estrela em ascensão no mundo do marketing. Ele é o principal responsável pela criação e pelo lançamento de um produto que movimentou, de forma surpreendente, o mercado de bebidas em 11 países. A princípio, pouca gente fora da Pepsi e da Ambev, empresas responsáveis por sua produção, colocava fé na H2OH!, bebida que fica a meio caminho entre a água com sabor e o refrigerante diet. Mas em apenas um ano a H2OH! conquistou 25% do mercado brasileiro de bebidas sem açúcar, deixando para trás marcas tradicionais, como Coca-Cola Light e Guaraná Antarctica Diet. Além dos números de vendas, a H2OH! praticamente deu origem a uma nova categoria de produto, na qual tem concorrentes como a Aquarius Fresh, da Coca-Cola, e que já é maior do que segmentos consagrados, como os de leites com sabores, bebidas à base de soja, chás gelados e su

Doze passos para deixar de ser o “bode expiatório” na sua empresa

Você já viu alguma vez um colega de trabalho ser culpado, exposto ou demitido por erros que não foi ele que cometeu, e sim seu chefe ou outro colega? Quais foram os efeitos neste indivíduo e nos seus colegas? Como isso foi absorvido por eles? No meu trabalho como coach, tenho encontrado mais e mais casos de “bodes expiatórios corporativos”, que a Scapegoat Society, uma ONG britânica cujo objetivo é aumentar a consciência sobre esta questão no ambiente de trabalho, define como uma rotina social hostil ou calúnia psicológica, através da qual as pessoas passam a culpa ou responsabilidade adiante, para um alvo ou grupo. Os efeitos são extremamente danosos, com conseqüências de longo-prazo para a vítima. Recentemente, dei orientação executiva a um gerente sênior que nunca mais se recuperou por ter sido um dia bode expiatório. John, 39 anos, trabalhou para uma empresa quando tinha algo em torno de 20 anos de idade e tudo ia bem até que ele foi usado como bode expiatório por um novo chefe. De

Funcionários da Domino´s Pizza postam vídeo no You Tube e são processados

Dois funcionários irresponsáveis imaginam um vídeo “muito engraçado” usando alimentos e toda sorte de escatologia. O cenário é uma cozinha da pizzaria Domino´s. Pronto, está feito o vídeo que mais chamou a atenção da mídia americana na semana passada. Nele, os dois funcionários se divertem enquanto um espirra na comida, entre outras amostras de higiene pessoal. Tudo isso foi postado no you tube no que eles consideraram “uma grande brincadeira”. O vídeo em questão, agora removido do site, foi visto por mais de 930 mil pessoas em apenas dois dias. (o vídeo já foi removido, mas pode ser conferido em trechos nesta reportagem: http://www.youtube.com/watch?v=eYmFQjszaec ) Mas para os consumidores da rede, é uma grande(síssima) falta de respeito. Restou ao presidente a tarefa de “limpar” a bagunça (e a barra da empresa). Há poucos dias, Patrick Doyle, CEO nos EUA, veio a público e respondeu na mesma moeda. No vídeo de dois minutos no You Tube, Doyle ( http://www.youtube.com/watch?v=7l6AJ49xNS