Transcrevo aqui a íntegra do artigo escrito por Alvin Toffler e publicado na Revista Época Negócios. Jornalista, escritor e futurólogo norte-americano, Alvin Toffler é autor de best-sellers como O Choque do Futuro e A Terceira Onda. Sua obra mais recente, Riqueza Revolucionária, está sendo lançada neste mês no Brasil pela Editora Futura. Vale a pena conferir as idéias deste renomado autor.
"O conhecimento sempre foi um fator importante para a criação da riqueza. Mas em nenhum sistema de riqueza anterior o setor de conhecimento representava um papel tão destacado quanto no atual. Hoje assistimos a um crescimento explosivo na quantidade, variedade e complexidade do conhecimento necessário para planejar, produzir e entregar valores em cada mercado. O mercado para dados, informações e conhecimento em si cresce exponencialmente.
Os consumidores devoram quantidades intermináveis de informação, desinformação e informação errada, sobre qualquer assunto concebível, desde negócios e finanças até notícias, entretenimento, saúde, religião, sexo e esportes. As empresas utilizam fluxos de dados constantes sobre seus clientes, concorrentes e fornecedores. Os cientistas e pesquisadores reúnem descobertas e fórmulas do mundo inteiro. Ainda assim, devemos reconhecer que o conhecimento sempre foi algo difícil de definir. Entre outras coisas, ele inclui não apenas textos impressos ou dados fornecidos pelo computador, mas segredos sussurrados, imagens visuais, dicas de ações e outros elementos intangíveis. Ninguém sabe com precisão qual o tamanho do conhecimento, o que suscita muitas controvérsias sobre o que ele inclui ou exclui. No entanto, nunca tanto dinheiro passou de mão em mão em troca de maior acesso ao conhecimento, dados e informações - ou informações obsoletas (obsolescimento).
Na realidade, o mercado de conhecimento não está apenas se expandindo, mas se transmutando mais uma vez em função das mudanças ocorridas nos fundamentos profundos do sistema de riqueza. Nunca a coleção, organização e disseminação de tudo, desde os dados mais primários até o conhecimento mais abstrato e sofisticado, moveram-se com tanta rapidez pela sociedade e pelos mercados. Isso iguala e até mesmo excede os processos aceleradores que vemos em cada setor da economia. Hoje o tempo é comprimido em nanossegundos e a disseminação do conhecimento atravessa todas as fronteiras.
Hoje os dados ficam obsoletos ainda antes de virem ao mundo e sua oferta não pára de crescer
Ainda mais importantes são as mudanças em nosso "conhecimento sobre o conhecimento e como o conhecimento é organizado", com as divisões disciplinares de outrora se dissolvendo diante de nossos olhos. Nos sistemas de riqueza anteriores, o acesso ao conhecimento economicamente valioso era muito limitado. Hoje, porém, boa parte dele é veiculada em centenas de milhões de telas de TV e monitores de vídeo dispostos em empresas e lares espalhados por quase todos os lugares do mundo, de Nova York a Mumbai. Nas economias industriais, os trabalhadores e administradores precisavam reunir conhecimento não local de um número maior de fontes e sobre muito mais coisas. Contudo, o conhecimento economicamente valioso - sobre, digamos, os avanços em metalurgia - precisavam de poucas atualizações. Hoje, em contraste, boa parte do conhecimento se torna obsoleta mesmo antes de ser apresentada ao mundo. O leque de assuntos disponíveis aumenta constantemente. As fontes de informação multiplicam-se à velocidade da luz e podem se originar em qualquer parte do mundo. O que estamos observando, então, são mudanças interativas que transformam não apenas os relacionamentos entre produtos, mas entre setores inteiros do mercado. Ainda assim, o impacto cumulativo de todas essas transformações tem seu significado de longo prazo amortecido pelo surgimento de um mercado completamente novo e até então impossível.
Quase todo setor tradicional do mercado - seja associado a terra, trabalho, capital, produtos, serviços, experiências, seja a conhecimento - agora possui um gêmeo virtual. Na verdade, o grande cibermercado global adiciona uma segunda camada sobre cada mercado convencional. E isso é algo totalmente inusitado para nós.
>>> Intangível - Os aspectos intangíveis que associamos às propriedades tangíveis estão se multiplicando rapidamente. A propriedade na economia atual já é surpreendentemente menos palpável do que as pessoas imaginam. Um estudo da Brookings Institution descobriu que, já em 1982, os bens intangíveis de mineradoras e indústrias manufatureiras representavam 38% do valor total de mercado das empresas. Dez anos depois - mas ainda muito antes da ascensão e queda das empresas pontocom - o componente intangível representava 62% - ou quase dois terços do valor real. A principal razão para essa marcha acelerada rumo à intangibilidade das coisas é a mudança em nosso relacionamento com o fundamento profundo do tempo. À medida que o ciclo de vida dos produtos fica cada vez mais curto, a obsolescência técnica aumenta e torna os mercados mais temporários. Portanto, a velocidade com que as coisas acontecem hoje obriga as companhias a inovarem sempre.
Quase todo setor em que se pense possui um gêmeo virtual, uma segunda camada no mercado
Como diz Baruch Lev, autor de Intangíveis: "A vida e a morte das empresas são uma nova base para inovação", o que implica "grande crescimento dos aspectos intangíveis". Mais ainda, a inovação é contagiosa. As empresas que lideram essa corrida pela inovação forçam as outras a se manter atualizadas. Mesmo firmas pequenas são compelidas pelos clientes a adotar e desenvolver sistemas de TI, comunicar-se por e-mail, entrar na internet, realizar transações bancárias eletrônicas e fazer mais pesquisa. A regra geral é: "intangibilize-se ou morra".
Em todas as economias avançadas, segundo o economista de Stanford Robert E. Hall, "a produção de bens... cada dia mais... representa uma parcela menor dos gastos e despesas". Em contrapartida, "os serviços representam uma parcela cada vez maior dessas despesas". Isso retrata claramente setores de alta intangibilidade, como saúde e educação, mídia, entretenimento e serviços financeiros.
À medida que a base da propriedade se torna intangível e, portanto,mais inesgotável, uma parte cada vez maior disso se torna não-rival. Como já vimos, os produtos do conhecimento podem ser explorados por milhões de pessoas, ao mesmo tempo, sem que isso deprecie ou diminua seu valor. Um bom exemplo é o que acontece com as músicas oferecidas para download gratuito - embora muitas pessoas escutem e salvem melodias em seus computadores e iPods, elas não consomem nem diminuem o valor das notas musicais ao fazê-lo.
Essa mudança também tem implicações que podem abalar muitos sistemas. Indústrias inteiras estão à beira da morte e precisam enfrentar as novas tecnologias que ameaçam pôr fim às proteções tradicionais da propriedade intelectual - por exemplo, direitos autorais, patentes e marcas registradas -, na qual apóiam sua própria existência. Exércitos de advogados e lobistas tentam resolver a questão e agitam-se em um ambiente revolucionário. "O advogados não fazem outra coisa a não ser tentar prolongar o uso dos velhos modelos", diz Eugene Volokh, da Universidade da Califórnia. "Uma coisa, porém, está clara... Seja qual for o desfecho da batalha, a propriedade sairá mais, e não menos intangível - e isso significa que será muito mais difícil protegê-la."
Quer estejamos lidando bem ou mal com os elementos intangíveis, quer os protejamos ou não, nunca antes houve algo parecido na história do capitalismo. E nada desafia tão profundamente o conceito de propriedade. No entanto, a mudança que nos leva rumo à intangibilidade revolucionária é apenas o primeiro passo da "reforma radical" do capitalismo. Uma reforma à qual pode não sobreviver".
Fonte: Por Alvin Toffler, in epocanegocios.globo.com
"O conhecimento sempre foi um fator importante para a criação da riqueza. Mas em nenhum sistema de riqueza anterior o setor de conhecimento representava um papel tão destacado quanto no atual. Hoje assistimos a um crescimento explosivo na quantidade, variedade e complexidade do conhecimento necessário para planejar, produzir e entregar valores em cada mercado. O mercado para dados, informações e conhecimento em si cresce exponencialmente.
Os consumidores devoram quantidades intermináveis de informação, desinformação e informação errada, sobre qualquer assunto concebível, desde negócios e finanças até notícias, entretenimento, saúde, religião, sexo e esportes. As empresas utilizam fluxos de dados constantes sobre seus clientes, concorrentes e fornecedores. Os cientistas e pesquisadores reúnem descobertas e fórmulas do mundo inteiro. Ainda assim, devemos reconhecer que o conhecimento sempre foi algo difícil de definir. Entre outras coisas, ele inclui não apenas textos impressos ou dados fornecidos pelo computador, mas segredos sussurrados, imagens visuais, dicas de ações e outros elementos intangíveis. Ninguém sabe com precisão qual o tamanho do conhecimento, o que suscita muitas controvérsias sobre o que ele inclui ou exclui. No entanto, nunca tanto dinheiro passou de mão em mão em troca de maior acesso ao conhecimento, dados e informações - ou informações obsoletas (obsolescimento).
Na realidade, o mercado de conhecimento não está apenas se expandindo, mas se transmutando mais uma vez em função das mudanças ocorridas nos fundamentos profundos do sistema de riqueza. Nunca a coleção, organização e disseminação de tudo, desde os dados mais primários até o conhecimento mais abstrato e sofisticado, moveram-se com tanta rapidez pela sociedade e pelos mercados. Isso iguala e até mesmo excede os processos aceleradores que vemos em cada setor da economia. Hoje o tempo é comprimido em nanossegundos e a disseminação do conhecimento atravessa todas as fronteiras.
Hoje os dados ficam obsoletos ainda antes de virem ao mundo e sua oferta não pára de crescer
Ainda mais importantes são as mudanças em nosso "conhecimento sobre o conhecimento e como o conhecimento é organizado", com as divisões disciplinares de outrora se dissolvendo diante de nossos olhos. Nos sistemas de riqueza anteriores, o acesso ao conhecimento economicamente valioso era muito limitado. Hoje, porém, boa parte dele é veiculada em centenas de milhões de telas de TV e monitores de vídeo dispostos em empresas e lares espalhados por quase todos os lugares do mundo, de Nova York a Mumbai. Nas economias industriais, os trabalhadores e administradores precisavam reunir conhecimento não local de um número maior de fontes e sobre muito mais coisas. Contudo, o conhecimento economicamente valioso - sobre, digamos, os avanços em metalurgia - precisavam de poucas atualizações. Hoje, em contraste, boa parte do conhecimento se torna obsoleta mesmo antes de ser apresentada ao mundo. O leque de assuntos disponíveis aumenta constantemente. As fontes de informação multiplicam-se à velocidade da luz e podem se originar em qualquer parte do mundo. O que estamos observando, então, são mudanças interativas que transformam não apenas os relacionamentos entre produtos, mas entre setores inteiros do mercado. Ainda assim, o impacto cumulativo de todas essas transformações tem seu significado de longo prazo amortecido pelo surgimento de um mercado completamente novo e até então impossível.
Quase todo setor tradicional do mercado - seja associado a terra, trabalho, capital, produtos, serviços, experiências, seja a conhecimento - agora possui um gêmeo virtual. Na verdade, o grande cibermercado global adiciona uma segunda camada sobre cada mercado convencional. E isso é algo totalmente inusitado para nós.
>>> Intangível - Os aspectos intangíveis que associamos às propriedades tangíveis estão se multiplicando rapidamente. A propriedade na economia atual já é surpreendentemente menos palpável do que as pessoas imaginam. Um estudo da Brookings Institution descobriu que, já em 1982, os bens intangíveis de mineradoras e indústrias manufatureiras representavam 38% do valor total de mercado das empresas. Dez anos depois - mas ainda muito antes da ascensão e queda das empresas pontocom - o componente intangível representava 62% - ou quase dois terços do valor real. A principal razão para essa marcha acelerada rumo à intangibilidade das coisas é a mudança em nosso relacionamento com o fundamento profundo do tempo. À medida que o ciclo de vida dos produtos fica cada vez mais curto, a obsolescência técnica aumenta e torna os mercados mais temporários. Portanto, a velocidade com que as coisas acontecem hoje obriga as companhias a inovarem sempre.
Quase todo setor em que se pense possui um gêmeo virtual, uma segunda camada no mercado
Como diz Baruch Lev, autor de Intangíveis: "A vida e a morte das empresas são uma nova base para inovação", o que implica "grande crescimento dos aspectos intangíveis". Mais ainda, a inovação é contagiosa. As empresas que lideram essa corrida pela inovação forçam as outras a se manter atualizadas. Mesmo firmas pequenas são compelidas pelos clientes a adotar e desenvolver sistemas de TI, comunicar-se por e-mail, entrar na internet, realizar transações bancárias eletrônicas e fazer mais pesquisa. A regra geral é: "intangibilize-se ou morra".
Em todas as economias avançadas, segundo o economista de Stanford Robert E. Hall, "a produção de bens... cada dia mais... representa uma parcela menor dos gastos e despesas". Em contrapartida, "os serviços representam uma parcela cada vez maior dessas despesas". Isso retrata claramente setores de alta intangibilidade, como saúde e educação, mídia, entretenimento e serviços financeiros.
À medida que a base da propriedade se torna intangível e, portanto,mais inesgotável, uma parte cada vez maior disso se torna não-rival. Como já vimos, os produtos do conhecimento podem ser explorados por milhões de pessoas, ao mesmo tempo, sem que isso deprecie ou diminua seu valor. Um bom exemplo é o que acontece com as músicas oferecidas para download gratuito - embora muitas pessoas escutem e salvem melodias em seus computadores e iPods, elas não consomem nem diminuem o valor das notas musicais ao fazê-lo.
Essa mudança também tem implicações que podem abalar muitos sistemas. Indústrias inteiras estão à beira da morte e precisam enfrentar as novas tecnologias que ameaçam pôr fim às proteções tradicionais da propriedade intelectual - por exemplo, direitos autorais, patentes e marcas registradas -, na qual apóiam sua própria existência. Exércitos de advogados e lobistas tentam resolver a questão e agitam-se em um ambiente revolucionário. "O advogados não fazem outra coisa a não ser tentar prolongar o uso dos velhos modelos", diz Eugene Volokh, da Universidade da Califórnia. "Uma coisa, porém, está clara... Seja qual for o desfecho da batalha, a propriedade sairá mais, e não menos intangível - e isso significa que será muito mais difícil protegê-la."
Quer estejamos lidando bem ou mal com os elementos intangíveis, quer os protejamos ou não, nunca antes houve algo parecido na história do capitalismo. E nada desafia tão profundamente o conceito de propriedade. No entanto, a mudança que nos leva rumo à intangibilidade revolucionária é apenas o primeiro passo da "reforma radical" do capitalismo. Uma reforma à qual pode não sobreviver".
Fonte: Por Alvin Toffler, in epocanegocios.globo.com
Comentários