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Grau de desenvolvimento determina perfil das ações de Responsabilidade Social

Nas economias emergentes, a RSE é muitas vezes encarada de uma forma protocolar. Se o termo Responsabilidade Social Empresarial (RSE) existisse no dicionário, certamente não teria o mesmo significado em todo o mundo. A base para tal afirmação é o relatório "The State of Responsible Competitiveness 2007" (algo como A situação da Competitividade Responsável), da consultoria AccountAbility, que identificou e classificou 108 países em quatro níveis da cultura sustentável no meio corporativo. Uma das conclusões é que o desenvolvimento econômico e da RSE caminham, na maioria das vezes, de mãos dadas.

Os depoimentos de executivos e líderes de nações diversas em termos políticos, sociais e econômicos são uma prova de que, enquanto a responsabilidade social ainda é sinônimo de filantropia nos países mais pobres, nos emergentes é encarada muitas vezes de forma protocolar. Enquanto isso, as economias mais ricas levam a RSE a um nível superior a partir da adoção da sustentabilidade como base dos negócios.
Para Aron Cramer, presidente da Business for Social Responsability (BSR), especialista atuante nos Estados Unidos, França e China, existem três tendências bem definidas nas empresas com as quais trabalha, que são consideradas, do ponto de vista da responsabilidade social, mais desenvolvidas. A primeira é a crescente preocupação em não apenas cumprir uma lista de pré-requisitos de RSE, o que poderia ser considerado um modelo primário, mas de promover análises para determinar as questões de sustentabilidade mais relevantes para seus negócios.

Como segunda tendência, as companhias têm procurado mensurar resultados, demonstrando uma preocupação com a compensação efetiva de seus impactos na comunidade e no meio ambiente próximo. Por último, verifica-se uma importante valorização do conceito de transparência, reforçada pelo relacionamento intenso com os acionistas e pela crescente publicação de relatórios de sustentabilidade. "O que mais surpreende é que, apesar das diferenças significativas entre as empresas desses três países, elas estão se dedicando ao mesmo conjunto de questões. Isso não existia cinco anos atrás", ressalta Cramer.

Ainda distantes de alcançar os padrões americanos e europeus, porém um pouco à frente das nações mais pobres, os países emergentes encontram-se em uma fase de transição, assim como sua situação socioeconômica. Enquanto ainda lidam com problemas como miséria e mudança de valores, surpreendem o mundo com números econômicos cada vez mais competitivos.

Para George Mathew, diretor do Institute of Social Sciences em Nova Délhi, a RSE na Índia se encontra em um estágio semelhante ao do Brasil, no qual a maioria das empresas, além de compreender seu novo papel, já adotou o conceito no negócio transformando-o em algo mais do que uma simples ferramenta de promoção corporativa. "Cada vez mais organizações têm percebido que se trata de um investimento com múltiplos benefícios", observa Mathew. Contudo, na prática as empresas indianas, mesmo sensíveis ao tema, têm seu esforço de responsabilidade social muitas vezes ofuscado pelos graves e diversos problemas sociais que o país enfrenta. A Índia convive tanto com questões similares às de países mais pobres da África quanto com as de países desenvolvidos. Segundo Mathew, apesar do avanço em alguns setores empresariais, ainda é comum no ppaís uma certa confusão do conceito com a filantropia - típica dos países mais pobres - e a resistência das corporações em relatar suas políticas de responsabilidade social, o que atesta que ainda não foram incorporadas à base do negócio.

A despeito do atual quadro na Índia, Mathew vê com otimismo o futuro da RSE nas empresas de países emergentes. Em sua opinião, o envolvimento com o tema deve ser cada vez maior. "As tendências mostram que as empresas estão inclinadas a promover, no futuro, a criação de novos empregos, uma maior oferta de serviços básicos à população e reserva de empregos para minorias", afirma.

Na América Latina, que reúne tanto países com níveis bastante baixos de desenvolvimento como nações emergentes, apresenta um panorama diferente daquele da Índia. Estudo publicado recentemente pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e a empresa espanhola de pesquisa e consultoria Ikei revela que pequenas e médias empresas da região estão se comprometendo com práticas de RSE e chegam a ser, surpreendentemente, mais ativas que as do sul da Europa, incluindo a Espanha, a Itália e a França.

Segundo Alice Lariu, pesquisadora brasileira do Center for Business in Society (Iese), a preocupação dos latinos é maior com os funcionários e o ambiente de trabalho do que, por exemplo, com iniciativas em defesa de meio ambiente. "As motivações dos empresários tendem a ser de caráter ético ou moral, ou, ainda, relacionadas ao desejo de motivar seus empregados", destaca.

Para Alice, muitas empresas brasileiras reconhecem, valorizam e disseminam a RSE. Mas, aqui, a implantação de práticas na gestão do negócio "encontra-se em estágios muito distintos dependendo da região de origem". A solução para uma expansão mais homogênea, segundo ela, seria ampliar o debate sobre a sua importância, mobili-zando não apenas empresas, mas também governos e organizações da sociedade civil.

A ex-colaboradora do BID avalia que o alto interesse dos latinos pela RSE é resultado da ampla divulgação do tema na mídia e em eventos cada vez mais freqüentes do mundo corporativo. No entanto, as mesmas variáveis que paralisam o crescimento econômico e afetam o desenvolvimento de setores público e privado fortes - falta de capacidade institucional dos governos, uma governança corporativa débil e um clima de negócios não favorável - dificultam o fortalecimento da RSE na região. A situação atual é, segundo Alice, de um visível contraste. De um lado, ela observa enorme potencial e claro desejo de impulsionar o tema, projetando-o na forma de oportunidades para os negócios. Por outro, ainda há resistência em assimilá-lo como um instrumento para o aumento da competitividade.

Filantropia na África
Se os países pobres são, de acordo com o relatório da AccountAbility, ainda retardatários na corrida da responsabilidade social empresarial, as nações africanas ocupam o fim da fila em matéria de noções e práticas de sustentabilidade corporativa. Para Daisy Kambalame, especialista em responsabilidade social e coordenadora do Global Compact no Malaui, o ainda baixo desempenho em RSE está relacionado à fragilidade da economia nacional. "Os recursos são limitados para a implementação de programas. Além disso, falta capacidade para entender as questões-chave da responsabilidade social", observa.

Daisy concluiu, em um recente relatório denominado "Corporate Social Responsibility in Malawi", que ainda está em fase de aprovação, que em sua luta pela sobrevivência, os indivíduos de seu país "não conseguem fazer as escolhas críticas e as trocas certas entre recurso sustentável e o uso imediato daquilo que precisam em curto prazo. Isso leva a uma crescente pressão sobre os recursos naturais, contribuindo para a degradação do solo, o desflorestamento e a poluição das águas".

O diagnóstico de Daisy reflete, segundo a própria especialista, realidade de carências de todo o continente africano. As dificuldades no debate ainda são as mais básicas, como a aproximação do conceito com a filantropia ou com as relações públicas (marketing corporativo). "A maioria das organizações ainda acha que ser socialmente responsável é doar cobertores, computadores, poços, dinheiro direto ou indireto ou mesmo apoiar a comunidade em projetos como a construção de mercados e quarteirões de escolas", explica.

Por outro lado, Daisy acha que existe a crença entre as empresas de que a sustentabilidade pode ser uma boa ferramenta para o desenvolvimento nacional. "Isso é positivo. E pode vir a mudar a estrutura social e econômica do Malaui com reais benefícios para a população, levando a uma economia mais sustentável", analisa.
Nadar contra a corrente é uma das principais dificuldades para países pobres como o Malaui, já que, ao mesmo tempo, devem focar-se no combate à miséria e outras questões de base e na luta contra a resistência na mudança dos princípios e formas de se fazer negócios. O movimento avança menos do que seria desejável porque, segundo a especialista, ainda não se observa entusiasmo suficiente para superar as variáveis de um quadro complexo e implantar uma cultura de RSE.

Temas como o trabalho infantil e a AIDS estão sob os holofotes das empresas africanas, mas mesmo assim, Daisy afirma que não são vistos sob a ótica da responsabilidade social, mas a partir de uma lógica assistencialista. Recentemente, o "fair trade", ou comércio justo, passou a integrar a pauta de RSE das corporações, o que a especialista considera compreensível, considerando que a maioria dos países africanos ainda tem sua economia baseada na agricultura.



Fonte: Por Carmen Guerreiro, in Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 14

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