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Relações Públicas Governamentais: ação para a cidadania

Transcrevo aqui a íntegra do artigo "Relações Públicas Governamentais: ação para a cidadania", de autoria da relações públicas Ana Lúcia Novelli, secretaria-geral do Sistema CONFERP e Doutora em Ciências da Comunicação pela Escola de Comunicações e Artes da USP. Na visão da autora, as relações públicas governamentais, com todo o seu instrumental, é um dos mais importantes aliados para a construção da cidadania brasileira. Vale a pena conferir.


"Em sua essência, o "governo do povo, pelo povo e para o povo", definição clássica do modelo democrático, pressupõe uma série de ações comunicativas para sua completa realização. Como pensar num governo democrático que não se preocupa em buscar alguma forma de interação com a sociedade ou fomentar propostas de diálogo? Qual político tem a coragem de assumir publicamente que não quer saber do povo? Qual a função de uma repartição pública que não serve a população?

Tais travas democráticas que as sociedades se impoem, mesmo as ainda em processo de consolidação, são garantias formais para a população se proteger daqueles que pretendem usurpar o poder e usá-lo apenas a favor de seus interesses pessoais. E os que pensam que, no Brasil, o povo não tem nenhum poder e está à mercê da própria sorte entregue a políticos corruptos, estão míopes da realidade política nacional. É claro, estamos longe de um modelo ideal de democracia e cidadania, no entanto vivenciamos exemplos concretos nos últimos anos que provocaram a substituição de políticos eleitos envolvidos em casos de corrupção e demonstraram o poder da opinião pública: Ex-presidente Fernando Collor de Melo, Ex-prefeito de São Paulo Celso Pitta, Ex-presidente do Senado Federal Jader Barbalho etc.

Isto porque, mesmo com nossa fragilidade institucional e boa parte da população abaixo da linha de pobreza, faz parte da lógica democrática o caráter ambivalente da população. O povo, aquele mesmo da definição clássica de democracia, é constituído em sua complexidade por uma faceta passiva e uma ativa, que são complementares e inseparáveis - ao mesmo tempo a população é a usuária dos serviços públicos, eleitora de seus dirigentes e contribuinte de seu orçamento. Estes elementos caracterizam a população como receptores e emissores do processo político e do processo de comunicação que vai se estabelecer entre governo e sociedade. Uma das formas de mediar esta relação são as relações públicas governamentais.

Despojada de sua concepção mercadológica, as relações públicas quando praticada nas esferas de governo - executivo, legislativo ou judiciário - em seus vários níveis - federal, estadual ou municipal - caracteriza-se pela disponibilização de meios, recursos e canais que possibilitem a comunicação entre sociedade e governo. O posicionamento estratégico da área tem como vetor a obtenção de quatro objetivos principais:

- Promover a adequada compreensão pública a respeito das funções das esferas governamentais;
- Fornecer informações contínuas sobre as atividades da administração pública;
- Estabelecer canais de comunicação que ofereçam ao cidadão a possibilidade de influir na política e ação do governo;
- Estabelecer canais de comunicação pelos quais o cidadão possa ser alcançado pelos representantes da administração pública.

Estas diretrizes, já assinaladas na década de 60, ultrapassam sua temporalidade e tornam-se, ainda hoje, atuais enquanto propostas de ação para os programas de comunicação governamental. Neste sentido, as ações de relações públicas voltadas para o esclarecimento das atribuições e funções de cada esfera do governo, baseiam-se no reconhecido desconhecimento que a população tem do que é pertinente e de competência das várias instâncias governamentais.

Em última análise, por exemplo, seria possível que a população reconhecesse a má fé de um candidato a deputado que prometesse em sua campanha eleitoral a construção de uma ponte no município, pois esta não é uma ação que compete à esfera legislativa para a qual ele está se candidatando, e sim uma ação do campo executivo.

O objetivo de estabelecer um fluxo de informações contínuas sobre as atividades da administração como proposta estratégica para às relações públicas implicitamente abrange duas dimensões que precisam ser exploradas. A comunicação entre governo e sociedade não deve ser inconstante ou sofrer interrupções, para ser eficiente ela deve ser regular e constante a fim de transmitir segurança a população de que a informação, sempre que for preciso, será transmitida, possibilitando a transparência e publicização das ações de governo.

A dinâmica da sociedade contemporânea, extremamente ágil e volátil, exige que o governo tome muitas decisões importantes que interferem na vida cotidiana dos cidadãos, tornando-se indispensável o fluxo constante de informações para manter o contrato social entre cidadão e governo sempre atualizado.

Já as ações de relações públicas governamentais quando empenhadas em estabelecer canais de comunicação ascendentes, capazes de garantir a expressão da opinião da sociedade, ou melhor, da opinião pública, aos seus governantes busca apoio no conceito de participação. O estímulo à participação da sociedade, que deve ser entendida de uma maneira mais ampla do que o ato de comparecimento às urnas de votações, é o resultado prático dos esforços empreendidos no sentido de "dar voz e oportunidade" para que a população possa se expressar. É nesta esfera pública criada a partir da comunicação do governo com a sociedade que são negociados os assuntos e as controvérsias públicas.

Para finalizar, o objetivo de estabelecer canais de comunicação pelos quais o cidadão possa ser alcançado pelos representantes da administração pública, dentre as ações de relações públicas governamentais, visa a sistematização constante de busca de informações, principalmente por meio de pesquisas de opinião. Os resultados das pesquisas realizadas pelos governos podem servir de parâmetro para identificar o grau de conhecimento da população sobre o próprio governo e como ele é percebido pela sociedade. As pesquisas podem, portanto, serem usadas para assessorar a administração pública sobre as reações do público com relação às políticas e em como essas políticas podem ser alteradas para servir melhor o interesse público.

Estes parâmetros de desenvolvimento da ação de relações públicas governamentais vão de encontro ao que o pesquisador norte-americano, James Grunig chama de comunicação simétrica de duas vias, cujo objetivo é a compreensão e o entendimento mútuo entre os públicos e a organização. Ao praticar este modelo de relações públicas no âmbito governamental, busca-se a obtenção de um diálogo e não um monólogo com a sociedade. Se a persuasão ocorre, ela é mútua: a sociedade deve provavelmente persuadir a administração pública a mudar atitudes ou comportamentos, e por seu lado a administração pública deve estimular também a mudança de atitude por parte da população. Em tese, tanto a administração pública como os públicos mudarão algo depois deste tipo de trabalho.

Para a sociedade de modo geral, o efeito das ações de relações públicas governamentais, quando dirigidas ao estabelecimento de canais de comunicação de mão dupla com fluxo contínuo de informação, impacta diretamente na formação da cidadania do povo. Este conceito, difuso, incerto e cruelmente inatingível para alguns, parte do pressuposto de que o cidadão pleno é aquele que tem acesso aos direitos civis, políticos e sociais disponíveis em nossa sociedade, Com seu instrumental, as relações públicas governamentais é um dos mais importantes aliados para a construção da cidadania brasileira".


Fonte: Por Ana Lúcia Novelli, in www.conferp.org.br

Comentários

Olá Fábio!!
Esse texto fala exatamente da nossa realidade vivida atualmente no âmbito da esfera pública. É notório que os pilares que sustentam as RPGs, isto é, governo, Estado e cidadãos, como diz no texto, estão instigando mudanças comportamentais uns nos outros, e com isso, exergando com outros olhos o poder da comunicação entre esses três elementos.

Obrigado pelo texto!
Abço e continue firme e forte!

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