Houve um tempo em que a expressão "visão holística" torcia o nariz dos líderes acostumados aos métodos cartesianos em suas tomadas de decisão. Era um conceito que soava ingênuo, pouco científico e até nada pragmático. Talvez porque, com o tempo, as empresas descobriram que, além de serem em si um sistema complexo, também integram um outro sistema, mais amplo e não limitado aos seus muros, a visão holística ou "sistêmica" ganhou status nas corporações.
Já não se admite, nesses tempos de culto à noção de interdependência, que os líderes tomem decisões desvinculadas de uma análise maior dos interesses dos acionistas, do meio ambiente e da sociedade. "O líder em sustentabilidade consegue analisar riscos e oportunidades sob vários pontos de vista. Não enxerga só o que pensa e quer a empresa. Sabe que tudo o que está em volta dela é afetado por sua ação. Ao contrário do líder não sustentável, cuja visão é míope, observa o todo, o que é a empresa, onde está instalada, quem afeta e quem a afeta", diz Flávia de Moraes, gerente geral de sustentabilidade da Philips para a América Latina e Caribe. Segundo ela, esse líder precisa ter fé no futuro, construir redes de relacionamento e acreditar na possibilidade de um novo modelo de fazer negócios.
Para Flávia, a inserção das mais diferentes ações de sustentabilidade na cultura organizacional da Philips tem ajudado a descobrir novos líderes entre funcionários que antes nunca haviam se destacado. "Pessoas que se engajaram em projetos começaram a florescer. Isso acontece porque passaram a conjugar a sua filosofia pessoal com a filosofia da empresa, o que proporciona um desabrochar inesperado de habilidades. A sustentabilidade agrega e valoriza outras competências", conta.
Maria Luiza Pinto, diretora executiva de desenvolvimento sustentável, viveu experiência semelhante no ABN Amro Real. Desde que o banco passou a discutir a sustentabilidade, há sete anos, profissionais antes apagados emergiram como lideranças. Não apenas nos níveis mais altos de executivos, mas também nos intermediários. "A competência básica desses novos líderes é o pensamento sistêmico, a capacidade de reconhecer, identificar e valorizar a interdependência. Destacaram-se por pensar de forma inovadora e por não ter medo de trabalhar com a incerteza, em virtude de valores e propósitos muito fortes. Eles foram rápidos em identificar oportunidades e competentes em dar o recado e mobilizar as pessoas", diz.
Segundo a diretora, os novos líderes não são os ativistas que, no início do processo, foram importantes para chamar a atenção sobre o tema. São sim profissionais com alto grau de maturidade, conscientes e apaixonados, que coordenam pequenas revoluções internas sob uma ótica de negócios e que encontraram na cultura de sustentabilidade um terreno fértil para projetar suas crenças e valores pessoais. Para Maria Luiza, a cultura é um fator fundamental. Criá-la pressupõe educação, desenvolvimento e mudança sistêmica.
"A questão da sustentabilidade perpassa, de modo transversal, todo tipo de treinamento do banco. De nada adianta estabelecer um política sustentável para contratação, fornecedores ou produtos, se os funcionários não mudarem o seu patamar de consciência. Para fazer a transformação necessária, é preciso olhar para os colaboradores como cidadãos que, além de trabalharem no banco, desempenham vários outros papéis. Eles são parte do problema e também da solução maior", argumenta.
Oportunidades novas
Para Alex Mansur Mattos, gerente executivo de responsabilidade social empresarial do Sesi Nacional, o líder sustentável deve estar atento às inovações que a sociedade tem cobrado das empresas no que se refere aos aspectos éticos, da diversidade, da transparência, da governança corporativa e do melhor aproveitamos dos recursos naturais. "A pauta da sustentabilidade entrou definitivamente na gestão das empresas. E ela passou a cobrar das lideranças cuidados com os impactos sociais e ambientais. É possível obter resultados mais imediatos, mas a perenidade de uma companhia depende hoje do modo como seus líderes valorizam as grandes questões da responsabilidade social empresarial", defende.
Todo líder socioambientalmente responsável precisa ser um pouco antropólogo para entender como funciona o mundo em que está vivendo. Essa é a opinião de Marcelo Takaoka, diretor da Y. Takaoka Empreendimentos. Embora considere "muito novo" o movimento em torno da sustentabilidade nos negócios, o empresário vê cada vez mais jovens profissionais conscientes para a importância do tema. "Essa nova visão abre muitas portas de oportunidade. Cada líder precisa descobrir a sua fazendo uma análise de como o negócio que dirige pode gerar benefícios para o meio ambiente e a sociedade. E para isso, ele deve cruzar seus conhecimentos com os de ONGs, por exemplo, Aqui, na empresa, descobrimos possibilidades inteiramente novas para a construção civil formando uma ponte com o mundo dos ambientalistas", afirma.
Para Jason Clay, presidente do WWF, o líder em sustentabilidade deve ter a coragem de "fazer algo cujo caminho não tem a mínima idéia do que seja, mas que precisa dar certo para o bem da empresa e de toda a sociedade". Em sua avaliação, há ótimos exemplos de lideranças que "transformaram crises em soluções". "Sempre que penso nisso me ocorre o caso de um líder da fábrica da L’Oreal nos Estados Unidos. Certa vez, a empresa teve um problema com abastecimento na cidade em que estava atuando e foi, por essa razão, forçada a mudar o seu plano de processamento de água. O líder estava convencido que de que deveria haver um modo melhor de produzir. E descobriu, com o apoio dos funcionários, um jeito de fazer o produto sem água. O uso de água foi reduzido no ano seguinte em espantosos 95%", conta ele.
Segundo Clay, a principal barreira às mudanças, e portanto o maior entrave ao trabalho dos líderes, está nas gerências intermediárias das corporações. Como são eles que cuidam de boa parte dos processos operacionais, resistem muito à idéia de mudar os modos de produzir. "Nada adianta ter diretores e presidentes visionários, líderes que empurram os processos, se os gestores não estiverem dispostos a aderir", enfatiza. Os gestores, por sua vez, quase sempre sabem como melhorar os processos, mas não têm o poder para mudar.
No caso da L’Oreal, destaca, o presidente deu poder a todos na empresa para identificar modos de economizar água, deu-lhes a oportunidade de sugerir, aceitou erros na busca pela melhor solução. E assim cumpriu um dos papéis que, na avaliação de Clay, define um bom líder em sustentabilidade. E como se forma esse novo líder sustentável? Simon Zadek, presidente da AccountAbility, instituição não governamental, tem uma opinião muito peculiar a respeito do assunto: "Pode ser nas artes, na economia e até mesmo na contabilidade. Em qualquer área onde o indivíduo não seja submetido a uma lavagem cerebral que o leve a achar que as coisas que estão aí não podem mudar".
Fonte: Por Ricardo Voltolini, in Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 12
Já não se admite, nesses tempos de culto à noção de interdependência, que os líderes tomem decisões desvinculadas de uma análise maior dos interesses dos acionistas, do meio ambiente e da sociedade. "O líder em sustentabilidade consegue analisar riscos e oportunidades sob vários pontos de vista. Não enxerga só o que pensa e quer a empresa. Sabe que tudo o que está em volta dela é afetado por sua ação. Ao contrário do líder não sustentável, cuja visão é míope, observa o todo, o que é a empresa, onde está instalada, quem afeta e quem a afeta", diz Flávia de Moraes, gerente geral de sustentabilidade da Philips para a América Latina e Caribe. Segundo ela, esse líder precisa ter fé no futuro, construir redes de relacionamento e acreditar na possibilidade de um novo modelo de fazer negócios.
Para Flávia, a inserção das mais diferentes ações de sustentabilidade na cultura organizacional da Philips tem ajudado a descobrir novos líderes entre funcionários que antes nunca haviam se destacado. "Pessoas que se engajaram em projetos começaram a florescer. Isso acontece porque passaram a conjugar a sua filosofia pessoal com a filosofia da empresa, o que proporciona um desabrochar inesperado de habilidades. A sustentabilidade agrega e valoriza outras competências", conta.
Maria Luiza Pinto, diretora executiva de desenvolvimento sustentável, viveu experiência semelhante no ABN Amro Real. Desde que o banco passou a discutir a sustentabilidade, há sete anos, profissionais antes apagados emergiram como lideranças. Não apenas nos níveis mais altos de executivos, mas também nos intermediários. "A competência básica desses novos líderes é o pensamento sistêmico, a capacidade de reconhecer, identificar e valorizar a interdependência. Destacaram-se por pensar de forma inovadora e por não ter medo de trabalhar com a incerteza, em virtude de valores e propósitos muito fortes. Eles foram rápidos em identificar oportunidades e competentes em dar o recado e mobilizar as pessoas", diz.
Segundo a diretora, os novos líderes não são os ativistas que, no início do processo, foram importantes para chamar a atenção sobre o tema. São sim profissionais com alto grau de maturidade, conscientes e apaixonados, que coordenam pequenas revoluções internas sob uma ótica de negócios e que encontraram na cultura de sustentabilidade um terreno fértil para projetar suas crenças e valores pessoais. Para Maria Luiza, a cultura é um fator fundamental. Criá-la pressupõe educação, desenvolvimento e mudança sistêmica.
"A questão da sustentabilidade perpassa, de modo transversal, todo tipo de treinamento do banco. De nada adianta estabelecer um política sustentável para contratação, fornecedores ou produtos, se os funcionários não mudarem o seu patamar de consciência. Para fazer a transformação necessária, é preciso olhar para os colaboradores como cidadãos que, além de trabalharem no banco, desempenham vários outros papéis. Eles são parte do problema e também da solução maior", argumenta.
Oportunidades novas
Para Alex Mansur Mattos, gerente executivo de responsabilidade social empresarial do Sesi Nacional, o líder sustentável deve estar atento às inovações que a sociedade tem cobrado das empresas no que se refere aos aspectos éticos, da diversidade, da transparência, da governança corporativa e do melhor aproveitamos dos recursos naturais. "A pauta da sustentabilidade entrou definitivamente na gestão das empresas. E ela passou a cobrar das lideranças cuidados com os impactos sociais e ambientais. É possível obter resultados mais imediatos, mas a perenidade de uma companhia depende hoje do modo como seus líderes valorizam as grandes questões da responsabilidade social empresarial", defende.
Todo líder socioambientalmente responsável precisa ser um pouco antropólogo para entender como funciona o mundo em que está vivendo. Essa é a opinião de Marcelo Takaoka, diretor da Y. Takaoka Empreendimentos. Embora considere "muito novo" o movimento em torno da sustentabilidade nos negócios, o empresário vê cada vez mais jovens profissionais conscientes para a importância do tema. "Essa nova visão abre muitas portas de oportunidade. Cada líder precisa descobrir a sua fazendo uma análise de como o negócio que dirige pode gerar benefícios para o meio ambiente e a sociedade. E para isso, ele deve cruzar seus conhecimentos com os de ONGs, por exemplo, Aqui, na empresa, descobrimos possibilidades inteiramente novas para a construção civil formando uma ponte com o mundo dos ambientalistas", afirma.
Para Jason Clay, presidente do WWF, o líder em sustentabilidade deve ter a coragem de "fazer algo cujo caminho não tem a mínima idéia do que seja, mas que precisa dar certo para o bem da empresa e de toda a sociedade". Em sua avaliação, há ótimos exemplos de lideranças que "transformaram crises em soluções". "Sempre que penso nisso me ocorre o caso de um líder da fábrica da L’Oreal nos Estados Unidos. Certa vez, a empresa teve um problema com abastecimento na cidade em que estava atuando e foi, por essa razão, forçada a mudar o seu plano de processamento de água. O líder estava convencido que de que deveria haver um modo melhor de produzir. E descobriu, com o apoio dos funcionários, um jeito de fazer o produto sem água. O uso de água foi reduzido no ano seguinte em espantosos 95%", conta ele.
Segundo Clay, a principal barreira às mudanças, e portanto o maior entrave ao trabalho dos líderes, está nas gerências intermediárias das corporações. Como são eles que cuidam de boa parte dos processos operacionais, resistem muito à idéia de mudar os modos de produzir. "Nada adianta ter diretores e presidentes visionários, líderes que empurram os processos, se os gestores não estiverem dispostos a aderir", enfatiza. Os gestores, por sua vez, quase sempre sabem como melhorar os processos, mas não têm o poder para mudar.
No caso da L’Oreal, destaca, o presidente deu poder a todos na empresa para identificar modos de economizar água, deu-lhes a oportunidade de sugerir, aceitou erros na busca pela melhor solução. E assim cumpriu um dos papéis que, na avaliação de Clay, define um bom líder em sustentabilidade. E como se forma esse novo líder sustentável? Simon Zadek, presidente da AccountAbility, instituição não governamental, tem uma opinião muito peculiar a respeito do assunto: "Pode ser nas artes, na economia e até mesmo na contabilidade. Em qualquer área onde o indivíduo não seja submetido a uma lavagem cerebral que o leve a achar que as coisas que estão aí não podem mudar".
Fonte: Por Ricardo Voltolini, in Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 12
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