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Sociedades Virais e Arquiteturas para o Futuro

“No mundo wireless, o controle é do usuário e não há mais produtos”, disse Andrew Lippman ao público presente ao primeiro dia do Fórum Mundial de Marketing e Vendas da HSM. O cientista é responsável pelo Media Lab do MIT e dedica-se a estudar o impacto da sociedade digital em nossas vidas.

Lippman iniciou sua apresentação falando sobre como, no mundo acadêmico, não se costuma receber crédito ao concordar com os outros. Ainda assim, concordava com o palestrante anterior, Mark Penn, a respeito da importância das microtendências. Bem humorado, prosseguiu resumindo a mensagem de sua palestra e afirmou: “A sociedade mudou. Vocês ouvem isso demais e há muito tempo, mas a sociedade mudou novamente, e mudou de modo crítico, de tal forma que afeta o marketing e a produção. Não há mais produtos. Existem coisas que fornecemos às pessoas, a partir das quais elas fabricam seus próprios produtos”.

Para colocar o público em sintonia com sua mensagem, Lippman começou falando do telefone de seu velho automóvel: “Comprei um Mercedes com telefone em 1984. Um ano e meio depois, a tecnologia dos telefones para automóveis mudou e eu liguei para a Mercedes, pois não podia mais ter um plano de serviços com aquele aparato. A resposta que me deram foi: ‘Troque o carro’.” Lippman recordou que, para mudar o telefone, seria preciso reconstruir o carro todo. “O produto era imutável e o consumidor aceitava aquilo. Isso não é mais verdade”, arrematou.

A era do “nós”
O palestrante esclareceu que estamos numa sociedade que cria coisas novas e que tudo tem a ver com o “nós”, em oposição à era do “eu”, na qual as máquinas respondiam ao indivíduo. “Já não é mais uma moda, mas algo que vai ficar: os sistemas sociais se ligam às sociedades, aos subgrupos, às microtendências”, disse Lippman.

O americano conta que uma amiga foi apresentada ao Twitter, da Nortel, que é um sistema de mensagens instantâneas, no qual você escolhe as pessoas que você quer acompanhar. Por três semanas, sua amiga experimentou o Twitter e, só então, pôde afirmar que gostara dele. Lippman explicou: “É preciso experimentar as novidades para, de fato, avaliar. Isso impacta o marketing”.

O cientista assinala que Malcolm Gladwell, autor de Tipping Point: o ponto de desequilíbrio, fez uma grande sugestão em seu livro. Disse que, se alguém queria lançar um café, deveria fazê-lo via degustação em um salão de beleza, onde vão as donas de casa que compram café, e não anunciá-lo num outdoor. “A mensagem, agora, é membership, associação a grupos. Isso já não é mais moda”, afirmou Lippman.

O professor do MIT explicou que o índice de mudança de uma sociedade é função da idade a partir da qual as pessoas têm acesso à tecnologia. Assim, a sociedade, que costumava mudar a cada 16 anos, move-se mais rapidamente, pois as pessoas têm acesso à tecnologia aos três ou quatro anos de idade. Hoje, as gerações mudam quatro vezes mais rapidamente do que acontecia no passado. Isso significa que as coisas que achávamos que eram moda evoluem e tornam-se um elo entre o filho mais jovem e o mais velho. “A mágica é integrar o seu não-produto (pois não há produtos) às redes sociais”, resumiu o especialista.

O mundo wireless e a fluidez da cadeia de valores
Segundo o palestrante, a cadeia de valores passou a ser fluida, e não mais rígida como era em anos recentes. Ele recorda que, nos anos 50, o Bank of America decidiu lançar um cartão de crédito nacional, em uma época em que os cartões eram ainda destinados ao uso em estabelecimentos específicos. Era, contudo, necessário um bom sistema de comunicação, porque a pessoa que usa o cartão é móvel, vai de loja para loja, de cidade para cidade, usando o cartão. Era preciso, também, ter o controle do nível de crédito, saber se o cartão não tinha sido roubado e outras informações. “Àquela época, a AT&T poderia ter ajudado a construir uma rede de comunicações para que tudo isso funcionasse, a um custo de 10% por transação, por exemplo. Mas não pôde, porque a cadeia de valores era rígida. Agora, a cadeia de valores é fluida. As empresas de telefonia celular já tentam fazer isso, inserindo-se na cadeia de valores”, ilustrou Lippman.

O mundo wireless é onde se notam as mudanças do mundo em maior intensidade, segundo o professor. “O iPhone é um marco, porque foi o precursor. Steve Jobs me explicou por que inventou o iPhone: a sua esposa tinha um parente que trabalhava num computador da Microsoft, o Tablet, e não se cansava de elogiá-lo. Então, ele decidiu que a Apple deveria também desenvolver o seu Tablet. Alguém de sua equipe, no entanto, teve a idéia de unir o celular ao computador, pois todos estavam insatisfeitos com o funcionamento da telefonia celular. Assim surgiu o iPhone”, contou Lippman.

“Um hacker, porém, entrou no sistema e configurou o iPhone conforme desejou. De repente, todo mundo quis ser cliente Apple e o iPhone passou a ser um telefone aberto”, falou entusiasmadamente Lippman, que anunciou: “A relação da operadora de telefonia com o cliente desapareceu. Você passa a ser cliente daquela empresas que lhe deu o dispositivo”.

O telefone será um sistema aberto
Lippman contou que a Varizon, operadora de telefonia americana, era uma inimiga feroz do telefone aberto, a ponto de não vender Nokia. De repente, a Verizon deu uma virada e abriu a rede. “O iPhone acendeu um jeito fundamental de trabalhar no wireless. O telefone vai se tornar, inevitavelmente, um sistema aberto, que vai usar qualquer rede, oportunisticamente. Esses dispositivos terão rádios múltiplos, conexões múltiplas e não precisaremos ter relação com a operadora, mas com o serviço. Quando você entrar numa loja, a capacidade de messaging pode ser um serviço da loja. Uma loja de departamentos pode ser uma operadora.”

“Finalmente, o controle é do proprietário no mundo wireless”, comemorou Lippman. Para ele, o surpreendente é a replicação desse sistema. Após o iPhone, já há outras plataformas abertas disponíveis.

Sociedade Sensível
Segundo o cientista do MIT, se pensarmos em comunicações em geral, existem só duas coisas vitais: quem é você (sua identidade) e o que você faz (o contexto). Para exemplificar a aplicação da identidade e do contexto, o palestrante mencionou que seria interessante que ele pudesse, remotamente, autorizar sua filha a consumir bebida alcoólica, mesmo sendo ela menor de idade, se houvesse alguma comunicação que lhe dissesse não apenas que ela desejava a autorização, mas onde ela estava, com quem e em que circunstância. “A identidade não poderia ser encapsulada na idade. Identidade tem importância crítica e toda essa informação estará disponível no futuro”, explicou.

Para ilustrar ainda mais como funciona uma sociedade sensível, Lippman confessou que sempre desejou que seu telefone o avisasse, quando estivesse em um supermercado, qual era a fila mais rápida. “É esse tipo de comunicação aberta que uma sociedade sensível oferece. A idéia é juntar isso aos serviços oportunistas e isso nos dará um insight sobre o futuro.”

Desafios do futuro
Para chegarmos a qualquer lugar através desse “nós”, temos que resolver vários problemas de tecnologia, de acordo com o professor. O principal é a escala. O dimensionamento é a única barreira que temos entre qualquer invenção e seu funcionamento. “Escala é a nossa dificuldade de hoje, não a invenção em si”, esclareceu Lippman, acrescentando que a questão da velocidade é outra que deve ser compreendida para entendermos o mundo de hoje.

“Estimulamos os alunos do MIT a criarem seus próprios sistemas, porque há muitas idéias que ainda não podem ser implementadas, até por questões legais. Mas os alunos do MIT têm uma tendência altamente anárquica e inovam”, contou o professor do Media Lab. Lippman afirma que há muitos avanços para os quais ainda não existem modelos. “São avanços que se originam na comunidade e levam a imaginação ao limite.

O palestrante citou o exemplo do Fluid Voice, um sistema criado pelos alunos. “Na era do ‘nós’, a conferência é o default no sistema Fluid Voice (voz fluida), um sistema telefônico que utiliza tecnologia de hiperconectividade criada no MIT. O usuário pressiona uma tecla (ao invés de discar) e passa a ouvir todos do seu grupo que estão falando. Na tela do sistema, o usuário visualiza todos e escolhe quem ele não quer ouvir. É muito semelhante a uma rede social com escala técnica. Os alunos do MIT expandiram isso para o ambiente social”, anunciou Lippman.

Finalizando sua exposição, Lippman afirmou que, no futuro, não haverá produtos, mas arquiteturas. “Nós lhe damos a argila para você construir o sistema” será a palavra de ordem. “O SMS revolucionou a comunicação ao propor que o usuário usasse seu polegar para digitar. Quem imaginaria que isso se tornaria uma moda mundial? O questionamento e a evolução são o que vai tornar essas coisas revolucionárias possíveis”, concluiu o palestrante.


Fonte: Portal HSM On-line

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