Pular para o conteúdo principal

O aquecimento global e porque vamos ficar mais tristes

"Todo mundo está preocupado com a gestão dos recursos naturais e com as assustadoras e imprevisíveis mudanças no ecossistema. Nós nos preocupamos com quais áreas serão inundadas primeiro à medida que o nível dos oceanos sobe. Estimamos as probabilidades de guerras por água limpa, e calculamos quais as espécies - ursos polares, baleias, pássaros - que se extinguirão. Mas também deveríamos nos preocupar com o grande sofrimento que o aquecimento global vai provocar na nossa saúde mental".

O trecho, traduzido livremente, é de um artigo interessantíssimo da edição de janeiro da revista americana de tecnologia Wired: "Luto Global - como a próxima vítima do aquecimento global será nossas mentes". A idéia do artigo, escrito por Clive Thompson, articulista de várias publicações importantes dos Estados Unidos, é a de que as mudanças que o aquecimento global provocará nos cenários aos quais estamos familiarizados nos deixarão deprimidos, sorumbáticos. Isso porque, como cidadãos do século XXI, por mais que nos consideremos cosmopolistas, modernos e desgarrados, somos ainda muito conectados à terra onde vivemos. "Como eles (no caso, os novaiorquinos) reagirão se, daqui a 20 ou 30 anos, as suas árvores não suportarem o aumento de cinco graus na temperatura média? Ou se mosquitos estranhos infestarem a cidade, o outono se reduzir a um mês e a neve se transformar numa lembrança distante?"

O gancho para o desabafo de Thompson são as pesquisas do filósofo australiano Glenn Albrecht. Elas mostram que os cidadãos do país estão ficando tristes à medida que o seu cenário - no sentido literal -, vem se modificando. A Austrália é um país cada dia mais seco e, consequentemente, mais poeirento. Muitas de suas cidades racionam água, recifes de coral estão morrendo e os agricultores têm feito estripulias para dar conta dos níveis de produtividade estabelecidos no passado. E todas essas mudanças, segundo ele, não têm passado despercebidas aos olhos das pessoas. Curiosamente, elas estão sentindo uma angústia semelhante à de populações indígenas que são realocadas à força para uma região desconhecida. "Plantas com as quais eles estavam acostumados não crescem mais, jardins não vão pra frente. Passarinhos se foram. 'Eles não se sentem mais como se conhecessem o lugar que moram há décadas', diz o pesquisador".

Fiquei pensando no artigo e me lembrei de duas coisas. A primeira é a de que, quando pequena, no inverno, subia de manhã uma ladeira para chegar à escola soltando fumacinha pela boca. Morava na cidade histórica de Ouro Preto, em Minas Gerais, e lá fazia, sim, muito frio. Hoje, quando volto lá, não vejo mais as crianças soltando ar quente pela boca a caminho da escola porque simplesmente não faz mais tanto frio assim. A segunda é a de que já ouvi de vários amigos paulistas, todos na casa dos trinta e poucos anos, a mesma frase: "Olha, quando eu era pequeno, São Paulo era mesmo a cidade da Garoa". Bem, é velha lenga de que o clima virou uma loucura - muito usada para puxar conversa em elevador e sala de espera de médico -, mas atenção: por causa do aquecimento global, nossas lembranças do passado podem estar condenadas a estar ainda mais distantes do que gostaríamos que elas estivessem.


Fonte: Por Ana Luiza Herzog, in Blog Sustentabilidade - portalexame.abril.com.br

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

H2OH! - um produto desacreditado que virou sucesso

O executivo carioca Carlos Ricardo, diretor de marketing da divisão Elma Chips da Pepsico, a gigante americana do setor de alimentos e bebidas, é hoje visto como uma estrela em ascensão no mundo do marketing. Ele é o principal responsável pela criação e pelo lançamento de um produto que movimentou, de forma surpreendente, o mercado de bebidas em 11 países. A princípio, pouca gente fora da Pepsi e da Ambev, empresas responsáveis por sua produção, colocava fé na H2OH!, bebida que fica a meio caminho entre a água com sabor e o refrigerante diet. Mas em apenas um ano a H2OH! conquistou 25% do mercado brasileiro de bebidas sem açúcar, deixando para trás marcas tradicionais, como Coca-Cola Light e Guaraná Antarctica Diet. Além dos números de vendas, a H2OH! praticamente deu origem a uma nova categoria de produto, na qual tem concorrentes como a Aquarius Fresh, da Coca-Cola, e que já é maior do que segmentos consagrados, como os de leites com sabores, bebidas à base de soja, chás gelados e su

Doze passos para deixar de ser o “bode expiatório” na sua empresa

Você já viu alguma vez um colega de trabalho ser culpado, exposto ou demitido por erros que não foi ele que cometeu, e sim seu chefe ou outro colega? Quais foram os efeitos neste indivíduo e nos seus colegas? Como isso foi absorvido por eles? No meu trabalho como coach, tenho encontrado mais e mais casos de “bodes expiatórios corporativos”, que a Scapegoat Society, uma ONG britânica cujo objetivo é aumentar a consciência sobre esta questão no ambiente de trabalho, define como uma rotina social hostil ou calúnia psicológica, através da qual as pessoas passam a culpa ou responsabilidade adiante, para um alvo ou grupo. Os efeitos são extremamente danosos, com conseqüências de longo-prazo para a vítima. Recentemente, dei orientação executiva a um gerente sênior que nunca mais se recuperou por ter sido um dia bode expiatório. John, 39 anos, trabalhou para uma empresa quando tinha algo em torno de 20 anos de idade e tudo ia bem até que ele foi usado como bode expiatório por um novo chefe. De

Conselho Federal de Marketing?

A falta de regulamentação da profissão de marketing está gerando um verdadeiro furdunço na Bahia. O consultor de marketing André Saback diz estar sendo perseguido por membros do Conselho Regional de Administração da Bahia (CRA/BA) por liderar uma associação – com nome de Conselho Federal de Marketing e que ainda não está registrada – cujo objetivo, segundo ele, é regulamentar a profissão. O CRA responde dizendo que Saback está praticando estelionato e que as medidas tomadas visam a defender os profissionais de administração. Enquanto André Saback, formado em marketing pela FIB - Centro Universitário da Bahia -, diz militar pela regulamentação da profissão, o Presidente do CRA/BA, Roberto Ibrahim Uehbe, afirma que o profissional criou uma associação clandestina, está emitindo carteirinhas, cobrando taxas e que foi cobrado pelo Conselho Federal de Administração por medidas que passam até por processar Saback, que diz ter recebido dois telefonemas anônimos na última semana em tom de ameaç