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Quando a sustentabilidade está no DNA

Muito se discute a respeito de como as empresas devem adaptar a sua estratégia ao novo paradigma da sustentabilidade. Mas existem empreendedores que, a partir desse conceito, identificaram uma oportunidade de negócio e basearam toda a sua estratégia no tripé econômico, social e ambiental. Agora que a sustentabilidade virou a bola da vez, essa postura trouxe vantagens competitivas. Mas a maioria desses empresários teve que pagar o preço pelo pioneirismo e conquistar espaços até então incipientes no mercado, orientados muito mais pela intuição do que por modelos e teorias econômicas.

A aposta deu certo. E o mercado já começa a abrir portas novas. Para se ter uma idéia, o comércio justo cresce 20% ao ano, segundo pesquisa encomendada pelo Sebrae à consultoria Schneider & Associados. E essa é apenas uma das possibilidades dos negócios sustentáveis.

De acordo, com Roberto Smeraldi, diretor da OSCIP (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público) Amigos da Terra e coautor do "Manual de negócios sustentáveis", são três os tipos principais de negócios nessa categoria. "Há um primeiro grupo de empreendimentos voltados para ganhos de ecoeficiência dos processos. Já o segundo parte do princípio de prover produtos e serviços a partir de uma nova lógica de consumo consciente e o terceiro investe na valorização do capital natural a partir da exploração sustentável da biodiversidade", explica Smeraldi.

Nesse novo paradigma de sustentabilidade, o plano de negócios, que é o documento pelo qual o empreendedor formalizará os estudos a respeito de suas idéias para transformá-las em um empreendimento, deve contemplar aspectos que não estão diretamente relacionados à empresa, mas são determinantes para a perenidade do negócio.

"Os modelos atuais tendem a não considerar fatores externos como o esgotamento de recursos, mudanças na base de composição dos preços, disponibilidade de energia, entre outras variantes, que são determinantes para a sustentabilidade", ressalta Smeraldi.

Segundo Isabel Baliero, economista e professora do curso de Pós Graduação em Empreendedorismo Rural e Desenvolvimento Sustentável da Universidade do Estado do Pará (Uepa), o gestor precisa ter o máximo de respostas para medir a viabilidade do empreendimento. "Muitos só contemplam os estudos de marketing, econômico e financeiro, mas um plano de negócio bem embasado deve incorporar também estudos de impacto ambiental e social", afirma Isabel.

Postura coerente
É importante separar o joio do trigo quando o assunto é sustentabilidade. Esse conceito não pode restringir-se aos produtos ou serviços oferecidos, mas sim se integrar à política e estratégia da empresa. Contrariar essa máxima consiste em risco com potencial crescente, pois os consumidores estão cada vez mais conscientes e em condições de distinguir o que contribui para a sustentabilidade do que não passa de propaganda.

"O plano de negócio precisa detalhar como a empresa vai alcançar a rentabilidade dentro das condições da sua inserção no plano ambiental e social. Não seria ético ter uma empresa próspera sem se preocupar com a comunidade local", afirma o sociólogo Hans Dorresteijn que coordenou o Pronegócios - Programa de Negócios Sustentáveis do Instituto Internacional de Educação no Brasil (IEB).

As empresas pioneiras na prática da sustentabilidade encontram vantagens e desvantagens. "A empresa que se prepara melhor para o futuro ganha em competitividade. Como é de se esperar que as exigências dos consumidores sejam cada vez maiores, é bom se antecipar", ressalta Dorresteijn.

Smeraldi concorda. "Hoje, as mudanças acontecem de forma muito rápida no mundo. Ser substituído é fácil mesmo que você tenha uma posição dominante no negócio. Consultores prevêem que daqui a 10 anos mais da metade das 500 empresas listadas na Fortune (publicação que elabora o ranking das maiores empresas do mundo) não vão existir mais. Isso é algo que há uma década atrás não cogitaríamos", afirma.

Mas o pioneirismo tem um preço. "Gerar a mudança de hábitos, educar as pessoas para aceitar novas idéias, vencer a resistência dos céticos são alguns dos percalços enfrentados por aqueles que saem na frente em relação à sustentabilidade", pondera Isabel.

Grupo Eco, pioneiro em eventos sustentáveis
O empresário Daves de Luna Tenório era trader e percebeu, em suas viagens internacionais, que a Amazônia despertava muito interesse pelo mundo afora. Decidiu se especializar no assunto e criou, em 2001, a "Espírito da Amazônia", loja especializada em produtos e flores tropicais desse bioma. Naquele mesmo ano, a empresa descobriu outros nichos de negócios e começou a atuar também na confecção de brindes e eventos corporativos sustentáveis.

"Somos o primeiro buffet orgânico certificado pelo IBD (Instituto BioDinâmico), também fomos pioneiros na certificação de uma empresa de brindes pelo FSC - Forest Stewardship Council (Conselho de Manejo Florestal). Esses reconhecimentos são resultado de uma postura diferenciada em relação a toda a cadeia produtiva. Nós fazemos estudos prévios das comunidades para identificar potenciais e capacitá-las para desenvolver produtos e gerar renda", afirma Tenório.

Essa experiência também é compartilhada com grandes empresas. "Acreditamos que a sustentabilidade é um caminho sem volta e sem fim. Primeiro, porque ela tem que fazer parte do dia-adia das companhias e segundo porque ninguém é 100% sustentável, a sustentabilidade é uma busca contínua. Nossas soluções têm como objetivo auxiliar as empresas a aliar o discurso à prática", completa Tenório.

Em 2002, o Grupo Eco foi selecionado em um processo seletivo realizado pela Ibens (Instituto Brasileiro de Educação em Negócios Sustentáveis) e recebeu consultores da Universidade de Yale dos Estados Unidos para elaborar um plano de negócios em empreendimentos sustentáveis. Esse apoio ajudou a redirecionar as atividades da empresa.

"Criamos um novo modelo de gestão empresarial. Pagamos o preço pelo pioneirismo, pois tivemos que convencer nossos clientes da importância dessa postura. Ainda assim, valeu a pena ter saído na frente, pois recebemos uma série de reconhecimentos como o de empresa-modelo conferido pela Câmara Americana de Comércio - Amcham, do Instituto Ethos, Akatu e hoje, mesmo sendo uma empresa pequena, contribuímos para ditar a sustentabilidade no mercado", explica o empresário.

Os resultados do Grupo Eco provam que investir na sustentabilidade foi um acerto. Desde a criação da empresa, o faturamento tem dobrado ano a ano. Para 2008, a previsão é de que atinja R$ 8 milhões.

Na CiaForm Revestimentos, pneus viram matéria-prima
A idéia de transformar pneus em pisos surgiu em uma viagem do engenheiro mecânico Marcos Vasconcelos à Europa, onde o produto já era comercializado. No entanto, a tecnologia disponível para fabricação utilizava combustíveis fósseis como fonte de energia, o que resultava em emissões de dióxido de carbono para a atmosfera.

"O processo era parcialmente correto, mas eu precisava ir além. Queria caminhar na contramão, utilizando uma tecnologia 100% limpa e que valorizasse a mão-deobra", afirma Vasconcelos. Assim, pesquisou matérias-primas e depois de muitas tentativas e erros chegou a um processo de prensagem manual que dispensa o uso de energia.

Em 2005, criou a CiaForm revestimentos e expandiu sua produção para barreiras acústicas, protetores para automóveis, pisos para playgrounds, academias e calçamentos.

"Poderia ir atrás de máquinas para agilizar o processo de fabricação. Mas tenho um sistema que me proporciona o resultado esperado, sem prejudicar o meio ambiente e por meio dele ainda consigo gerar mais empregos. Pensando sob esses aspectos é muito
mais vantajoso", ressalta Vasconcelos.

O empresário montou a empresa com recursos próprios e em dois anos recuperou o seu investimento. "Ainda temos muito a caminhar em relação à sustentabilidade. Mas vivemos um bom momento, pois há várias iniciativas acontecendo nesse sentido. É possível ganhar dinheiro, sem destruir", completa.

As vendas da CiaForm tem dobrado a cada ano. Para 2008, é previsto um faturamento da ordem de R$ 2 milhões.

Ecosorb, tecnologia e proteção ambiental
Criada em 1998, a Ecosorb é uma empresa especializada em gestão de risco ambiental, segurança e saúde no trabalho, que já participou do combate aos principais acidentes ambientais do País.

Seu fundador Rogério Igel trouxe a turfa para o Brasil. Essa substância corresponde ao estágio inicial do carbono em decomposição e tem a capacidade de absorver óleo e metais em casos de derramamento no meio ambiente.

"Essa solução foi apresentada na ’Rio Oil and Gas’, o principal evento de petróleo da América Latina, em 1998, e atraiu a atenção de muitas empresas. Em 2000, aconteceu o vazamento de óleo na Bahia de Guanabara e a explosão da plataforma P-36 da Petrobras. A empresa petrolífera elaborou um plano de remediação e a Ecosorb participou das ações", afirma Eugenio Singer, presidente da Ecosorb.

A empresa também desenvolveu soluções para remediar acidentes com produtos químicos. Em 2005, participou do plano de remediação do acidente com o navio da Vicunha no Porto de Paranaguá. Hoje, possui uma unidade industrial e três bases de emergência instaladas nas fábricas de seus clientes.

Em 2007, a Ecosorb iniciou um trabalho de captação de parceiros e investimentos para reposicionar a empresa no mercado. Com essa medida, passou a oferecer consultoria para desenvolvimento e execução de planos de sustentabilidade. "Não queríamos tratar só da emergência, mas também da saúde da empresa com as quais trabalhávamos. Por isso, foi necessário aumentar os nossos serviços por meio de um projeto amplo de sustentabilidade, envolvendo segurança, saúde e meio ambiente", explica Singer.

Nessa nova perspectiva, a Ecosorb ganhou novos clientes como empresas do setor sucroalcooleiro em busca de soluções para adequar seus processos às novas exigências do mercado.

Entre 1998 e 2002, a empresa trabalhou em parceria com o Banco interamericano de desenvolvimento (BID) na avaliação da viabilidade econômica, ambiental e social de projetos dos países tomadores de crédito.

De 2006 para 2007, o faturamento da empresa quase dobrou e a previsão para 2008 é de que atinja R$ 22 milhões.


Fonte: Por Juliana Lopes, in Revista Idéia Socioambiental

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