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O consumidor é fiel a marca ou ao ponto-de-venda?

Os fabricantes de produto de consumo estão tendo cada vez mais dor de cabeça para manter seus clientes fiéis. Na Bélgica, a rede de supermercados Delhaize, uma das líderes do varejo com 775 lojas, retirou de suas prateleiras 250 produtos da Unilever em fevereiro. Enquanto as duas empresas não chegam a um acordo sobre os preços de produtos e sobre merchandising nas lojas, os consumidores estão indo atrás dos produtos em outras redes ou trocando a marca Unilever por outras concorrentes.

Um terço dos clientes da Delhaize afirmou, em uma pesquisa on-line, que vão atrás dos produtos da Unilever no Carrefour e na rede de desconto Colruyt. Um terço migrará para produtos iguais ou semelhantes de outras marcas ou comprará marcas próprias, enquanto a outra parte dos clientes da rede belga ainda não sabe que medida vai tomar para suprir suas necessidades e desejos.

Aqui no Brasil, em recente entrevista à revista Exame, o diretor executivo das Casas Bahia, Michael Klein, comentou sobre a mudança que a rede havia feito para diminuir os preços dos produtos (eliminação dos intermediários na compra), mas que não estava agradando os fornecedores: “Eles não têm como nos pressionar. Você acha que alguém vai deixar de vender para a Casas Bahia?”.

Ano passado, em entrevista ao Mundo do Marketing, o professor Francisco Gracioso, da ESPM, já havia ratificado o poder dos canais de venda. “É o varejo que tem o domínio do comprador. Costumo me perguntar muitas vezes a quem o consumidor é mais fiel: a marca Omo ou a marca do supermercado que vende o Omo. Geralmente é o supermercado”.

Afinal, o consumidor é fiel às marcas de produtos de consumo ou ao ponto-de-venda? O caso de Omo, líder de mercado, pode ser diferente, como mostra a pesquisa com os consumidores belgas. Tanto que o pesquisador do Centro de Excelência em Varejo da Fundação Getulio Vargas de São Paulo, Edgard Barki, discorda. Para ele, a fidelidade depende da categoria de produto e do envolvimento com a marca. “No caso de Omo o consumidor vai buscar em outro ponto-de-venda”, afirma em entrevista ao site. Mas nem sempre é assim.

Mudança na história
Como só um produto pode ser líder em cada categoria, a briga pela preferência do consumidor é grande. E, nesta briga, surge um juiz implacável: o ponto-de-venda. Hoje, os supermercados podem chegar a 80% das vendas de um produto, estima o professor Ivan Pinto, da ESPM. “Antigamente os produtos eram vendidos sem marca, em quantidade, nos armazéns ou empórios. O sabão era em barra. E, à medida que os grandes supermercados começaram a surgir, o poder das empresas de marcas de produtos começou a diminuir”, analisa Pinto em entrevista ao Mundo do Marketing.

O que mudou também foi o comportamento do consumidor nos últimos 30 anos, com destaque para a última década. E continuará mudando. “O consumidor está menos fiel à marca do que antes. Ele muda de uma marca para outra dentro do ponto-de-venda por uma série de razões, mas pela situação atual (crise), ele muda por preço, por exemplo”, afirma Chan Wook Min, presidente do Popai Brasil.

Se o consumidor decide que marca vai comprar na hora que ele está parado na frente da gôndola, Isadora Sbrissa de Campus, Gerente de Marketing da marca Taeq, do Grupo Pão de Açúcar, tende a dizer que o consumidor é mais fiel ao canal. “E o canal empresta o seu peso a algumas marcas. Existe uma percepção no consumidor de que se um produto está numa loja do Pão de Açúcar é porque ele já passou por alguns crivos e pode confiar”, aponta em entrevista ao site. “O canal influencia a compra significativamente, mas não dá para dizer que isso não seja verdade em relação a marca porque uns dos primeiros papéis da Taeq é fidelizar o cliente ao canal”, conta Isadora.

Canal virou marca
Desde o advento das grandes redes de varejo no Brasil, o ponto-de-venda também se transformou em marca, argumenta Ivan Pinto. “Pão de Açúcar e Carrefour são marcas com todas as características usadas para diferenciar uma marca da outra. Por isso, ela tem capacidade de amarrar o consumidor pelos aspectos racionais e emocionais tanto quanto as marcas de produto”, atesta o professo da ESPM. Mas por que um cliente é mais fiel a uma rede de lojas do que uma marca? “Porque existe um relacionamento no ponto-de-venda. As pessoas preferem ir lá comprar mesmo que não tenha a sua marca preferida, mas tem produtos tão bons quanto”, responde Chan Wook Min, presidente do Popai Brasil.

É claro que um consumidor é diferente do outro e a fidelidade também pode ser alterada, mas segundo pesquisas do Popai, a decisão de compra por uma marca acontece no ponto-de-venda para a maioria deles, chegando a mais de 80%. “A prioridade é preço e facilidade e, se possível, satisfazer o desejo da marca preferida. Em médio prazo, o cliente comprará duas vezes pela facilidade e na terceira, se não houver o produto, ele vai para outro lugar”, constata Wook Min.

Por isso, a localização, o preço e o sortimento de produtos, entre outros fatores, são fundamentais para o varejo fidelizar o cliente. “Não adianta ter um ponto-de-venda que não ofereça Nestlé”, argumenta Edgard Barki, da FGV-EAESP, completando que o varejo tem possibilidade de criar uma fidelidade grande com o consumidor. “O Pão de Açúcar, por exemplo, oferece uma experiência de compra, com atendimento diferenciado que fideliza o consumidor”.

Ponto-de-venda trabalha para fidelizar cliente
O varejo se mobiliza cada vez mais para fidelizar o cliente. Por isso, oferece serviços complementares que vão desde o pagamento de contas até a criação de farmácias, passando por correio, lavanderia, posto de gasolina e até consulta médica. “O consumidor acaba sendo atraído mais pelo PDV do que pela marca”, aponta o presidente do Popai Brasil.

Outro ponto de mudança nesta equação de fidelidade diz respeito à localização. O consumidor tem cada vez menos tempo para realizar suas compras, aponta Chan Wook Min. “Antes se falava em share of mind, depois de share of pocket e agora estamos falando de share of time. O consumidor tem tempo cronometrado para fazer compras e, por isso, os pontos-de-venda próximos ao trabalho e da casa passaram a ter mais importância”.

Essa mudança no comportamento do consumidor mostra também uma reação racional e mais planejada do que há cinco, dez anos. Isso afeta diretamente a fidelidade à marca. O consumidor está agindo menos pelo desejo. Não é por acaso que as marcas de consumo estão criando seus próprios canais de venda. “Marcas como Luis Vuitton, Versace, Mont Blanc e até as Havaianas têm suas lojas próprias. Hoje você compra geladeira Brastemp pela internet. Isso mostra que o relacionamento do varejo com o consumidor foi reconhecido. Por outro lado, os consumidores continuam tendo relações emocionais com os produtos”, ressalta Ivan Pinto.

Desafios
Para as marcas de produtos de consumo, as opiniões dos especialistas ouvidos pelo Mundo do Marketing representam um desafio a mais para elas venderem. Se a disputa pela diferenciação, pela carteira e pelo tempo do consumidor diante de tantas opções já é grande, obrigando as empresas a investirem cada vez mais em inovação e relacionamento, a orientação para o ponto-de-venda ganha ainda mais importância.

“As grandes marcas – conhecidas e líderes – não podem deixar de comunicar bem no ponto-de-venda para não perder o cliente potencial para o concorrente. Ele tem que se preocupar com um mix de comunicação com mais foco no PDV”, garante Chan Wook Min.

O mesmo vale para o ponto-de-venda se manter na preferência do cliente. “O varejo precisa de algumas marcas de qualidade para carregar a qualidade também. Depois é preciso um bom atendimento, uma boa localização, um local agradável e facilitar o dia-a-dia do consumidor. O varejo precisa se preocupar com estacionamento, como o consumidor vai achar rapidamente o produto que deseja e como vai pagar rapidamente. Isso ajudará o cliente a ser fiel ao varejo”, conclui o presidente do Popai Brasil.


Fonte: Por Bruno Mello, com reportagem de Thiago Terra, in www.mundodomarketing.com.br

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